Orion ...
Por aqui, neste Lugar de solidão, a terra dobra-se de dor, como o gemido tétrico das cordas de uma guitarra. Percorro o trilho das estevas queimadas e nem a voz mansa do vento na campina, aparta o calor que me abrasa o corpo e a alma. Ali, naquele poço, já só oiço o eco da minha voz. E, no fundo, no fundo do poço, aquele resquício de espelho de água, mais não é que os despojos de dias de saudosa glória. Da glória das tardes chuvosas de outono. Das tardes em que o Homem campesino, ergue nas mãos calejadas, a terra ensanguentada de água, a seiva da sua sobrevivência. E eu aqui. A percorrer esta hiato da Vida. Lá longe, na paisagem ondulante que parece engolir a fita de estrada estrangulada entre vales e planícies, descubro um ser. É um homem. Pedalando devagar, percorre de bicicleta os caminhos do infinito, balançando o corpo entre uma linha ténue que divide este Agosto impiedoso de falta de água, e a esperança dos dias que virão, com a charrua a ferir a terra fofa e a sinfonia dos regatos saltitantes de fraga em fraga, a silenciar o clamor universal da cantiga das cigarras.
E logo, quando as sombras da noite se adensarem sobre os
telhados da aldeia centenária, estarei sentado por aí. Talvez uma fonte
generosa me dê ainda de beber da sua água cristalina e eu oiça - no vértice dos
meus cruzados sentimentos e tendo como testemunha estrelar a constelação de
Orion - uma ode refrescante de esperança,neste ciclo tormentoso de Verão.
Quito Pereira
E as plêiades ou « sete estrelo » são a constelação de inverno.
ResponderEliminarAntes era assim hoje com tantas modernices, já não sei se será.
Tonito.
Um abraço, Tonito ...
EliminarOrion, desterrado para os confins da cauda da via láctea, onde nos indica o lado do mar, a oeste, morreu por amor.
ResponderEliminarFoi o castigo que lhe inflingiu Apolo, irmão da bela Artemis, por quem Orion se apaixonou perdidamente.
E mar é água.
E água é vida.
A vida que o estio e a seca parecem matar em cada verão que passa...
Mas a ode de refrescante de esperança que o Quito espera ouvir, sob o testemunho de Orion, garante-nos que em breve virão as chuvas que enchem os poços, empapam a terra e retomam o ciclo infindável da vida.
Parabéns Quito por este desfiar de reflexões a que a tua escrita envolvente nos obriga!
Tens andado muito calado, Rui ! Desejo-te umas boas férias, por cá ou por longe ...
EliminarComo mais uma ode refescante de esperança aconselho-te a observares o lindo
ResponderEliminarluar de Agosto quando estiveres sentado por aí...
Abraço, Olindita ...
EliminarQuito nos bons momentos de escrita a que já nos habituou!
ResponderEliminarE os comentários que provoca são para mim uma mais valia que muito aprecio!
Um abraço
Boas férias, Rafael ...
EliminarUm bonito poema! Abençoado Salgueiro do Campo que tanta inspiração dás ao Quito!
ResponderEliminarDuvido muito, que o Quito escrevesse coisas destas, sentado a uma mesa do Samambaia...
Duvidas bem, Alfredo. Abraço para ti e Daisy e boa estadia por Quiaios ...
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ResponderEliminarMais uma vez, poesia em prosa. Mas, desta vez, a sonoridade do texto a ninguém deixa escapar a profunda mensagem prosaica, dita em poesia.
A água, elemento essencial da vida, é a grande protagonista.
O Quito faz-nos perceber a total dependência da nossa sobrevivência, nossa, enquanto humanos, deste bem da natureza.
Não será por acaso, e tenho o atrevimento de pensar que o autor se terá inspirado nesse facto ao ir até Orion, que as buscas da ciência humana se concentram na possibilidade de existência de água noutros planetas. Porque, se a houver, dizem, haverá vida extra-terrestre.
Por "curiosidade" é Marte que está a ser sondado. Mas, confesso-vos, eu preferiria que os cientistas aplicassem os seus conhecimentos no estudo do projecto para defender a água no planeta Terra e que os países com capacidade para desenvolver essas investigações nisso investissem.
Para sobrevivência dos nossos netos!
Quito, aquele abraço.
Igualmente para ti, Viana. Mais apertado, por ser dia de aniversário ...
EliminarUma prosa poética de um Quito, desta feita, virado para a astronomia!
ResponderEliminarUma leitura tão agradável!
Boas férias, Celeste, na companhia do Castelão Rafael ...
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