quinta-feira, 30 de abril de 2020

quarta-feira, 29 de abril de 2020

O LODO E AS ESTRELAS - PARTE 3

PARTE 1
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PARTE 2
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Barragem de Bemposta 

Archer de Carvalho, arquiteto, tinha apenas 25 anos quando assumiu a construção das infraestruturas de apoio à construção das barragens. Não foi pacífico aquele invadir do planalto mirandês. Os povos, habituados à pacatez dos dias, não queriam o seu espaço devassado. Diziam ao arquiteto e seus colaboradores “ num queremos acá la barriage”. Em vão, que as casas e infraestruturas nasceram como cogumelos. Casas, farmácia, centro médico, escola, igreja, pavilhão, piscina, tudo foi construído para apoio aos utentes. De realçar uma espécie de supermercado, onde se podia encontrar pequenos comércios de fruta, carne, todo o género de mercearia e até peixe que vinha da cidade do Porto. A escola tinha sempre cinco ou seis professores permanentes. O centro médico, um clínico e um enfermeiro. A piscina tinha professores de natação vindos do Porto.
De novo o prosar sofrido de Telmo:

Quando Chove

Encontrei-o na estrada. Caminhámos juntos. Chama-se Ricardo e é natural de Marco de Canavezes. Falámos do tempo e das coisas.
- Onde vive?
- Lá adiante, num pombal.
-E o trabalho?
- Há quinze dias que não trabalho, por causa da chuva …tenho a mulher filhos a morrer de fome.
- Estão no pombal?
- Não, ficaram na terra. Eu vim e só trabalhei um dia.
- Que tem comido?
- Um companheiro de Moncorvo, que vive lá comigo, tem-me dado uns bocaditos de pão; ele também é pobre. Envergonho-me muito de pedir.
E chorou.
Senti – me tão pequenino, ao lado do mártir Ricardo, que fiz os meus passos mais brandos, para sentir melhor o “ruca – truca” dos seus socos abertos. Chovia. Ele ia numa sopa. Pensei: enquanto chover, este pobre tem que comer a lama dos caminhos, como fel que lhe traz a recordação contínua da mulher e dos filhos.
(24 de Dezembro de 1955)

domingo, 26 de abril de 2020

sábado, 25 de abril de 2020

ABRIL-POESIA



ESTAR EM ABRIL É ASSIM


 Estar em Abril é assim
Uma vontade de ser
De criar e de crescer
Num tempo que é de outro modo
O tempo de criar pão
E saber ser mundo todo
Sempre ao alcance da mão

Estar em Abril é assim
Um olhar de frente a vida
Por mais que alguém o desdiga
E um desdenhar da sorte
Quando se dá a passada
Nalguma dura jornada
Em que a vida perde o norte

Estar em Abril acontece
Quando dentro de alguém cresce
Um grito cru de esperança
E na espuma do medo
Num velho muro se escreve
Um poema – um cravo breve
Verde e rubro de mudança

Estar em Abril é bandeira
Que se hasteia numa praça
Quando vem lá outro alguém
Que é alguém de outra maneira
E na orla da desgraça
Canta contigo também
Canções no vento que passa

Estar em Abril é assim
Sentir-te perto de mim
Quando a mágoa nos afasta.

ANIVERSÁRIO

FERNANDO BEJA LOPES

25-04-1946

Nesta data especial...

"Encontro de Gerações" deseja

MUITAS FELICIDADES!

PARABÉNS!

quarta-feira, 22 de abril de 2020

O LODO E AS ESTRELAS - PARTE 2

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Barragem de Miranda do Douro ...

De novo vamos ao encontro de Telmo. De novo folhear um breviário de sofrimento. De novo recuar a uma época remota entre 1953 e 1964. Uma saga heróica povoada de heróis reais e anónimos. Naquele meio do nada, edificaram-se bairros – bairros provisórios e bairros definitivos de apoio à construção dos colossos de betão. Se os bairros provisórios eram exatamente bairros que se desconstruíam no fim da obra, já os bairros definitivos eram povoados por gente que ali ficaria mantendo o funcionamento das barragens. Ali, naquelas casas, viviam pessoal dirigente de várias categorias profissionais, mas também uma outra franja de funcionários que trabalhavam para a Hidroelétrica do Douro. Os bairros eram distintos e bem demarcada a divisão social. Mas depois havia os outros. Os que vinham de longe na procura de trabalho, muitos oriundos das minas de carvão e que não tinham por vezes e muitas vezes, nem casa nem abrigo. Dormiam ao relento ou debaixo de fragas, à mercê de um  qualquer empreiteiro que lhes dava trabalho temporário. Depois, quando a empreitada acabava, restava a penúria e a fome. Mas acompanhemos a pena de Telmo:

