Orion ...
Por aqui, neste Lugar de solidão, a terra dobra-se de dor,
como o gemido tétrico das cordas de uma guitarra. Percorro o trilho das estevas
queimadas e nem a voz mansa do vento na campina, aparta o calor que me abrasa o
corpo e a alma. Ali, naquele poço, já só oiço o eco da minha voz. E, no fundo,
no fundo do poço, aquele resquício de espelho de água, mais não é que os despojos de dias de saudosa
glória. Da glória das tardes chuvosas de outono. Das tardes em que o Homem
campesino, ergue nas mãos calejadas, a terra ensanguentada de água, a seiva da
sua sobrevivência. E eu aqui. A percorrer esta hiato da Vida. Lá longe, na
paisagem ondulante que parece engolir a fita de estrada estrangulada entre
vales e planícies, descubro um ser. É um homem. Pedalando devagar, percorre de
bicicleta os caminhos do infinito, balançando o corpo entre uma linha ténue que
divide este Agosto impiedoso de falta de água, e a esperança dos dias que
virão, com a charrua a ferir a terra fofa e a sinfonia dos regatos saltitantes
de fraga em fraga, a silenciar o clamor universal da cantiga das cigarras.
E logo, quando as sombras da noite se adensarem sobre os
telhados da aldeia centenária, estarei sentado por aí. Talvez uma fonte
generosa me dê ainda de beber da sua água cristalina e eu oiça - no vértice dos
meus cruzados sentimentos e tendo como testemunha estrelar a constelação de
Orion - uma ode refrescante de esperança,neste ciclo tormentoso de Verão.
Quito Pereira