segunda-feira, 25 de abril de 2011

E DEPOIS DO ADEUS



As armas obsoletas não resistiriam a um confronto intenso, a falta de preparação militar e política da maioria dos soldados sucumbiria ao menor embate, não obstante o planeamento perfeito idealizado e realizado por jovens oficiais formados pela Academia Militar do próprio regime contra o qual se rebelaram.
Mas uma enorme diferença separava aquele punhado de rebeldes e as chefias afectas ao governo e por este protegidas e beneficiadas. Os primeiros eram jovens idealistas, voluntários, emanação do Povo cansado de meio século de opressão e de tirania e os segundos pugnavam pela defesa de um estatuto de mordomias do qual não queriam abdicar.
Os primeiros ofereciam a sua juventude em troca de mais nada que a liberdade, os segundos reagiriam apenas para preservação dos seus privilégios, reacção que abandonariam ao menor sinal de fraqueza do regime que diziam defender.
O confronto não se decidiria pelas armas, como se veio a ver.
Foi a adesão popular, espontânea, não planeada, que em poucas horas fez tornar desnecessárias as armas transformando-as, num ápice, em símbolos de paz, de cujos canos saiam flores em vez de balas.
E esse povo anónimo, fardado ou não, voltou a suas casas, não reivindicou prebendas ou vinganças, feliz por se ter libertado da tirania, orgulhoso por ter conseguido finalmente colocar Portugal no lugar que a História lhe concede.
Os outros, os serventuários dos opressores, incapazes de renunciarem às suas mordomias, respeitaram amedrontados  e cautelosos um período de nojo, deixaram crescer as barbas, desabotoaram as camisas, retiraram as gravatas, gritaram slogans revolucionários, mas a pouco e pouco voltaram a tentar reconquistar os privilégios perdidos. Apontando o dedo pseudo democrático aos erros que o povo foi cometendo depois da vitória, e clamando desavergonhadamente, pelas liberdades que eles próprios lhe sonegaram durante décadas!
Cumpriu-se o “E Depois do Adeus”. Ficou por cumprir o “Grândola Vila Morena”…

Rui Felício

15 comentários:

  1. Texto escrito para o blog da turma do 6º ano da professora de História e Geografia de Portugal, Sónia Cruz, do Externato Maria Auxiliadora de Viana do Castelo.


    O que vieram fazer para a rua naquele dia as pessoas de Lisboa, antes ainda do sol nascer e quando os blindados cruzavam as ruas? Porque não faziam o que os soldados lhes diziam, apelando para que ficassem em casa?

    Semanas antes, outros soldados saíram à rua em Lisboa, mas não traziam armas nas mãos nem vinham devidamente aprumados. Traziam muletas, cadeiras de rodas, braços ao peito e levantavam um cartaz de protesto sobre as suas cabeças.

    Sobre as suas cabeças os soldados exibiam o espaço vazio das palavras por escrever, o silêncio dos gritos por soltar; exibiam o derradeiro protesto dos amordaçados: um cartaz em branco.

    cont...

    ResponderEliminar
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderEliminar
  3. Os automóveis na Avenida da Liberdade pararam para os deixarem atravessar e as pessoas pararam para ler o silêncio insultuoso do cartaz, mas em breve outros soldados que ainda tinham pernas e braços e armas vieram fazê-los parar e levaram-nos com eles. Sobre o chão ficou o cartaz em branco rasgado; a palavra duas vezes amordaçada; a palavra banida antes de ser dita; o próprio silêncio da palavra por dizer, que de tão óbvia fora previamente censurada, como um filho que é negado antes de ser concebido porque os pais se odeiam.

    Agora as pessoas de Lisboa saíram à rua. E porque enchem as pessoas as ruas de Lisboa só porque os soldados apearam do poder os governantes do país? Porque não ficaram em casa, à espera que tudo se acalmasse? Que vêm dizer as pessoas umas às outras em Lisboa? Que gritam elas na rua?

    Hoje nenhuma palavra foi negada. Hoje nenhum cartaz foi rasgado por ostentar a ausência da palavra proibida como se o silêncio fosse o molde da própria palavra e a repetisse incessantemente a toda a gente.

    As pessoas gritam em Lisboa a plenos pulmões todas as palavras e todas as palavras são possíveis e de entre todas as palavras que dizem, o povo de Lisboa diz a palavra mais proibida de todas, aquela que foi proibida mesmo quando não foi escrita e o seu lugar em branco num cartaz fez sentir ainda mais a sua falta.

    Foi isso que as pessoas foram fazer para a rua naquele dia do mês de Abril, quando as flores costumam abrir ao nascer do sol em busca da luz - enquanto os soldados apeavam do poder aqueles que proibiam até o silêncio das palavras, o povo de Lisboa saiu à rua em busca da Liberdade.

    Manuel Bastos

    ResponderEliminar
  4. Não tenho dúvida que se irá cumprir.