O Marteleiro

Estava estendido na cama, a tossir. Ao pé da cabeça, uma camisa velha enroscada. De minuto a minuto, levantava a cabeça e deitava lá sangue. Sangue da boca, sangue dos pulmões, Sangue que lhe passou pelo corpo todo. O seu corpo de marteleiro gasto e cansado e só com trinta anos.
- Já trabalhei na Caniçada.
- E agora?
Eu digo o resto: quero ir para a terra, com a mulher e os filhos – curar ou morrer – e não tem dinheiro para a viagem.
span style="font-size: 14.0pt; line-height: 115%;">Quanto valem os seus pulmões?
Ninguém compra os pulmões do António?
Ele ajudou a fazer o conforto de muitos lares. Ele ajudou a fazer o lucro de alguma Companhias.
Levantem-se. Tirem o chapéu.
É o António que passa !
10 de Dezembro de 1955
O Braço Bambo

Hoje, apertei o braço do Araújo, para o amparar. Todo o dia pensei no seu braço  - bambo e duro. Mesmo agora me parece vê-lo, suspenso no ar. Por cima do estaleiro e do bairro, duro e bambo.
A quem aponta? A quem acusa? . Tenho medo.
Naquele dia, quando estoirarem os foguetes e houver bênção, discursos e banquete …o braço bambo e duro apontará.
A quem aponta? A quem acusa?
Tenho medo. Acusa todos.
5 de Novembro de 1956 

BAIRRO FLORIDO

Rua de Moçambique



terça-feira, 21 de abril de 2020

ANIVERSÁRIO


DAISY  MOREIRINHAS

21-04-1949

Nesta data especial...

"Encontro de Gerações" deseja

MUITAS FELICIDADES!

PARABÉNS!

domingo, 19 de abril de 2020

ATELIER

O Pedro, finalista do curso de desenho e pintura das Belas Artes, foi incumbido pelo professor de pintar um nu feminino, segundo os moldes clássicos.

Preparou a tela, montou-a no cavalete, reuniu as tintas e os pincéis e colocou estrategicamente todo o material num recanto das águas-furtadas que tinha arrendado no Bairro Alto quando veio estudar para Lisboa.

Arrastou um velho sofá para debaixo da janela aberta no telhado, lugar onde incidiam os raios solares, que a poeira em suspensão ajudava a desenhar, como setas apontadas ao velho cadeirão.

Cobriu o sofá com um grande pano de cetim vermelho que a Escola lhe facultou.

Agora, só faltava encontrar o modelo que se dispusesse a posar durante uma ou duas semanas, naquele quarto andar esconso onde morava o Pedro.

Tentou a colaboração de uma das suas únicas três colegas de curso. Mas uma estava grávida e declinou o convite. Outra, tinha acabado de casar e o marido não iria concordar. A terceira não podia porque era mãe solteira e todo o tempo era pouco para assistir às aulas e tratar da filha.

Um colega sugeriu-lhe que tentasse encontrar no coalguém rpo de baile de alguma das duas revistas em cena no Parque Mayer.
No fim do espectáculo a que assistiu nessa noite, pediu para falar, no camarim, com uma das bailarinas que tinha observado todo o tempo, dizendo-lhe que era aluno das Belas Artes e que era por isso que precisava de falar com ela.
Fazia-o em nome da conhecida solidariedade entre artistas.

Ela acedeu a ouvi-lo. Alta, corpo escultural, longos cabelos negros, olhos negros profundos, lábios grossos sensuais, pernas longas, o peito bem desenhado que o pequeno soutien mal cobria.

Durante quinze dias, diariamente, a bailarina subia às aguas-furtadas do Pedro, desnudava-se, deitava-se no sofá, o braço direito flectido, a mão apoiando o queixo, os cabelos negros espalhados pelo ombro e cobrindo parcialmente o seio esquerdo.

