domingo, 4 de abril de 2021

A ROTUNDA FACE DE DEUS - de RENATO ÁVILA

 A ROTUNDA FACE DE DEUS

Deus?

Pessoalmente,

Não O conheço!

Jamais Lhe vi a face!

Preto?

Branco? 

Amarelo…?

Quantos olhos?

Quantas orelhas?

Meus olhos varrem o firmamento,

Minhas mãos apalpam o espaço…

Todavia, em vão, 

Não O encontro.

E, no entanto, 

Tudo me fala d’Ele.

Leio nas linhas e entrelinhas

De bíblias e alcorões, 

Das teodiceias,

Das escatologias,

Das resmas de escritos

De crentes e agnósticos

Das aparições 

E outras revelações

E só me falam duma voz  

Grave e solene,

Poderosa!


Da face,

Nem um traço, 

Um reflexo!


Os crentes,

Fervorosos,

Aguardam piamente

O etéreo momento

De O verem

Com os olhos da alma!

Os artistas

Deram-lhe rosto humano,

O rosto do juízo final!


Na miraculosa, 

Na deslumbrante complexidade da Criação,

A conhecida e a desconhecida, 

Por que imperativo teria o Criador

Este humano frontespício???


Abri desmesuradamente 

Os olhos,

Remexi aturadamente 

O espírito,

Devassei todos os horizontes 

Possíveis,

Imaginários,

Bisbilhotei todos os recantos

Todos os escaninhos,

Apontei telescópios e microscópios,

Mirei quadros e esculturas,

Monumentos e demais arquitecturas

E comecei a entender

O selo da divindade.


O rotundo,

Circulante,

Rolante,

Coleante,

Enleante…

O ancho, 

O abrangente.


Os astros e os seus movimentos,

A gota de água caindo na flor,

As ondas do mar enrolando na praia, 

As velas pandas ao vento, 

Os animais e os frutos da terra,

As aves do céu,

 Os peixes do mar…

A ovular universalidade da procriação,

Os rituais da fecundação,

O diligente cirandar da abelha,

As danças corteses e nupciais 

O gentil balancear da flor…

A rotunda imagem da gestação.


E o arredondado esmero 

Dessa diva obra-prima:

A mulher?!

As caprichosas ondas dos cabelos,

O cintilante arredondado dos olhos,

O elíptico desenho dos lábios,

A sigmática leveza dos ombros,

A cósmico arredondado dos seios,

As lascivas ondulações das ancas e da cintura,

O suavíssimo torneado das pernas,

Meneando,

Ondeando, 

Requebrando…

O  sacrossanto, 

O esférico esplendor 

Da maternidade…

Os círculos do afecto:

O beijo,

O abraço…

O generoso,

O infinito

Amplexo do amor!


Meu Deus,

Em tanta beleza,

Em tanta justeza,

Em magnanimidade tamanha, 

Extasiados,

Os meus olhos divisam

O rotundo da Tua face!


Páscoa de 2021


2 comentários:

  1. Ninguém o Vê mas toda a gente chama por Ele.
    Um abraço.

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  2. Excelente. Esta métrica desalinhada lembra-me os primeiros poemas do Ary (Aristóteles visita da casa de minha avó).

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