domingo, 11 de março de 2012

"ESTÓRIAS" DA VELHA ALTA DE COIMBRA!

Onde se conta de umas "velhas" contadas...
...e se fala de casas de comer que houve na alta e já não há.



Trazidos pela recordação de um passado, a um tempo tão próximo e tão longínquo, entrámos na Alta e de passagem, para além dos ocasionais bolinhos de arrufada dos Lázaros, referi já, três poisos de comer e beber da Alta que Deus haja – O Jesuíta – a Império – o Pirata.
        Logicamente  há mais, muito mais; tantos que se fora a falar de todos com atenção que muitos merecem, não chegaria todo um Encontro sobre a Alta para esgotar o tema. Aliás, é lógico que assim seja. Bratt Savarin, o homem que pôs a Gastronomia ao nível da Filosofia, pondo os homens a pensar naquela por esta e nesta através daquela, é claro, quando diz que  “os destinos  das nações dependem da forma como elas se nutrem”.
        Tendo durante séculos na mão o destino da Nação, Coimbra, e por extensão ou com fundamento a ALTA, onde se formavam, tinha sobre os ombros uma grande responsabilidade. Dela se houve a preceito, quer na quantidade que colocou à disposição dos futuros mentores da Pátria, quer na qualidade do muito que lhes deu. Por outro lado, o autor da “Filosofia do Gosto” é taxativo quando escreve que o animal devora, o homem come, mas somente o homem inteligente sabe comer”,  Coimbra,  prova claramente esta acepção, pois, as grandes casas de comer estão sempre ligadas a grandes vultos das letras, da política ou da vida em geral.  De um breve correr, sem ordem nem no tempo nem no espaço, soltarei três desses locais de comer que ligarei com a figura que me parece melhor traduzir o que acabo de dizer. Não evitará isto que outros nomes sejam também falados ou distinguidos, mas, impedindo até um alongar, que não seria desinteressante mas impossível, incidirei os meus comentários nas Camelas e João Penha; nos Caçadores e no Dr. Quim Martins, no Pirata e no Pica três poisos, três nomes, três gerações.
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Nessa altura, aí pelos anos 40 de oitocentos, já junta Camilo, em “O Bem e o Mal”, os estudiosos, num indefinido “botequim da Rua Larga” e se é à Estalagem do Paço do Conde que o autor manda D. Alexandre de Aguiar buscar o jantar que festejaria a provada inocência de Casimiro Betencourt, não será tanto porque na ALTA não houvesse quem condigna refeição servisse, mas porque aí, na que era ao tempo a mais famosa Estalagem de Coimbra, fez ele instalar-se a Condessa de Azinhoso, que “viajante” e não académica logicamente por ali se quedara, sem à ALTA subir.
        Que assim seria, prova-o, já não a ficção, mas a realidade, vendo-se o grande Antero a acorrer ao Cebola, onde pontificava à volta do”, que com outros poetas regava com as variedades bebidas que o Joaquim Cebola, do Largo da Feira, servia. Café, trouxas de ovos, arrufadas, lampreias doces”  Outros iriam preferentemente, no mesmo Largo, ao Manel Jacob ou à Rua do Borralho, ao Jacob  Velho.
        Era em frente a estes que ficavam as Camelas ou a Tia Maria Camela, que podia ser qualquer das três irmãs, já que todas tinham o nome da Virgem e eram Camelas. Bondosas, verdadeiras amigas dos estudantes a quem ajudavam e socorriam nos momentos de baixa – quando a berra subia, pagavam-lhes eles, geralmente com juros.
        As Camelas  era o que se chama uma TASCA – tasca pelo aspecto. TASCA, porque ali se comia bem.
        As contas eram honestas!
       -Ó Tia Maria quanto devo aí?
       - Filho, tu é que sabes; eu sei lá o que comeste, nem quanto gastaste! Olha  dá para aí aquilo que entenderes que deves!
Não admira pois, que a fina flor da Academia fosse às Camelas!
        Às Camelas foram por certo e sem qualquer ordem Camilo, Eça, Junqueiro, Antero, Trindade Coelho e Silva Gaio. Anto, por elas, pelo misticismo que as envolvia, veio para Coimbra e tem esta exclamação de desespero em bela métrica e rima:
Tudo rolou no solo!
A tasca das Camelas
Para mim, era um sonho
O céu cheio de esrelas
Que complementa com a filosófica, agonia e irónica afirmação: da Tia Camela…só ficou a camelice.
Uma grande figura das Camelas era João Penha
Motivado pelo ambiente e quiçá pelo vinho…cantava nas quadras de inspirado soneto:

Oh vós, que do canto sois velhos fregueses,
Ouvi destas liras o mélico emprego!
Nós somos as gemas, os bifes ingleses,
Os paios das filhas do claro Mondego.

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Em Coimbra ficaram as Tias Camelas, mais pobres, mas mais lendárias, até que as velhas e bondosas Senhoras morreram e o camartelo governamental, sádico e louco, tudo varreu.

A seguir:Os Caçadores e o Dr Quim Martins

2 comentários:

  1. Já tenho alguns anos por cá, mas isto não é do meu tempo.
    Mas tem muito valor para a historia de Coimbra ao nível do comes e bebes por cá.
    É bom conhecer o que se passou à muitos anos.
    Tonito.

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