sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

SILÊNCIO DAS PALAVRAS.

  (Texto escrito por Ernesto Costa-Jó-Jó (postagem de 31-10-2010)

Axioma: Somos todos diferentes.
Teorema: Somos todos diferentes, logo todos precisamos das diferenças dos outros.

O silêncio não existe, existem silêncios, e todos os silêncios são diferentes. O que significam de diferente está guardado nas palavras que os abraçam, sim, mas sobretudo nos olhares e nos seus corpos. Sem corpos não há silêncios. Os silêncios não são um tempo, são um modo de estar de cada ser. Se os silêncios fossem tempo, chamávamos-lhes música.

(recordo-me de ser miúdo e ouvir regularmente o seu som, tique-taque, tique-taque, Oh pá, diz algo que valha mais do que o silêncio, o meu pai, ser sem plural, à mesa de jantar na pressa de terminar a refeição e voltar para o tique-taque solitário do ele-máquina-de-escrever-do-escritório, que palavras eram aquelas, tique-taque, tique-taque, que afogavam as minhas nos silêncios?)


Os silêncios têm uma aritmética própria. Quando os somamos, multiplicam-se, se os multiplicamos transformam-se em espirais. Se elevamos as espirais alcançamos o infinito, vazio. Amante enganado das palavras, demorei tempo, muito tempo, a entender que são os silêncios, todos os silêncios, que realçam as palavras

(lembro-me dos primeiros tempos de fazer amor, da força das palavras ditas, que ascendiam ritmadas para o êxtase, o cigarro depois, e o tique-taque, tique-taque, os silêncios dos eu-coração-que-ainda-bate-forte)

mas também são as palavras que criam os silêncios. São as palavras, algumas palavras, que têm os silêncios maiores. Há silêncios nas palavras.

É, que...

Há palavras carregadas de silêncios presentes
(amo-te, dito na separação)

Há palavras carregadas de silêncios passados
(agora não, no reencontro desajeitado)

Há palavras carregadas de silêncios futuros
(amanhã ... talvez, dito na despedida)

Há palavras carregadas de silêncios sem tempo
(morreste-me, dito antes de concluir)

Há palavras.

Há.

tique-taque,...

Jó-Jó

(agradeço ao Rui Felício as belas palavras escritas que acompanharam este meu silêncio de fim de tarde de domingo. o que ele disse, mas também o que ele não disse, foram a minha preciosa companhia)

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