    ResponderEliminar
  5. Um texto oportuno do Rui Felício. Não creio que fosse esta a democracia que o povo português esperava. Vivemos uma democracia bizarra.
    Do genuíno 25 de Abril, resta uma caveira.
    Para ti, Rui, o meu desejo de um bom dia de Páscoa ...

    ResponderEliminar
  6. Concordo com as palavras do Rui felício mas, tenho esperança. mesmo muita esperança que novos tempos irão surgir após a tempestade!
    25 de abril, SEMPRE.

    ResponderEliminar
  7. No ano de 74 eu vivia no estrangeiro.
    Segui tudo via rádio.
    Quem estáva bem na altura,hoje ainda está melhor.
    Foi uma revolução feita a nivel do poder de opinião,o que se ganhou foi pouco.
    Os grande culpados são a classe política que não
    presta.
    E termino já, pois é melhor assim.
    Tonito.

    ResponderEliminar
  8. Calma rapazes! Nao sejamos assim tao pessimistas!Démos uma grande liçao ao Mundo e se nos deixarem a liberdade de nos exprimir e movimentar, ainda daremos uma outra! Os PORTUGUESES sao um povo completamente à parte! Quantas liçoes historicas infligimos à vizinha ESPANHA, apesar da nossa inferioridade numérica?

    Rui!Tà realmente ai tudo bem descrito tal como no texto de Manuel Bastos.

    Mas as democracias nao se fazem assim dum dia para o outro!Além disso nao existem democracias-tipo!As democracias, como qualquer outro sistema, tem as suas vantagens e inconvenientes!
    Mas chegar-se a 2011 e ouvir na boca daqueles que a viveram, que nao valia a pena!Isso nao! nao estou de acordo!

    Sinto-me orgulhoso de ter nascido num Pais que fez uma revoluçao sem violência!

    So nao posso perdoar ao Senhor Paulo Portas (ex-Ministro da Defesa)as misérias de indemnisaçoes atribuidas aos que sofreram no Ultramar!Isso é um escândalo que dificilmente vou digerir!!!

    A França concedeu indemnizaçoes aos povos da Africa do Norte que combateram ao lado dela!

    Fui à guerra! Perdi 4 anos da minha juventude!Mas tive a sorte de voltar!

    E o meu pensamento amanha irà mais justamente para todos esses HOMENS que perderam a vida nessas guerras coloniais INUTEIS!!!!

    ResponderEliminar
  9. Artigo muito oportuno pois amanhã é um dia especial para todos os portugueses e muitos milhões de estrangeiros nas antigas colónias.
    Gostei imenso do comentário do Bobbyzé aonde achei piada à exposição do seu primeiro parágrafo para depois apresentar factos muito reais da nossa vivência. Boa. Para mim vai ser ao mesmo tempo um dia de análise destes anos mas também de alegria. Sendo um dia nacional fora do vulgar, penso que seria o dia para se começar a pôr as clivagens internas de parte que tão maus resultados tem dado.

    Já agora relembro o sempre actualizado Fernando Pessoa:

    O INFANTE

    Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
    Deus quis que a terra fosse toda uma,
    Que o mar unisse, já não separasse.
    Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,
    E a orla branca foi de ilha em continente,
    Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
    E viu-se a terra inteira, de repente,
    Surgir, redonda, do azul profundo.
    Quem te sagrou criou-te português..
    Do mar e nós em ti nos deu sinal.
    Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
    Senhor, falta cumprir-se Portugal!

    Fernando Pessoa

    Um pensamento para aqueles que partiram.

    Parafraseando o nosso saudoso Artur Agostinho, quer seja hoje ou amanhã que leiam este comentário, um abração para todos.

    ResponderEliminar
  10. Explicação do 25 de Abril



    Se não nos derem causas justas, inventá-las-emos.

    É esta a lição da nossa geração, que fez a guerra e que fez a paz.
    Onde estão os cravos de Abril? Onde estão as armas em flor?
    E a nossa inocência, onde está?

    Não fomos nós que servimos os ditadores e não fomos nós que os depusemos?
    Já não somos inocentes, mas não podemos castrar a inocência dos nossos filhos.

    Dedico estas minhas palavras ingénuas, provocatórias, crédulas...
    a todos os que são capazes de combater.

    Porque acreditar é preciso.
    --------------------------------------------------------------------------

    Tão Tarde pela Madrugada


    Quando os homens são maiores que o chão que pisam não há limites para a ambição.
    Chegara pois o tempo do Infante que via sempre um pouco mais para além do horizonte; um homem que não cabia no chão que lhe deram.
    Foi por isso que Portugal ficou maior que Portugal.
    Portugal do tamanho da visão de um homem.
    Portugal hiperbólico, ubíquo, global.

    O Infante ia à frente da História e levava consigo a nação inteira, e a História teve que seguir atrás de Portugal.
    Ainda a Europa toda pensava que o mar acabava onde começava o medo e o Infante inventou o mar para além do medo e deu-lhe Portugal como dono.

