sábado, 3 de setembro de 2011

A FESTA DAS BICICLETAS ...

Sinfonia em duas rodas ...

(foto São Vaz)
Relembro aquela tarde quente de Agosto. Em Salgueiro do Campo, pequena aldeia beirã, aquele não era um dia como os outros dias. A Volta a Portugal em Bicicleta, visitava a povoação. Desporto de cariz popular, a corrida percorre os caminhos de Portugal, levando a festa das duas rodas à casa dos portugueses. Por isso, aquele era um dia diferente. No café “Portas da Serra”, a tarde era de negócio. Cá fora, na esplanada, mesmo junto à curva da estrada, as mesas estavam cheias de clientes. E de cerveja. Também um aparelho de televisão, estrategicamente colocado, dando a Volta em directo. Era forma da população saber dos cambiantes da corrida. Aos poucos, vão chegando carrinhas de caixa aberta. Percebe-se a intenção. O tabuleiro das camionetas, servia agora de tribuna privilegiada para que todos pudessem ver de perto os seus heróis. A passagem da corrida no pontão do Chão da Vã , veio agitar as águas. Faltavam poucos quilómetros para a caravana aparecer. Paulatinamente, as motas da Guarda Republicana vão passando. Devagar, como se impõe. Nas vistas, dá a corpulência dos agentes. Óculos escuros, botas de cano alto, e um semblante carregado, roçando uma certa vaidade. Naquele circo, também eles reivindicam o seu quinhão de reis da festa. Do ar, vem um barulho ensurdecedor. É o helicóptero dum canal de Televisão, que vai seguindo a corrida. Parado rente aos telhados, vai filmando a competição. E o público, entusiasmado com aquele momento de magia, vai erguendo os braços, numa saudação aos pilotos. Uma espécie de comunhão festiva entre a Terra e o Céu. Na estrada, em procissão, os carros da comunicação social. Alguns jornalistas, vencidos pelo cansaço dos mais de duzentos quilómetros e do calor a rondar os quarenta graus, dormem de cabeça ao pendurão, ao lado do condutor. Depois, alguns carros de apoio aos ciclistas. No tejadilho, vários pares de bicicletas, cujas rodas vão rodando com a deslocação do vento, numa espécie de roleta raiada da sorte. Deste e daquele carro, vão sendo atirados bonés publicitários. Poucos, que a vida não está para graças e as empresas sentem a crise. É, definitivamente, uma Volta pobre. Mas a caravana resiste. De repente, muitas palmas. Vêm lá os ciclistas !!!. Mentira. É o Ilídio que vem da horta, montado na sua pasteleira, com o sacho pendurado nas costas. É então que se ouve o barulho estridente das motas da Guarda Republicana. Sim, agora é que são eles !!!. Mentira. Era só um. Trazia na camisa, o xadrez do Boavista, e tenta a sua tarde de glória. Sol de pouca dura. Momentos depois, vem mais um grupo em perseguição. São palmas e mais palmas. Dobrados sobre o guiador, sobem à velocidade do vento. Como é possível, depois de percorrerem duzentos quilómetros a subir e descer serras – pergunto-me. A seguir, a tela colorida do pelotão. A sinfonia das rodas - pedaleiras oleadas, cantada em uníssono por mais de cem bicicletas. Uma melodia agradável ao ouvido, misturada com o palrar das cigarras. E lá seguiram morro acima, como réptil colorido, adivinhando as curvas da estrada. Na cauda, muitos carros de apoio e o carro - vassoura, com um divertido boneco amarelo, a indicar que ninguém ficou para trás. Todos são campeões. Minutos depois, terminou a algazarra. No café”Portas da Serra”, já só restam as canecas de cerveja vazias em cima das mesas. Também as carrinhas e os homens partiram, na labuta esforçada da sobrevivência. Resta o silêncio. Mas, por escassos minutos, a aldeia teve festa, alegria, cor e vida, nesta Beira profunda. Foi como atirar uma pedra, a um lago de monotonia.
Q.P.

8 comentários:

  1. É do meu conhecimento, que alguns emigrantes da região do Salgueiro do Campo e aldeias limítrofes, acompanham o blogue, sempre na esperança de ver algo escrito, sobre a terra que é a sua. Uma forma de aliviar a saudade. A eles dedico este texto. Depois das férias em Portugal, a todos desejo que tivessem um bom regresso. E oportunidades de trabalho, em tempos díficeis ...
    Um abraço a todos
    Quito Pereira

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  2. O «Jornal do Fundão» não respondeu ao meu e-mail... nem à insistência que fiz, depois de regressar de férias.
    Não sabem o que perdem, digo eu.
    Abraço, Quito!

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  3. ...também concordo...não sabem o que perdem!
    É sempre uma festa a Volta a Portugal em bicicleta...presentemente será "meia Volta a Portugal.
    E é um grande meio publicitário.
    As cidades e vilas e não só estão em lista de espera para serem privilegiadas ou com a partida ou com a chegada.
    Quem mais paga lá terá a partida ou a chegada!
    Este ano se não estou enganado foi só de Lisboa para o Norte...
    Seja como for é sempre uma festa colorida e pelo que o Quito conta em Salgueiro do Campo foi um dia diferente!
    Já fui um grande entusiasta do ciclismo...no tempo do Alves Barbosa e mais tarde do Joaquim Agostinho.
    Dos tempos mais recuados eram o Trindade e o Nicolau os heróis!
    E eram mais lutas de Clubes. Hoje a luta é entre "marcas" A Publicidade é que manda!

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  4. Caro Paulo
    Não há drama nenhum, como te disse. O JF rege-se por padrões de qualidade que nada têm a ver com a minha forma de comunicar com os amigos.
    O "Encontro de Gerações", saiu da esfera de um bairro e de uma cidade. É visto e lido em Salgueiro do Campo e chegou aos familiares que estão fora de portas. A prova-lo, um texto que foi trazido por um emigrante em França, pessoa que nem sequer conheço. Deixou o texto num restaurante da aldeia, tendo tirado cópia que trouxe na bagagem e fez questão de exibir.
    Por isso, sinto que essa aproximação é importante.
    E o JF, o grande embaixador da Beira Baixa noutras zonas de Portugal e além fronteiras ...
    Abraço

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Espírito de observação e capacidade de transmissão do observado obrigam o leitor a não despegar os olhos do sequencial alinhamento da crónica até ao fim do texto.
    O ar importante dos GNR, a cabeça ao pendurão dos jornalistas cansados, os acenos aos tripulantes do helicóptero, o aplauso ao hortelão que se antecipou à caravana, as bancadas improvisadas nos estrados das camionetas e, finalmente, a passagem colorida dos ciclistas, como apoteose da festa, tudo nos corre diante dos olhos como se lá tivessemos estado naquele dia diferente da pacatez aldeã.
    Parabéns Quito!

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  7. Quito, o JF não disse que não. Apenas ainda não respondeu. E eu - não sei se já notaste - sou um chatinho do caraças, enquanto não tenho uma resposta. Aprendi com os cães da Serra (da Estrela, única portuguesa com "S" maiúsculo).
    Abre aço!

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  8. O jornal do fundão já não é o que era.
    Como defendem a região.
    Estão de férias?
    Desde quando é que um jornal entra de férias.
    São coisas modernas.
    Não tenho paciência para assuntos destes.
    É PECADO tentar colaborar com alguém para dar mais informação.
    Eu nunca fui pecador nem sei nada de pecados.
    Tonito.

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