sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

O REAL DAS CANAS ...




( foto de Fernando Rafael)

O meu estimado amigo Fernando de Oliveira Rafael, nasceu a poucos quilómetros de Coimbra. Gosta da sua bela vila de Penela que foi seu berço, e também da cidade universitária mondeguina onde vive. Balança portanto, entre estes dois amores: Penela e Coimbra. De Coimbra, que um dia foi capital do reino antes de Lisboa e teve no Mosteiro de Santa Cruz o primeiro Panteão Nacional onde jaz o Fundador, Fernando Rafael vai calcorreando ruas e praças, na descoberta deste ou daquele pormenor de interesse para fotografar, como é o caso de artísticos edifícios de cantaria trabalhada, ou de becos medievais e míticos da urbe. Por vezes – muitas vezes – o veraneante bebe o cálice amargo da decadência, que mais se acentua quando Coimbra foi  seu berço e viveu outras realidades. Não quero agora fazer aqui uma busca exaustiva de locais ou de espaços comerciais emblemáticos da nossa cidade, que foram devorados por um novo tempo. Nem da cintura industrial, que era também o sangue vivo que fazia pulsar as artérias estreitas da baixinha, com o poder de compra dos que tinham o seu emprego garantido. E, lá no alto, como imagem de marca de uma cidade única, o coração emblemático dos que cá nasceram: a Torre da Universidade.
Todos os dias visito este espaço do meu amigo. E há dias, no silêncio dos meus pensamentos, olhei esta foto de uma casa degradada, lá para as bandas do Miradouro do Vale do Inferno. Aquela memória diante dos meus olhos, foi um dos mais afamados restaurantes da cidade. Situado na margem esquerda do Mondego, o Retiro Real da Canas pela sua vista privilegiada para o rio e para o anfiteatro da cidade, e também pelo excelente serviço de restauração, era um marco na arte de bem servir o cliente. Porém, esta fotografia inquietante, trouxe-me também outras recordações. A lembrança das tardes soalheiras de domingo, quando no velho Estádio Municipal de Coimbra, uma genuína Académica recebia um dito clube grande de Lisboa, com o estádio pintado de vermelho e a romper de multidão pelas costuras. Eles, os de Lisboa, eram sempre favoritos na contenda. E nós, os de Coimbra, na secreta esperança que o rato conseguisse enganar o gato. E, pela instalação sonora do estádio, lá vinha o anúncio que era quase um hino de fé: o jogador da Académica que marcar o golo da vitória, tem direito a um almoço grátis no Retiro Real das Canas.
Era Coimbra. Uma outra Coimbra. Uma Coimbra entre muros, menos indiferente, mais intimista e mais barricada na defesa da sua genuinidade e dos seus valores intrínsecos. Uma Coimbra dos seus cidadãos. Uma Coimbra mais solidária e mais nossa.
QP

12 comentários:

  1. Até eu, que sou de trás da Serra e só cheguei a Coimbra há 40 anos, noto bem essa diferença.
    Coimbra, actualmente... olha, nem é carne nem peixe!

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    1. Os tempos evoluem e não se pode parar. Mas evoluir não quer dizer perder-se irremediavelmente a matriz de uma cidade e o comboio do progresso. E eu acho que Coimbra está a perder as duas coisa. Um estudo qualquer diz que somos hoje a 16ª ou a 17ª cidade nacional, o que me parece discutível se atendermos que Coimbra foi a 3ª cidade portuguesa.
      Um abraço, Paulo

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  2. Fois é amigo Quito, na preocupação de ir dando vida ao "Encontro de Gerações" e com assuntos que tenham algum interesse, vou calcorreando a nossa Coimbra e dando assim a conhecer ou a revisitar alguns dos seus "Recantos" não só mais emblemáticos outros locais menos conhecidos.
    Já me é difícil descobrir mais espaços com interesse..
    Mas o blogue lá vai singrando com tua colaboração, agora mais assídua depois que fomos infelizmente privados do saudoso Chico Torreira..
    Bem aproveitada a postagem sobre o "Real das Canas" (abandonado e degradado) para recordar-se outros locais de Coimbra, como a passagem pelos jogos de futebol da nossa Académica.. com almoços oferecidos ao jogador que marcasse golo precisamente no emblemático restaurante.
    Só saudades para recordar pela vida fora.

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    1. Vamos caminhando, Rafael. Com o risco de se puder achar que pretendo um protagonismo que rejeito.É este meu espírito associativo, que me leva a colaborar no teu blog, enquanto o mantiveres. Por outro lado, o teu blog dá-me a motivação para prosseguir este passatempo de escrever. Hoje, é algo de lúdico. No passado, foi uma terapia. Por vezes com textos mais conseguidos e outras nem tanto. Quando o EG fechar, meto a caneta no bolso do casaco e arrumo a bagagem. Mas para já cá estou, para te ajudar a continuar a dar corda ao relógio.
      Um abraço

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  3. Bom dia o Quito é uma enciclopédia Viva.
    obrigado

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    1. Eu não sou nada, Lucinda. Enquanto este blog for andando, vai aparecendo. É a forma possível de termos o Francisco por aqui.
      Um abraço para ti e para a tua filha ...

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  4. A modéstia fica-te bem, mas deixa que te diga que os teus textos são de elevada qualidade, em todos os aspetos.

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  5. Não se trata de modéstia, mas das minhas naturais limitações na arte de alinhar as palavras. Estou certo de quem por aqui passa e vai lendo os textos, por certo compreenderá e aceitará do meu total amadorismo.
    Mas não posso deixar de agradecer as palavras de incentivo que me vais dirigindo. Bom domingo, Manuel Cruz.
    Um abraço

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  6. Sempre que vinha a Coimbra passar o fim de semana depois de umas horas de cansativa viagem ( a auto estrada ainda não existia ) fazia uma paragem obrigatória no miradouro do Vale do Inferno para mitigar saudades da minha cidade e para incutir nos meus filhos ainda miúdos o gosto pela bela urbe onde nasci.
    Explicava-lhes mais abaixo que o Retiro Real das Canas era um restaurante dos melhores e mais afamados de Coimbra.
    Curiosamente, sempre adiei por isto ou por aquilo marcar lá um almoço com a família.
    Um sitio onde afinal nunca entrei...
    Pela fotografia que ilustra o texto, o restaurante outrora famoso e agora decadente já não receberá a minha visita.
    O Quito põe o dedo na ferida, explicando com a sua mestria o descalabro que foi roendo a vida da nossa terra, tanto nas vertentes comercial, industrial, social e cultural.
    Salvem-se os marcos históricos que não podem ser apagados e que Quito Pereira assertivamente menciona.

    Que os poderes públicos façam lembrar que o Panteão Nacional não existe só em Lisboa mas também na Igreja de Santa Cruz que acolhe D. Afonso Henriques fundador da nossa Nação

    Obrigado Quito

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    1. Realmente o Real das Canas era naquela época talvez o mais emblemático restaurante de Coimbra. Quanto ao Fundador, estou convencido se se perguntar a 90% dos portugueses onde está sepultado são capaz de não saber. Coimbra valoriza pouco o que é seu.
      Um abraço, Rui

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  7. O dono do Restaurante das Piscinas Municipais e que depois foi também dono do Real das cans foi Fernando Martins Barata e que penso que era natural de Faro. Pertenceu a várias direcções da Académica.
    Penso que terá falecido em Faro


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  8. Aqui se reuniram muitos elementos da minha família para festejar os 80 anos de minha querida mãe!

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