quinta-feira, 5 de setembro de 2013

EM LOUVOR DOS BOMBEIROS DE PORTUGAL



Há, durante os meses de Verão, um Portugal que se diverte e se retempera das canseiras de um ano. Há também aqueles que, por razões profissionais, doença, incapacidade financeira ou simples fobia a viagens, passam as férias na zona da sua residência. E há ainda os outros que, zelando pelos bens de todos nós, colocam em risco o seu bem mais precioso – a vida.

Como cidadão, vou estando atento ao que se vai passando pelo país e é a morte de mais um bombeiro de Valença ocorrida hoje nos Hospitais da Universidade de Coimbra, que me faz partilhar com os amigos todo o meu pesar. São já sete os bombeiros mortos e muitos os feridos.

Talvez o facto da minha vida profissional ter sido ligada à floresta, me desperte ainda mais a atenção para toda esta tragédia. Recordo que numa situação de apuro, já lá vão muitos anos, me juntei a muitos outros funcionários florestais num violento incêndio em Arganil. Foi uma tarde e noite de pesadelo. Lembro-me de às primeiras horas da madrugada, estarmos todos exaustos e famintos.

Sei, por isso, dar o valor ao sofrimento destes homens e mulheres. Mas sei - também sei - que parte dos fogos florestais são de origem criminosa. A Policia Judiciária já identificou o perfil dos indivíduos que o fazem. Mas há igualmente interesses subjacentes a este flagelo, se pensarmos que a madeira queimada, vale muito menos dinheiro que uma árvore saudável e disso se queixam muitos proprietários, que vêm as suas florestas dizimadas, a serem pagas por preços irrisórios, numa lógica do “pega ou larga”, completamente desprotegidos e vítimas de oportunismos de ocasião.

Lembro-me de se organizar lotes de madeiras ardidas, para serem vendidos em hasta pública. E recordo a prática do “cambão”, entre industriais do setor, combinados uns com os outros, por forma a licitar os lotes por preços muito baixos, quando os “queimados” pertenciam às Matas Nacionais. Nada era transparente, a não ser o profissionalismo daqueles que, não ganhando nada com isso a não ser o seu salário, tentavam obter um preço justo para os Cofres Públicos. Afinal, uma dignidade profissional tão vilmente maltratada e posta em causa nos dias de hoje, para justificar práticas políticas obscuras.   

A morte de tantos bombeiros, porém, faz também refletir sobre a margem de segurança – se assim se pode chamar – a que estes homens devem trabalhar, no sentido de não serem surpreendidos. Ouvi muitas vezes – vezes sem conta – que a estratégia de ataque a um fogo urbano de grandes proporções (recordo aqui o Chiado, na capital) nada tem a ver com as técnicas de combate a fogos florestais.

Ainda há dias, uma patente superior dos bombeiros, alertava para esse facto. Uma situação grave, não pode tirar o discernimento a quem deve saber como não colocar os homens em risco ou, pelo menos, no risco mínimo de uma fatalidade. A idade dos nossos bombeiros falecidos, quase todos na flor da vida, faz-me meditar sobre a sua generosidade e no ímpeto normal de quem tem do perigo eminente, uma ideia que só é amadurecida com a experiência de muitos anos nestes sinistros. Estes jovens, homens e mulheres, são os nossos heróis. Um dia, alguém apelidou esta geração de rasca. Uma frase muito infeliz, de quem a produziu.

Nesse aspeto, aqui lembro a especialização de Mestres e Guardas Florestais no combate a fogos. Sempre lá andaram e, que me recorde, não tenho ideia de nenhuma baixa nesta classe profissional, neste particular.

Não será descabido aqui refletir, que o problema dos fogos florestais, não se resume a atacar um qualquer sinistro. É a montante que está a chave do relativo sucesso deste flagelo. Que o mesmo é dizer, que é numa ação concertada de toda as entidades envolvidas na preservação e manutenção do nosso património verde, na reflorestação, no reordenamento do território em termos de mancha florestal e na limpeza das matas particulares e do Estado, tão degradadas e entregues a si próprias, que poderá permitir alguma trégua em todas as épocas estivais. As lixeiras a céu aberto, em que se transformaram as matas, com a consequente carga térmica, são fatores de ignição que dão origem a uma percentagem significativa de incêndios.
Porém, há ainda que recordar as causas naturais, caso de trovoadas e faíscas, com uma componente elevada de risco. Dos incêndios de origem criminosa, é opinião generalizada que uma moldura penal mais rigorosa desmotivaria os pirómanos. Um engano, atrevo-me a dizer. Este tipo de crime sempre houve e sempre haverá e é de impossível resolução, se pensarmos que a mente de cada indivíduo é uma carta fechada e não é humanamente possível às autoridades, descobrir o que vai no íntimo de cada cidadão.  
A desocupação das casas florestais onde os guardas viviam com as suas famílias, também tem muito a ver, em minha opinião, com o abandono das Matas do Estado. Havia uma relação de proximidade e, cada Mestre ou cada Guarda, conhecia o perímetro florestal onde estava inserido, como as suas próprias mãos. Também dos assalariados florestais que, sob a sua orientação, removiam todos os pontos de conflito entre a floresta e o meio ambiente, suscetíveis de dar origem a focos de incêndio.