    E Portugal cresceu até onde existia mundo; porém nenhuma pátria é suficientemente grande se não deixar crescer os homens dentro de si,
    E também nenhum despotismo é suficientemente eficaz para evitar que um dia os negreiros se transformem em escravos.
    E assim chegara o tempo do segundo Infante, o descobridor de Portugal para aquém do medo, o navegador às arrecuas, o anti-Infante.
    Já a Europa toda sabia que a Liberdade era a maior dimensão humana e Portugal ainda cultivava a pequenez do medo.
    Portugal implodido, paroquial, microcéfalo, autofágico.

    Que imperialista pode ser tão tacanho que a sua ambição ocupe apenas o espaço dentro das próprias botas?
    Em Portugal, homens livres, só os que estavam na prisão.
    Os jovens combatiam em distantes paragens enquanto os seus pais se sentiam cativos em casa.
    Os camponeses abandonavam a terra solteira, partindo como fazem as andorinhas quando já não acreditam na Primavera.
    E quando os filhos da pátria regressavam finalmente a casa; a juventude amortalhada de silêncio, o último grito congelado no rosto; traziam no sítio destinado à alma, o relento pútrido da guerra longínqua.
    Um manto de viuvez cobria as aldeias e os campos e uma dor calada asfixiava a esperança no peito.
    Portugal estendido pelo mundo inteiro e os portugueses dentro de casa com falta de ar.


    Mas nenhum tirano pode mobilizar a coragem do seu povo para defender um império distante e impor que viva cobardemente na sua pátria.

    Por isso não faltaram vozes ocultas a traficarem a esperança nas esquinas cúmplices da noite.
    Há sempre quem mantenha o lume aceso, mesmo quando ele esmorece na alma dos homens.
    Há sempre quem sopre, sopre de mansinho, como quem passa a palavra, para que no âmago do carvão mais escuro se mantenha uma, ainda que ténue, brasa de esperança.


    Que longa que foi a noite. Como tardava a amanhecer. Como é sempre mais difícil dobrar o insignificante Cabo Bojador, dentro de nós.
    Porém finalmente os portugueses descobriram Portugal, acordando nele.

    Nunca as armas foram empunhadas tão rente à poesia.
    Nunca antes os soldados combateram dançando com o povo.
    Nunca o ar da madrugara tão leve.

    E o Adamastor façanhudo que nos asfixiava transformou-se num rato, temendo a vingança daqueles que anoiteceram oprimidos e amanheceram livres.
    Os tiranos tremeram.
    Os esbirros assanharam-se inutilmente de pavor.
    E os muito, muito estúpidos ainda continuam a perguntar-se porque vieram de repente todos os portugueses para a rua.
    Os portugueses apenas navegaram mais uma vez para além do medo.
    Os portugueses vieram para a rua só para respirar.

    Manuel Bastos

    ResponderEliminar
  11. Obrigado Rui Felício pelo texto!
    Muito bem escrito, e que de uma forma consisa nos relembra o que de essencial motivou e levou à prática a revolução dos cravos!
    Tenhamos a esperança que os dias que hoje estamos a passar sejam apenas um acidente de percurso(embora muito grave) e que são da responsabilidade de todos nós, mas muito principalmente pelos que tendo a responsabilidade de em nosso nome, saberem honrar os compromissos assumidos de então para cá, não o souberam fazer, desgovernando em vez de governar!
    Corrupção, compadrio, atração pelo poder a qualquer custo levaram-nos á situação que estamos a viver!
    Estamos nas mãos dos agiotas e passar a ser governados pelo FMI!
    A Indepedência Económica, essa já foi!
    Todos os comentários aqui expressos uns mais otimista, outros nem tanto, deixam perceber o quanto estiveram ao lado da revolução de 25 de Abril...mas neste momento preocupados com o futuro!

    ResponderEliminar
  12. Ao mesmo tempo que escrevo este comentário, vejo na televisão outras revoluções contra ditaduras que se estão a passar no Magrebe.
    Vejo violência, vejo mortos, vejo massacres entre aqueles que são ao mesmo tempo executores e vítimas.
    E comparo!
    E orgulho-me do meu País!
    Portugal, com todos os defeitos, tem uma cultura caldeada ao longo de séculos, de tolerância, de respeito pela vida humana.
    Podem criticar os nossos brandos costumes, mas prefiro assim.
    Somos um País civilizado que soube depor os seus carrascos pela força da razão, sem ter que derramar o sangue dos semelhantes.
    Orgulhemo-nos da nossa revolução!

    ResponderEliminar
  13. E agora nao podemos esperar que o Maia volte ao Terreiro do Paço! Agora teremos que ser nós mesmos a , no dia a dia , tudo fazer e acreditar em que o povo unido jamais será vencido!

    ResponderEliminar
  14. Como diz o Rui Pato- o povo unido jamais será vencido!

    ResponderEliminar