quarta-feira, 15 de maio de 2013

UM GRANDE SUSTO

Hoje fazem-se os movimentos bancários diante de um computador, mas naquele tempo ainda não havia internet.
Entrei no Banco, nos Restauradores, para requisitar um livro de cheques.
Estranhei a quantidade de clientes que enchiam a dependência bancária. Para aí umas 30 pessoas. Tive que me conformar e entrei numa das filas formadas diante do balcão.
Não eram passados ainda uns dez minutos, uma gritaria e um enorme rebuliço transformaram o átrio num pandemónio. Um grupo de três mascarados armados de espingardas de cano curto gritavam para os empregados e para os clientes, ordens breves, assustadoras, sempre acompanhadas de ameaças de morte.
Um dos assaltantes correu para o gabinete envidraçado do gerente, encostou-lhe o cano da arma à têmpora, enquanto os outros dois nos empurravam com brutalidade para um canto.
Duas senhoras de aparência sexagenária sentiram-se mal. Uma delas desmaiou e caiu com estrépito no chão.
Um homem robusto tentou desarmar um dos assaltantes mas foi atingido pelo disparo da espingarda do outro.
Agoniado, vi uma golfada vermelha ensopar-lhe a camisa enquanto caia...
O bandido que se tinha dirigido ao gerente intimou-o aos berros a ir abrir o cofre, sempre com o cano da arma encostada à cabeça do infeliz bancário.
Quando eu pensava que tudo acabaria com a abertura do cofre e com os ladrões a fugirem com o dinheiro roubado, dei pela entrada de uma série de polícias que de rompante entraram no Banco. Houve troca de disparos, um polícia foi atingido gravemente no abdómen e um dos assaltantes caiu redondo no chão com um tiro na cabeça.
Uma massa vermelha, pastosa, ensanguentava já as lajes de mármore do chão. As minhas pernas tremiam...
Subitamente, ouço uma voz vinda do tecto falso e, de seguida, ecoar uma revoada de aplausos, com os clientes e os empregados a rirem, a baterem palmas e a felicitarem-se pelo sucesso da operação!
Até a senhora que tinha desmaiado aplaudia! Até a outra que tinha sido baleada se levantou e, sorridente, abraçava toda a gente.
Incrível! Mesmo o polícia gravemente ferido e o ladrão morto, agora milagrosamente ressuscitado, participavam alegremente naquele estranho festim!
Só eu e mais dois clientes, de boca aberta e trémulos de medo, nos mantínhamos estáticos a um canto.
Quando se lembraram de nós, pediram-nos desculpa por não terem tido tempo de nos avisar previamente. É que quando nós entrámos a filmagem já tinha sido iniciada.
Tratava-se de uma cena da película policial que a RTP estava a rodar...

Rui Felício

15 comentários:

  1. Em termos de acção, não falta aqui nada. O "assalto" é intimidatório e há até alguma perplexidade pela minúcia da narrativa de alguém que, embora muito assustado, conseguiu traduzir por palavras certeiras, um ambiente de terror. Mérito de quem escreve.
    Mas para aqueles que vão sendo assíduos leitores da prosa de Rui Felício, sabem que não raramente, o segredo do cofre está no entardecer do texto. Por isso - eu pecador me confesso - já estava à espera de um golpe de asa, que ia pôr o leitor com os neurónios de pantanas. Quando os "assaltantes" entraram mascarados, precavi-me e não morri de susto.
    Ou não conheça eu o Rui Felício. Mas ri-me com a película. Uma boa forma de começar a tarde, agora que lá fora, um Sol fugidio já vai dourando os caminhos ...
    Abraço, Rui

    PS - Não percebo por que é que o texto ficou anterior ao Passatempo. Rafa, muda o texto do Felício para cima. Obrigado.


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  2. O "suspence" feliciano corre pela sua escrita com leveza e humor agradável...
    Pena não teres entrado na série....Até serias um bom actor, na minha modesta opinião, à altura de um bom actor.

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    1. suspense é que é....
      .....e à altura de um prestigiado actor da nossa praça.
      Terei que fazer rascunho antes de escrever.Cada vez a escrever pior!!!

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  3. Quando estiver com o "olho" bom, leio melhor e...comento!
    Tenho que me poupar para o Benfica-Chelsea!

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  4. De início admiti que tivesse sido um simulacro de assalto.Afinal era o Rui Felício a escrever o guião para um filme de ação!
    Grande imaginação.

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  5. Foi um texto que me obrigou a ir lendo pois o enredo tinha o seu fundamento, só que estava sempre a pensar o que vai acontecer no fim. De facto, o que tem que acontecer, aconteceu e até foi muito bem acabado, engraçado mesmo.
    Acredito que possa ter sido verdadeiro pois por estes lados já aconteceu começarem duas filmagens sem avisar os responsáveis e quando um carro da polícia se aproximou e viu homens armados num jardim a tentarem entrar numa casa... já estão a ver o resto da estória.

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  6. Não Chico não acredito. Fiz manequim de cketchs publicitários e quando se estava em trabalho havia sempre cartazes a avisarem as pessoas que passavam para não se intrometer. Ou então ele entrou e não viram os avisos o que também não acredito que ninguém interrompa a entrada na agência bancária!!!.., gasta-se tempo e isso é dinheiro voltar a filmar, né?!!
    Fernando AZENHA

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    1. Azenha,

      Para mim, o conto do Rui Felício pode ser verdadeiro mas nem foi esse lado técnico o ponto principal da minha leitura. Segui a estória e o fim foi agradável.