Naturalmente, que sempre houve este tipo de sinistros, mas a atenção era redobrada e os fogos postos uma realidade. Porém, as sete Administrações Florestais da Zona Centro – Aveiro, Mira, Figueira da Foz, Lousã, Bussaco, Arganil e Águeda – pugnavam pela manutenção deste património, herança importante para as futuras gerações.

Das casas abandonadas, pretendem agora requalifica-las para turismo. Mas a quem interessa fazer turismo numa antiga casa florestal, com um horizonte desolador de cinza e esqueletos de pinheiros, carvalhos e eucaliptos, pergunto-me? Nem tudo, após abril, correu bem. A fúria reformista, em alguns casos, levou a cometerem-se erros crassos, ostracizando quem, com conhecimento de causa, zelava por aquilo que nos pertence a todos – as Matas Nacionais.

Porém, é aos Bombeiros que venho aqui prestar a minha homenagem. Uma saudação bem sentida, com a preocupação e os votos de que todo o equipamento perdido neste brutal combate possa ser substituído e entregue a quem dele necessita, já que, infelizmente, o maior mal, a perda de vidas humanas, não há forma de recuperar. Apenas perpetuar a sua memória.

Bem hajam pela vossa abnegação e esforço, Bombeiros de Portugal.
Quito Pereira   

9 comentários:

  1. Um enunciado das causas dos fogos florestais feito por alguém que sabe do que fala, como é o caso do Quito Pereira, que nasceu no seio do Choupal e que, já adulto, trabalhou na área dos Recursos Florestais, vale para mim muito mais do que dizem muitos dos senhores engravatados que pululam nas nossas televisões vindos não se sabe bem de onde, para perorarem com ar catedrático que a culpa é do partido A, se eles são do B, ou do B se eles são do A.

    Perdeu-se o respeito até pela morte daqueles que arriscam a vida para defenderem o património de todos, desprezando esse heróico esforço em favor de inconfessados designios partidários.

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  2. Depois do 25 de Abril, havia a ideia que os Serviços Florestais eram para preservar e os bombeiros para combater fogos. Este opinião, em si, talvez fosse correta. Mas uma coisa é aquilo que se poderia ler num compêndio e outra bem mais realista, o que se passava no terreno. Os grandes conhecedores das técnicas de combate a incêndios estavam nos Serviços Florestais e os Bombeiros mais vocacionados para fogo urbano. O maior conhecedor de contra-fogos, por exemplo, era um Mestre florestal da Covilhã. Na verdade e parecendo impossível, um fogo também se pode apagar ...com fogo. Mas são necessários grandes conhecimentos para pôr em prática este tipo de combate. Uma coisa é certa: não é com recriminações e passar de culpas entre entidades que se minimiza o problema. O aparecimento de Brigadas de ação rápida heli - transportadas, foi uma excelente medida, que tem "morto" à nascença muitos incêndios. Mas a orografia dos terrenos é determinante numa aproximação ao solo para largar as brigadas. Nem sempre é possível.

    A desativação das Casa de Guarda, foi um tiro nos pés, na politica de vigilância florestal. Ninguém de boa fé, poderá perceber esta medida.

    Mais sete mortos. Ficaremos por aqui? Não sei. O que sei é que quem nos governa já devia ter tido o decoro de, pelo menos, decretar dia de luto nacional perante esta tragédia. Morreram por nós. Na defesa de PATRIMÓNIO QUE É DE TODOS.

    Como homem que nasci e vivi no seio da família florestal, é grande o meu pesar por tudo a que estamos a assistir.


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  3. Nem comento porque disseste praticamente tudo.

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  4. Grande Quito. Esta é a tua praia. Foi e continua a ser!
    Magnifico texto que devia ser publicado na imprensa, porque não no Diário de Coimbra ou Beiras?
    Um abraço

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  5. Quito

    Gostei desta homenagem aos bombeiros que veio na hora certa derivado aos últimos acontecimentos, descrita da forma que sabes e que foram falados na televisões desta província.

