quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

AO CORRER DA PENA NO CORRER DOS DIAS ...


O mundo campesino. Uma outra realidade ...
Mais um ano passou. Chegou e partiu, como uma estrela – cadente riscando os céus. No seu rasto, ficaram muitas dúvidas, angústias e preocupações. Agora, no renovar do ciclo interminável dos Anos e da Vida, novos desafios se avizinham. Pressente-se a tormenta. E eu, que vou deambulando por serras, planaltos e planícies sem fim, vejo no olhar de quem passa e me cumprimenta, um mar de inquietações. O povo, anda com medo, desta engrenagem sinistra em que se começa a sentir trucidado. Diz-se, em surdina, que a pequena mercearia da aldeia vai fechar. O espaço, exíguo, dava para a proprietária viver com dificuldade. Agora, que lhe é exigida a informatização do pequeno comércio, decidiu atirar a toalha ao chão. Não tem capacidade financeira para tão grande investimento, nem conhecimentos informáticos que lhe permitam obedecer aos homens das botas - cardadas. Os tais, que nos corredores da capital, vivem na sua redoma dourada dos números, incapazes de, por um minuto que seja, se sentarem na borda uma fonte, a contemplarem o cantar de um regato transparente. Desconhecem, por insensibilidade, o som envolvente de um violino. Apenas se reconhecem nas arestas agudas de uma pedra lascada. Vivemos na era do “ter”. Despreza-se a era do “ser”. Agora, somos simples números, num um jogo de sorte e azar, para deixarmos de ser pessoas.

Talvez eu hoje não esteja bem. Há pouco, quando descia a estrada junto à “Fonte Fria”, com um vento agreste e serrano a cortar-me o rosto, dei comigo a pensar em tudo isto. E a matutar, também, em como para muitos são ocas as palavras do muito que vou escrevendo, sobre os horizontes e os mistérios do mundo campesino. Os que vivem nas grandes urbes, cercados de informação, do bulício dos dias, do frenesim dos transportes, dos apaixonantes acontecimentos desportivos ou dos duelos políticos, pouco ou nenhuma importância dão à outra realidade que vou lavrando com a minha pena, para um grupo restrito de amigos.

Conheço bem esses dois mundos. O mundo citadino e o mundo rural. Por ambos, vou passeando a minha pacífica existência. Tenho consciência, que estou muito aquém da cultura e sabedoria de muitos. Mas entendendo, também, que noutros casos, nem tudo o que luz é ouro. Sou um Conimbricense de alma e coração, nascido no Choupal ? Sou. Serei um iletrado aldeão, na mente de alguns? Talvez.
Mas serei sempre eu.

A todos, desejo um BOM ANO NOVO.

Quito Pereira    

10 comentários:

  1. "Quando morre um africano idoso, é como que se se queimasse uma biblioteca" Quem disse isto foi um poeta do Mali, de que lamentavelmente esqueci o nome.
    A frase, contudo, ficou-me gravada para sempre na memória, de tantas vezes me ter sido citada nas conversas que tive com os homens velhos e sábios das tabancas da Guiné, por onde passei.

    “ O homem mais sábio que conheci na minha vida era analfabeto”
    Quem disse isto foi Saramago, referindo-se a seu pai que toda a vida foi um aldeão da Azinhaga do Ribatejo.

    Faço estas citações a propósito do último parágrafo deste texto reflexivo com que o Quito nos convida a com ele reflectirmos também.

    E cito-as, para, escudado nestas assertivas e profundas afirmações do poeta africano e de Saramago, manifestar a minha convicção, que não é de hoje, que o saber e o conhecimento da vida não são obrigatóriamente compagináveis com a literacia.

    Sem ser aldeão, e muito menos iletrado ( bem pelo contrário ), o Quito tem bebido a sabedoria dos aldeões com os quais se cruza há anos, atento e observador, transmitindo-nos com o reconhecido dom da escrita que possui e que nos encanta, os conhecimentos e a sabedoria que deles recolhe.

    Mesmo que o Ano de 2013 venha a ser tormentoso como tudo indica, já será um Bom Ano se, como esperamos, o Quito regularmente nos for brindando com os seus textos.

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  2. Os que mandam nisto ainda não se aperceberam que este país foi sendo transformado muma coisa que, comparado com as sociedades desenvolvidas do centro da Europa, não passa de "uma mercearia de aldeia".
    Mas, enquanto houver quem seja capaz de olhar em volta com lucidez e inteligência, como faz o Quito, a fatalidade acabará por soçobrar.

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  3. Poderás ser de tudo um pouco...não há pessoas perfeitas e ainda bem!
    Agora consciente da realidade campesina e da urbana consegues transmiti-las de uma forma realista e sensível,porque a diferença bem a conheces... "arrepio-me" porque me "dás" esses quotidianos humanos vividos com dificuldade mas com dignidade e a indiferença não pode ter lugar em nós!!!
    A comunhão e a solidariedade em que se traduz a tua convivência com esses mestres cuja "escola" foi o trabalho, a família ,a vizinhança e a ausência da "desinformação" é o grande saldo positivo que tens em relação a nós.
    A tua partilha connosco é excepcional...que mais posso dizer? Escreve sempre!