As coxas fartas abandonadas sobre o cetim vermelho deixavam entrever a mancha escura que lhe rodeava o sexo.

Concluída a obra, dados os retoques finais, o Pedro apresentou o trabalho na escola.
Tecnicamente estava perfeito, elogiou o professor.
E artisticamente era uma inesperada originalidade!

O professor pediu-lhe que cedesse a pintura à escola, para servir de exemplo aos futuros alunos.

Ainda hoje lá está exposta. A vistosa bailarina era um travesti…

Rui Felício
JUL2010
Nota: O episódio veio-me à lembrança quando há dias o Quito aqui aflorou o tema do Teatro de Revista, a que está indissociavelmente ligado o Parque Mayer.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

NOTÍCIA TRISTE

FALECEU

AGOSTINHO  AFONSO  DEUS  PEREIRA

05-11-1923

Sócio nº 1 do Centro Norton de Matos

Ao seu filho Quito Pereira e nora São Vaz Pereira,
como a seus netos e bisnetos e demais familia,
Encontro de Gerações, apresenta as mais sentidas
condolências

ANIVERSÁRIO

ROSA MIRANDA RODRIGUES

17-04-1948

Nesta data especial...

"Encontro de Gerações" deseja

MUITAS FELICIDADES!

PARABÉNS!

segunda-feira, 13 de abril de 2020

O LODO E AS ESTRELAS - Parte 1




Barragem de Picote

Folhear “O Lodo e as Estrelas” é ler um livro proscrito. O testemunho de um Tempo. De um tempo passado amassado em sangue, sofrimento e solidão. Talvez por isso em tempos remotos, o livro de Telmo Ferraz morreu à nascença. O relato incómodo daquele passado que na época era presente fez a polícia politica abafar uma realidade negra. Falar em Telmo Ferraz é lembrar um padre que viveu a saga dos barragistas, que por entre fragas e do meio do nada construíram as barragens de Picote, Miranda e Bemposta por esta ordem – barragens do Douro Internacional que produzem hoje vinte cinco por cento da energia nacional. Telmo deu tudo de si. Acarinhou e protegeu filhos da fome. Ofereceu o pouco que tinha em bens materiais, até ao dia em que apenas ficou com a sotaina que lhe escondia o corpo e até das calças se despojou. De fortuna, apenas as estrelas do Firmamento e um coração doce. O livro de Telmo é um livro cru. Talvez de uma beleza literária que se confunde com a inocência de um prosar realista e torturante. Fica o aviso que só lê quem quer. Fica o resguardo que escolherei episódios colhidos ao vento em várias páginas. Fica uma lembrança, uma homenagem e uma memória. Lembrança de mineiros do carvão que demandaram as barragens por mais uns miseráveis escudos por mês. E dos outros. Dos que morreram minados dos pulmões. Também dos que sobreviveram para construir um Portugal melhor. Para que conste.

“ O Zeca vomitou sangue. Um sangue vivo, quase encheu um tacho! Esse tacho de sangue é o meu exórdio. Que todos me perdoem. Riam-se de mim. Mas, pelo amor de Deus e dos nossos pais, peço um olhar de piedade para todos os personagens deste livro. São personagens reais. Temos os mesmos nomes e a mesma vida, no nosso pequeno mundo – uma barragem.”

O Boné Preto

O dia passou. O mês também. Tenho medo dos dias. Tenho medo dos meses. Cada dia uma coisa nova. Hoje, impressionou-me um homem que, retorcendo, ao mesmo tempo, com as mãos compridas, o boné.
Há três semanas que espera …
Porque me impressionou tanto este homem? Por retorcer o boné? Talvez. Os dedos compridos, retesos, atrapalhados, a mastigar o boné como se tivesse entranhas e, dentro, o pão dos filhos.
O boné preto! Os dedos compridos !

Breve, continuarei a folhear este livro para quem me queira acompanhar. Uma Via Sacra de espinhos. Um passado negro português.
Quito Pereira   

ANIVERSÁRIO

VITOR MANUEL FERNANDES COSTA

13-04-1946

Nesta data especial...

"Encontro de Gerações" deseja

MUITAS FELICIDADES!

PARABÉNS!

domingo, 12 de abril de 2020

P Á S C O A

BOA PÁSCOA, SAÚDE PARA TODOS

     Grafite 2HB em papel cavalinho.

      RUI PAULO