Diz António Gedeão, que o sonho comanda a vida. Será. Na
primavera da existência, todos sonhamos. É quando o sol nasce e nós temos a
ilusão que é para todos. Não é.
Vem isto a propósito de algum desencanto que pressinto nas palavras do nosso amigo Carlos Viana. O sonho esbarrou na dentadura do cantor, pela pena do Rui Felício. Afinal, a tal metáfora que traduzirá o desalento dos ideais sonhados e das realidades cruas da vida.
Já percorri algum mundo. Vivo sitiado dentro de mim,
balançando entre o bulício citadino e a realidade campesina. Aqui, de onde vos
falo neste monólogo pardo, vejo-me rodeado de montanhas. Lá fora, está uma
temperatura agreste, mas um sol clamoroso. É a neve na Serra da Estrela, vestida
de branco da cabeça aos pés, que transporta esta aragem fria, que me faz
resguardar o pescoço na gola do casaco.
Por aqui, os sonhos também comandaram a vida. Tal como hoje,
os campesinos partiram de mala na mão, o saco da merenda atado com uma guita e
os filhos pela mão. A França ou a Suiça, eram os locais de peregrinação, na
esperança de uma vida melhor.
Hoje, cansados e refletindo
no rosto o desencanto, muitos voltaram. Regressam velhos e tristes. E até
desiludidos.
Dos que ficaram, muitos faziam do Café ou da Farmácia da aldeia, o ponto de encontro das conversas. Sentados em semicírculo, falavam da lavoura e da vida. Era a tertúlia campesina, que eu ouvia em silêncio e que me preenchia horas de meditação. Muitos, para não dizer todos, já partiram. Esfumaram-se os sonhos. Esfumou-se a vida.
Quando já caminhamos para poente, o sonho é uma utopia. É
quando já nos anulamos a nós próprios e transportamos os nossos sonhos
desfeitos para os filhos e os netos. A vontade que temos de os ver singrar
nesta arena competitiva, impotentes que nos sentimos de os proteger das
pancadas da vida e de uma sociedade cruel e destrutiva. Vamos amparando da
retaguarda, como farol vigilante das tempestades do mar.
Os sonhos esbarram na realidade. E o cheiro acre da
decadência e da desilusão, percorre o meu quotidiano beirão vários dias por
semana. Conviver com idosos, gente que um dia conhecemos no pleno vigor da vida
e que agora se arrasta como quem já caminha para o infinito.
Muitos haverá, a quem as portas da vida se abriram a batentes
de ouro, no prosar de Eça. Mas o Tempo, na sua inexorável caminhada, se
encarregará de diluir as esperanças. E no fim, filtrada que foi a vida e
diluída na proveta das emoções, percebemos que o resultado final dos reagentes com
que sonhámos para compor a acordes de violino uma melodia Divina, mais não é que um requiem de utopia.
Quito Pereira
Queixo me de mim próprio, por ter dado o mote à melancolia que se apoderou do Viana, primeiro e do Quito agora.
ResponderEliminarValha-me ao menos o prazer de ler a excelenet prosa do Quito, que essa não fenece, antes vibra cada vez mais pujante, mesmo quando serve para nos lembrar que as ilusões e os sonhos vão desaparecendo com o tempo.
Quando caminhamos para poente, o sonho é uma utopia.
Que melhor sintese do que esta que o Quito escreveu?
Mas a utopia é o sal da vida, digo eu, e não morreremos enquanto a alimentarmos.
Melancólico quem não anda? Só se fosse resignado e comodista.
ResponderEliminarOs sonhos alimentaram-nos ao longo da vida e não é agora no final,no poente,que não os deixamos fenecer...
Dou-lhes alimento suficiente e a utopia é também um móbil para desencadear uma meta de felicidade ou de de estado moderado de felicidade( que suponho ninguém sabe o que é) até "morrermos de pé"!
Sou contra o requiem da utopia,Quito.
Mas digo-te uma verdade gostei do teu texto...uma temática interessante e diferente do que nos habituaste.
Continua a supreender-nos!
Será utópico pensar-se que o sonho é realizável?
ResponderEliminarPor outras palavras, será que o sonho não passa de uma utopia gravada em papel dourado?
Respondo categoricamente que o sonho pode esbarrar nas mais diversas barreiras mas a utopia ultrapassará todos os muros e fronteiras.
A grande diferença está no facto de o sonho ser um acto isolado, quase solitário. Mas, quando aqueles que têm esse sonho, tarde ou cedo, conseguirem abraçar muitos e muitos mais, então o sonho deixa de ser utópico porque aquilo que hoje é mera utopia deixará de o ser amanhã.
