Have a nice day ...
Já não sei há quantos anos conheço o Chico Zé. Quer dizer,
não conheço. Frequento o seu restaurante, logo ali à entrada da cidade Lagos.
Cá fora, num enorme terreiro banhado de sol, há lugar para os carros. Mas lá
dentro, num enorme pátio com telheiro, também podemos estacionar. O local é
aprazível, com mesas e bancos corridos ao ar livre, mas com sombra acolhedora.
Dentro do restaurante, o ambiente é mais formal, com menos algazarra, apesar
dos empregados andarem numa correria, pela afluência de clientela que, de
chinelas de plástico, calções, barriga proeminente e tatuagens nos braços e nas
pernas – alguns – vêm à procura do peixe fresco que sabem ali encontrar.
Um dia, um político da nossa praça, disse não resistir a uma
bola de Berlim. Pois eu também tenho que confessar que não resisto aos carapaus
do Chico Zé. E às saladas com orégãos. E a umas batatinhas cortadas aos pedaços,
com azeite e alho que me deixam em estado de coma. Coma, de comer, entenda-se.
Há tempos estive – estivemos - lá, em mais uma peregrinação
gastronómica. Entretive-me a olhar para os turistas a banquetearem-se com as
várias qualidades de peixe e aquela geração de miúdos, cujo menu de Janeiro a
Dezembro é bifes com batatas fritas. Com um ovo a cavalo, de preferência.
Numa mesa de bancos corridos nos sentámos, junto a um casal
de turistas ingleses. Como eles não falavam português e o nosso inglês
macarrónico é da universidade da Espadaneira, ficámos pelos sorrisos e
salamaleques. Foi assim durante dez minutos até que eles, felizmente, acabaram
a refeição e, com uma vénia, despediram-se. Foi então que eu puxei dos meus
galões e disse com um ar doutoral, como quem estava muito à vontade na língua
de Sua Majestade:
- Have a nice day...
Eles pareceram surpreendidos e antes que me fizessem qualquer
pergunta que me pusesse um nó na língua, mergulhei a cabeça no prato e
atirei-me aos carapaus grelhados.
Foi então que apareceu um tal Fragoso algarvio, que se
apresentou, pediu licença e se sentou a nosso lado. O homem era falador, e
vinha acompanhado de uma rapariga simpática que, pela diferença de idade de
ambos, me pôs a magicar pensamentos pecaminosos. Falei. Falámos. Falámos muito,
porque é com os portugueses que nos entendemos. Disse-nos que estava cá de
férias – o que levantou ainda mais as minhas suspeitas – mas que vivia em África.
Não tenciono voltar, afirmou, enquanto trincava mais uma talisca de pimentos
num prato apetitoso de sardinhas assadas. Os elogios ao continente africano, às
suas potencialidades e a um futuro risonho para quem demanda aquelas terras,
preencheram o resto de um almoço agradável.
Portugal, não tem futuro – disse - nos. E eu, que já andava
desconfiado da nossa pátria parda, fiz um sorriso amarelo, servi-me do jarro de
vinho branco a estalar de fresco e, pela segunda vez na tarde, atirei-me
furiosamente aos carapaus.
Quito Pereira
O teu inglês é bom, tu és mas é muito envergonhado!
ResponderEliminarFoi preciso vir um emigrante de África, para te dizer a verdade sobre o nosso país!...
Pelo menos o almoço valeu pelos carapaus e pelos pimentos...
Verdade qual verdade!PORTUGAL tem futuro!Mas tem que ser com optimistas, não com pessimistas!
EliminarAlfredo, falo um inglês fluente, já sei, por exemplo, dizer merci pelo comentário.
EliminarAbraço
Your English is very porreiro!
ResponderEliminarE vocês já viram, malta, uma página quase inteira do nosso Quito, no Jornal do Fundão desta semana, com um texto sobre o Saramago escrito quando ele faleceu?
Meu orgulho...
Toma lá um abraço, meu escritor mai'lindo!
Não vi o artigo...tu é que tens o Jornal.Daí...
EliminarDaí... o Quito disse-me para não publicar aqui os textos do JF que já tivessem sido publicados antes por ele... o que tem lógica.