    Muito mais do que isso é o conjunto da tua postagem que reflete numa realidade de factos e que são conhecidos pelo que tenho vindo a ler nos nossos jornais. No caso da mal manutenção das matas, a situação vem-nos mostrar que muito foi alterado pelos mais variados motivos pois não só falta a manutenção do estado como todo o sistema social que se manteve económicamente depois do vinte e cinco de abril e que leva ao pagamento de baixos salários em vários tipos de emprego a pessoas com baixas habilitações académicas. Isso paga-se pois se o dinheiro não é gasto em salários, será mjuito mais em consequências. Depois ninguém os quer e as situações vão aparecendo. Gostei que falasses na prática do "cambão" que ao fim de "tantos anos" não compreendo como ainda existe, pois a nossa polícia tinha obrigação de já ter infiltrado essa gente. Bem mais forte é ou era o "cambão" da gasolina aqui, e ao fim de dois anos foram todos apanhados. Escutas telefónicas e não tiveram sorte nenhuma. Os motards criminalizados conhecidíssimos em todo o mundo, foram quase todos presos, excepto alguns que fugiram para o estrangeiro. A prova disso é que há uns três meses, um polícia da Cãmara de Montreal que estava de "férias" no México, teve de ser retirado de urgência de avião pois ficou todo partido, mesmo em país estrangeiro arriscam a vida. Também como foi visto em todo o mundo, vários presidentes de cãmara e de grandes companhias nacionais e internacionais foram presos derivado à infiltração física da polícia. Ontem soube-se com provas que vimos na televisão, que certos presidentes de principais centrais sindicais estavam feitos com o patronato de "alto gabarito", faziam reuniões e viagens no yate do "alto patronato". A polícia infiltrou-os e vêm-se em fotos. As escutas telefónicas iam dando a agenda dos acontecimentos para que eles os podessem infiltrar. Houve muita polícia de "férias" em muitas praias em ilhas de vários países. Até as maravilhosas refeições que faziam no yate, foram fotografadas. Como há parte em segredo de justiça, não sei se também não foram filmados e gravados. O presidente da cãmara do Quebec, indústrial de profissão e muito honesto, que se manda sempre para os cornos do touro, disse sempre que na sua cãmara não havia colisão de empresas nem corrupção de políticos. Ante-ontem a polícia trouxe a lume que não havia corrupção de políticos mas sim colisão de empresas que combinavam qual iria ganhar o concurso público que estivesse em causa e afastavam os potenciais atrevidos adversários que não aceitassem o sistema. Esse presidente da cãmara caíu das núvens porque nunca pensou que a mafia fôsse tão eficaz.
    Numa situação dessas já se sabe que ninguém quer falar pois o medo do que lhe aconteça ou à família, é grande.
    O que é que os principais responsáveis dos nossos médias andam a fazer? É a eles de criaram dentro dos seus serviços uma secção de reporters de investigação. Não pode ser só o reporter a ser o investigador por sua alta recreação, pois a maior parte das vezes os criminosos começam por metê-los em tribunal, se não os tentam matar como aqui já aconteceu. Ora todo este sistema de advogados, segurança pessoal do reporter em caso extremos mas raros é pago e por isso a tal secção tem sempre um suporte económico de alguns milhões por ano da sua direcção. Mas vão ganhar de longe com as notícias que dão em primeira mão e forçam a polícia a mexer-se. Têm orgulho em dizerem o que trouxeram a lume e qual o reporter.
    Todos dizemos que temos uma excelente polícia mas o que é que os responsáveis pela nossa polícia andam a fazer? – Sendo casos conhecidos de todos, falados em jornais e em blogues já há tanto tempo, é incompreensível.
    1/2

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    1. 2/2
      Voltando aos bombeiros: por aqui a situação é outra pois os meios em combate são muito superiores com a utilização de aviões cisternas que transportam grandes quantidades de água, Bombardier Canadair CL-415, autêntica frota aérea. Só que esses meios aqui são possíveis porque o Quebec está polvilhado de grandes lagos, aonde os aviões se podem abastecer sucessivamente em fila indiana práticamente e não param. São uma autêntica força aérea de bem fazer. É certo que têm evacuado cidades preventivamente mas ainda nenhuma foi atingida. Esta água é uma dávida Divina, como se diz.
      Enfim, esperemos que não tenhamos mais vidas a lementar pois é pessoal de muito valor e provávelmente mal pago para não dizer mais. Bem hajam.

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  6. A minha pena é que, para os políticos, estas mortes não servem para nada. A sua preocupação vai toda para as eleições e para manterem o grande capital de boa saúde! Muita coisa se poderia corrigir, mas não há vontade política!
    O Quito tocou em algumas importantes feridas, mas quem deveria ouvir, não quer saber nada disso e nem está para aí virado!
    Lamento igualmente, a morte, inútil destes Jovens Bombeiros.

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  7. Reverencio-me perante os heróis/bombeiros, pela dedicação, esforço e coragem que, ano após ano vão sofrendo,alguns até à morte,o seu espírito de abnegação!

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