      Quanto ao lado técnico, até estou convencido que num dos dois casos daqui que tive conhecimento pelos noticiários à cerca de dois ou três anos, tinha lá passado antes do problema com a polícia. Se foi nesse local, depende do ângulo de onde os polícias apareceram pois até tinham camiões e caravanas para os artistas, numa rua paralela com os respectivos geradores.

      Quanto ao preço a que dizes ficar uma filmagem, pelo que tenho ouvido e visto o que nos mostram, fiquei admirado. Talvez as técnicas sejam diferentes. Eles repetem as mesmas cenas inúmeras vezes e não se preocupam com isso. Até se riem das situações que criaram e muitas vezes até têm piada.
      Posso-te dizer que num caso do festival "Justo por rir" que eu acompanhei como mirone, fizeram o mesmo sketch umas vinte vezes, aproveitando sempre uma pessoa que ia a passar. Tratave-se de um incêndio, um pedido de socorro e havia sempre um passante que caía, como pode ter acontecido com o Rui Felício se bem que por outro motivo. Aí está porque neste caso filmaram tantas vezes. Se fôsse caro...
      É claro, que caro depende das bolsas.

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    2. Curioso este diálogo entre o Azenha e o Chico...
      Revela duas visões diferentes da arte cinematográfica.

      Julgo que a do Chico está mais próxima da realidade. Pelo menos, no caso que aqui romanceei mas que foi veridico, a verdade é que, embora existissem avisos no exterior do Banco, nem eu nem alguns clientes se aperceberam deles.
      No interior, as câmaras de filmagem estavam dissimuladas no tecto falso e notava-se, é certo, uma iluminação mais intensa do que o que seria habitual.
      Mas, no meio da violência da acção são pormenores que passam despercebidos.

      Lembro-me que a produção estava a cargo de Fernando Balsinha e a realização era de João Egreja. Fiquei amigo de ambos por causa daquele incidente...

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  7. Bolas que até eu li este teu texto quase sem respirar com medo que os assaltantes se assustassem e penssasem que eras tu e te mandassem um balásio!
    Claro que para compensar o susto nem pagaste a requesição dos cheques!
    Se não estava devia estar incluido nos custos da produção!
    Mas deves aparecer depois na novela policial!

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  8. Depois deste grande susto que o nosso amigo Rui F. apanhou,num provável assalto como hoje se fazem, bem modernos, onde entram pistolas, espingardas, granadas e afins...o final poderia ter sido bem pior!!!!
    O cenário era dramático....mortos e feridos jaziam mudos e quedos pelo chão, senhoras sensíveis caiam que nem tordos desmaiadas e os inocentes clientes de corpos e pernas trémulas, talvez alguns com incontinência urinária devido ao susto, foram sem dúvida alguma, as maiores vitimas de toda esta encenação!
    E é precisamente com estes que me preocupo....porque, ao som duma voz vinda de cima, quem sabe dos céus...deu-se o milagre!!!! Tudo que estava inanimado, morto, ferido e pelo chão, ressuscitou, vieram do além, bem dispostos a rirem-se, quem sabe dos "patós", que incrédulos e ainda não refeitos do susto, nem queriam acreditar no que estavam a ver!!! E se, a estes espectadores inocentes, com tamanho susto, lhes tivesse dado uma coisinha má, um treco, ou um ataque cardíaco !!! Como é que era???? E se, qualquer coisa de mau tivesse acontecido a este nosso Amigo?! Quem é que, depois, ajudaria a manter este blog com as suas estórias, umas engraçadas, outras mais dramáticas, mas que tanto nos prendem aqui!!! Sim...digam lá quem era!?
    Mas eu vos garanto, que se isso tivesse acontecido (longe vá o agouro), eu como vossa amiga do coração, que sou, iria direita ao Banco pedir uma indemnização, sim, sim, uma indemnização por perdas e danos!!!!
    TERESA LOUSADA

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  9. Ainda bem que foi filme, mas mesmo que fosse a sério, estou convencido que os assaltantes não levariam tanto dinheiro aos clientes do banco, como aquele que o governo nos anda a roubar!...

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    1. Tens carradas de razão Alfredo.
      E se levassem era em escudos, mas, mesmo convertendo em euros, nunca o roubo atingiria as cifras que nos tiram agora dos bolsos...

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  10. Amanhã tenho de ir a uma agência bancária. Não para tratar de assuntos meus, que esses resolvo no multibanco.
    Ainda bem que, com esta história, fico avisado e prevenido. Se me aparecerem uns tipos mascarados, armados e ameaçadores, vou-me fartar de rir e mando-os brincar com a tia deles. Até lhes direi que não se sirvam de mim para fazer filmes!
    Claro que se levar um balázio daqueles mesmo a sério, sem ser de pólvora seca, todos vocês ficarão a saber quem é o grande culpado desta minha morte prematura.
    Espero bem que sejam testemunhas da minha família ( mulher, filhos e netos ) que perante a Justiça saberão reclamar a devida indemnização.
    Rui Felício, vai preparando a tua defesa!

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