EliminarEste já saiu aqui:
http://encontrogeracoesbnm.blogspot.pt/2011/06/ensaio-sobre-uma-valsa-triste.html
Caro Paulo
EliminarO facto do "Jornal do Fundão" ter publicado o texto, o que eu desconhecia, pois não recebi o jornal, tem uma explicação, se atendermos ao facto da morte de José Saramago, já ter ocorrido há tempo significativo. O que aconteceu, é que o texto chegou às mãos de Dona Pilar del Rio e a Senhora, numa extensa e muito amável mensagem particular que me dirigiu na véspera de seguir para o Brasil, para uma homenagem a seu marido, lamentou o facto de, por desconhecimento da sua existência, o texto não ter sido escolhido para uma compilação de artigos que foi feita a nível mundial, aquando da morte do escritor. Mas manifestava interesse que o texto fosse publicado no Jornal do Fundão. Naturalmente, como todos compreenderão, não vou transmitir aqui, aquilo que Dona Pilar me disse, pois a mensagem é pessoal e por tal motivo, devo mantê-la em resguardo.
O Dr. Nuno Francisco, que tem sido de uma amabilidade a toda a prova, fez a vontade que foi expressa pela viúva de José Saramago. Nada mais justo, se atendermos ao que Dona Pilar tem feito em prol da obra do marido e da Fundação José Saramago, com sede na Casa dos Bicos, em Lisboa.
Mantenho aquilo que disse e digo aos amigos. Escrevo para vós, com amizade, neste "projecto" de encontro e reencontro de amigos. Apenas e só, embora reconheça que esta mensagem que recebi vinda de Lanzarote, me deixou naturalmente satisfeito, para além da perplexidade de abrir o meu correio eletrónico de manhã e deparar com tão simpática mensagem de quem parecia que me conhecia há muito tempo, tal a forma informal como vinha redigida. Afinal, a chancela de alguém conhecida nos meios literários e que mantém uma ligação forte à ilha onde nasceu e onde José Saramago foi muito feliz, como teve a oportunidade de me confidenciar.
Um abraço
Tu, se não fosses excessivamente modesto, não serias o Quito. Como diria a São Rosas, Eça é que é Eça.
EliminarAbre aço!
Apenas uma retificação: Dona Pilar, viúva do escritor, nasceu na região de Granada, tendo depois vivido em Lanzarote, ilha muito do seu agrado e onde mantém residência ...
EliminarTiveste sorte que não fui almoçar contiga os carapaus!
ResponderEliminarPor falar em inglês, hoje fui eu ao Corte Inglês comprar carapaus e petinga que deu um almoço de "estalo"!!!!
Continua aí pelo Chico Zé...mas cuidado não molhes os pés!
Rafa, cada vez que como carapaus, lembro-me de ti. Cá por coisas ...
EliminarAbraço
Toma lá um abraço bem apertado amóri!!!!!
ResponderEliminarAinda bem que vim ao blog,o que devo confessar nem sempre fazer, mas ao ler-te foi talvez a maneira de matar um pouco as saudades que tenho de vós!
Estava aqui a pensar como é bom estar em férias, e como valorizamos mais, tudo o que se nos proporciona, neste caso para ti, os ditos carapaus do CHICO ZÉ! Mas na realidade, todos temos um "Chico Zé" no local onde nos encontramos...para mim foi o "SEM ESPINHAS", ótimo restaurante em cima da praia, onde me banqueteava com umas fabulosas ameijoas à Bulhão Pato, ou um suculento Arroz de Lingueirão, acompanhados sempre, pela Sangria branca bem gelada, que me punha completamente "out"!!!!!.....
Felizmente, nunca tive o azar de ter a meu lado um "ricaço" vindo das Áfricas, que tivesse o "atrevimento" de, em pleno tempo de descanso e até de uma certa felicidade, me viesse relembrar que "PORTUGAL NÃO TEM FUTURO"!!!!!.....E eu não sei????.... Sei sim, mas sei também que com futuro ou sem futuro temos um país maravilhoso, acolhedor, hospitaleiro, com um povo "sereno", que fora do nosso meio habitual, nos recebe de braços abertos!!!!