E é bem verdade que o sol nasce diáriamente para todos nós, não deixando de ser verdade que alguns, com a sua soberba, egoísmo e poder já alcançado, só quererão manter os outros na sombra.
Quando caminhamos para poente, o sonho parece-nos mais distante, portanto, mais utópico. Mas deixará de o ser quando olhamos para trás de nós e vemos que deixamos um rasto aberto para continuar a busca do sonho que é, afinal, alcançável.
A utopia é, de facto, o sal da vida.
Chego a ter dó dos opulentes donos do sol que nunca conheceram, nem conhecerão, esse sabor da vida.
Ola Quito e Felício, pró que nos havia de dar...
Aquele abraço.
Em tempo: com a Linda Olinda a ajudar à "missa"...
Eliminarah,já estava a ficar má como as cobras,Carlos....
EliminarSei que sou muito sintética e nada elaborada como Vossas Excelências mas todos temos que ser ouvidos,compreendidos ou não,porque as minorias têm os mesmos direitos embora continue a lutar-se por esta valorosa utopia!
Bem também sou mulher mas da mesma forma lá estava a injustiça a imperar.
Como te conheço bem e te estimo ainda mais toma lá um beijinho.
Sinceramente que não sei que escrever perante o que leio no texto da postagem e depois nos comentários!!!
ResponderEliminarNão tenho "cabedal" literário para vos acompanhar!!
Já baralho tudo!Utópico, realidade, sonho, poente, eu sei lá!.
Mas caraças, virem lá para o positivismo, mesmo POSITIVISMO!
Vá, este dia está quase a passar, a onda negativa também vai desaparecer...e um texto de optimismo está ao dobrar da esquina!
OK?
Concordo que a utopia é o sal da vida. Como concordo que este texto tem o seu lado negro. O lado mais simpático são as vossas opiniões. A frase do Felício, referindo-se ao sal da vida, é lapidar. O longo prosar do Carlos Viana, como sempre muito bem articulado no seu pensamento, será talvez um pouco de Quixotesco. Afinal, um pensamento comum a muitos de nós, quando tentamos remar contra o inevitável. Faz parte da nossa vertente humana. e ainda bem que é assim. A Maria Olinda no seu jeito arrebatado de quem vive com paixão, sentiu o texto à sua maneira e mobilizou as suas armas contra ele. Ao contrário do que a Olinda poderá pensar, apreciei a sua faceta lutadora.
ResponderEliminarMas o texto, reflete o meu pensamento. Talvez por isso eu não simpatize de todo, com a palavra inevitável.
Um abraço a ambos os três ...
Enquanto eu fazia o último comentário, apareceu o Fernando Rafael. Pois que se faça a sua vontade, Viremos para o lado brilhante da Lua, Se bem me entendes Rafael, já oiço um galo a cantar.
ResponderEliminarToma lá um abraço ...
É isso mesmo Quito! Tem toda a "cabidela" virar para o lado da Lua crescente a caminho da cheia de vida sorridente!
EliminarEnquanto o galo cantar não há cabidela para tristezas!!! Desta vez vais ver que quando o galo deixar de cantar, cantemos nós! As Janeiras. Não à noite mas ao meio dia!!!
Com coisa tão alta de empenho eu digo simplesmente«mais vale todavia nunca do que 2 em comparação jamais».
ResponderEliminarAhahahah ... grande comentário António ....
EliminarDepois de tudo o que foi escrito, eu estou como o Rafael: não tenho cabedal para vos acompanhar.
ResponderEliminarTambém quero um abraço teu, Quito, e, para os outros intervenientes, um abraço amigo da
Ló
Pois toma lá um abracito, minha amiga Ló ...
EliminarAdoro ler textos destes escritos pelo Quito e os respectivos comentários, mesmo tristes. Que maravilha.
ResponderEliminarSó que depois da tempestade vem a bonança e essa estou crente que não será utópica.
Ainda venho a tempo de vir aqui dar-te um abraço, Francisco. Não é utópico. É real,apesar de virtual por cima do Atlântico ...
ResponderEliminarTens razão, Quito. Nem tinha notado que daqui é virtual mas aí vai ser bem real, não tenho dúvidas.
EliminarUm abraço
Francisco
Como eu gostaria de acreditar na utopia!
ResponderEliminarSonhar e acordar envolta em magia.
Afinal, alegria
rima com nostalgia...
Agita-se a proveta
e, ora dá curva
ora dá reta!