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  4. Pelo mundo citadino também se passam coisas curiosas.
    Ontem vi um dono duma casa de pasto todo aflito, pois o sistema que comprou estava a actualizar, mas trabalhava sozinho,(falo no novo sistema de facturação).
    Está tudo tratado mas nada resolvido.
    É o raio da nossa sina,dos gabinetes, quem lá esta vomita leis para a rua sem ter conhecimento do que se passa fora do antro onde vivem.
    Haja saúde e coza o forno (mas em lume brando).
    Tonito.

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  5. Um pequeno texto e tão grande no seu conteúdo! Só que escreve bem é que o consegue fazer.
    Sobre o tema da informatização do micro-comércio, chega a ser chocante, quando todos sabemos que os que ganham milhões fogem ao pagamento de impostos e a alguns até lhes são perdoadas as dívidas! (como aconteceu a bem pouco tempo com o Victor Baía e o Isaltino).

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  6. É um texto que aborda um tema que é preocupante para as populações rurais.
    Claro que te preocupas porque vives o dia a dia dessas pessoas que lutam com dificuldade para ganharem o seu sustento e dos seus.
    Quanto ás "tais máquinas" ainda nãp percebi bem quem é obrigado a tê-las.
    No noticiário da SIC foi entrevistado o Secretário de Estado do Tesouro que esclareceu que a obrigação de passar factura com o número de contribuinte do cliente, para já só abranje 4 sectores: restauração,alojamento, oficinas de reparação mecânicas(automóveis, motociclos,etc) e cabeleireiros.
    Será assim?Isto foi o que ouvi.O pequeno comércio não será só a partir de um determinado movimento de vendas?
    Bom Ano 2013!

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  7. iletrado
    adjetivo e nome masculino
    1. que ou o que não sabe ler nem escrever; analfabeto
    2. que ou o que tem pouca instrução
    3. que ou o que não tem conhecimentos literários
    (Do latim illitterātu-, «idem»)

    iletrado In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013.

    Serás uma "opção 4", Quito?

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  8. maria helena morgadojaneiro 04, 2013 9:33 da tarde

    «Fonte Fria» é a aldeia onde nasceu o meu marido mas pertence a Ourém!
    «Um pequeno texto e tão rico de conteúdo!» como diz o Alfredo. Algumas considerações já foram feitas de forma brilhante.
    Humildade, sensibilidade, simplicidade, solidariedade ... são valores que reconheço no Quito

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  9. Na minha terra não tenho as tuas vivências, Quito!
    Afinal viver em Salgueiro do Campo enriquece o espírito e aguça o engenho dos que têm a facilidade para a escrita como tu.
    Sempre gostamos e aprendemos.

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  10. Quito!Os teus textos têm uma enorme particularidade. Nao podem ser lidos à tôa, em qualquer momento.Sabia que estava aqui um dos teus textos e hoje,fui là!Sentadinho no meu escritorio, comendo uma maçä.(nao havia laranjas,, para me aproximar do Rui Veloso).Sem ninguem para me chatear!
    E a beleza rural dessa narraçao invadiu este espaço, onde tantas vezes se criam slogans revendicativos.Nao te esqueças que é um escritorio da Direcçao dum dos quatros sindicatos da Funçao Publica Francesa, no ramo da Investigaçao Agrària e Ensino Superior!!!S'il vous plaît!

    Quito!Entràmos num sistema de autodestruiçao!Tento lutar no dia a dia contra esse facto mas, na realidade estamos tramados!Começaram por nos alertar acerca da camada de ozono, da fusao dos glaciares e respetivas consequências, depois viràmos para os combustiveis (o petroleo iria escassar)sem esquecer a alimentaçao. Entretanto, os tais Senhores manda-chuvas começaram por duvidar desses estudos e respectivos responsàveis.Decretam-se politicas que vao contra todas essas diretivas de bom senso.Ataca-se a saude, diminuindo a lista de medicamentos candidatos a reembolso. A populaçao sofre e é sacrificada!Cresce a lista de idosos e nao hà politicas de alojamento medicalizado!

    ESTE MUNDO ESTA LOUCO!!!Prova disso?

    Ontem de manha, em França, no Pais dos Direitos Humanos,uma idosa de 94 anos foi expulsa duma Residência geriàtrica, por nao pagamento das mensualidades.A sua divida elevava-se a 40 000€!!Em pleno periodo de frio, o Diretor da dita residência, pô-la na rua,mandando chamar uma ambulância, que a transportou (com todos os seus poucos bens) para um hospital!!!!Depois de vàrias recusas, conseguiu ser atendida pelas urgências dum hospital. Aqui, os médias tomaram conta da situaçao e a "bronca" explodiu no Telejornal de todos os canais de TV!!!O Diretor viu-se obrigado a vir comentar a sua terrivel asneira e a pedir desculpa!!!!(E nao é Japonês)

    Tudo isto porque os filhos da idosa, estao em conflito com a Direcçao da residência para o pagamento da divida.Mas nunca era caso para se pôr a Senhora na rua!!!!!

    Aproveito para lembrar a todos que, os filhos e descendentes, sao responsàveis financeiramente, (no caso de os Pais nao poderem pagar)das mesadas dessas residências onde colocamos os nossos Pais!!!

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