Como eu gosto deste País, meus amigos!!!!....
Quando regressam a Coimbra? Eu já cá estou, mas desde ontem que estou no "estaleiro", pois torci um pé e durante uns dias, não vou poder sair!!!
Espero brevemente estar convosco, pois como disse no princípio as saudades apertam!
Beijinhos para os dois!
Pois Teresita. Dizem mal, mas sempre que podem vêm ao torrão. Essa é que é essa ...
EliminarAbraço
Bom tacho, bela escrita.
ResponderEliminarHoje de repasto foi um arroz de Polvo que me soube ao melhor que há.
Comi em Coimbra.
Tonito.
Boa, António! A canja de borrego fica para a outra vez ...
EliminarAbraço
Nada de lamentações, pois reparo que o peixe é maior do que o prato!
ResponderEliminarClaro que me lamento, Celeste! Adeus carapaus do Chico Zé ...até ao meu regresso ...
EliminarAbraço
Tudo isto me fez lembrar os tempos em que iamos com o meu Pai para S.Joao do Campo comer enguias na tasca do Valentim!!!
ResponderEliminarSerà que haverà peixe nas àguas de MIAMI?So mostram toda a gente a comer hamburgers, dai a minha duvida!!!!
Saudável loucura a tua, BobbyZé ! Fizeste bem em te inscrever nessa fantástica viagem. Goza a vida ... antes que ela te goze a ti ...
EliminarAbraço
e muitos carapaus furiosamente vais ter de continuar a comer,Quito....e não tanto por nós mas por esses jovens todos,desempregados,etc e tal já que Portugal sem futuro vai ser fatal!
ResponderEliminarDesesperançada e tristemente tenho de confessar que é assim que penso...
Ah! Não deixes também de beber furiosamente vinho branco...alivia muito!!!
Desejo-te um bom recomeço de férias, Olinda. Vais encontrar sol e uma água do mar a 25 graus. Nada melhor, para descomprimir das preocupações diárias ..
EliminarAdorei este texto sobre o carapau do Chico Zé. Quanto ao nosso país que de momento está de rastos, tudo leva a crer que começa a haver alterações para melhor, se bem que vá levar uns anitos a pagar o desleixo dos responsáveis. Não é por isso que deixa de ser um país acolhedor e que a todo instante se pode virar para o futuro pois cabeças não nos faltam.
ResponderEliminarQuanto aos carapaus, arroz de polvo, etc, nem preciso de saír de caso pois como na casa do Chico Zé em pleno Montreal.
Já que mesmo com muito simplicidade somos todos bons na "língua" dos outros e que desejas "Have a nice day", you too.
Chico Zé
Abraço Chico. Por vezes desapareces, como aliás já tinhas avisado. Mas é sempre com satisfação que te vejo regressar.
ResponderEliminarHoje vou ver o Sporting - Benfica, a casa de uns benfiquistas fanáticos que me convidaram para jantar. Como estou completamente por fora desta rivalidade, palpita-me que me vou rir ...
Ao ler esta descrição de um almoço do Quito em que os carapaus são o leitmotiv para um retrato de um restaurante popular onde se come à sombra de um telheiro que protege os comensais dos calores do sol algarvio, veio-me imediatamente á memória uma descrição de Almada Negreiros que atravessava o Tejo de propósito para ir a Cacilhas degustar umas ameijoas que só na Parreirinha do Cardoso se comiam.
ResponderEliminarSão pitéus diferentes, cada um com seu paladar e seus seguidores.
Mas a razão de me ter lembrado disso não se prende com gastronomia, mas sim com o paralelismo descritivo das crónicas de Almada e de Quito Pereira.
Uma ao estilo irreverente e provocador caracteristico do primeiro, esta obecendo ao modelo e á matriz realista e conciliadora do segundo.
Ambas cativantes da atenção do leitor que com elas se delicia...
Fiquei a conhecer o Chico Zé pela tua mão e vai ser um lugar que procurarei na minha próxima ida ao Algarve.
ResponderEliminarPalavra a palavra levaste-nos a saborear esses deliciosos carapaus e quanto à conversa foi da melhor.
Gostei. Um abraço.
Abílio