" ... o meu Portugal português ..."
Gosto de gostar. Da família e dos amigos. E dos amigos, recordar aqueles que lembram a nossa cidade de Coimbra, que todos amamos, porque ela é eterna. Tive oportunidade, em terras algarvias, de confraternizar com um grupo por quem tenho – como tenho por muitos outros – uma particular amizade. De Lagos, passando por Portimão, Faro, até à Luz de Tavira, passeámos a nossa gastronómica amizade. Rimos e descontraímos, procurando pôr de lado as nossas preocupações diárias. E era nisto que eu vinha a meditar, enquanto trepava Alentejo acima, numa enorme fila de carros que em velocidade acelerada, me começou a pôr nervoso. Uma travagem e uma monumental carambola, podiam fazer terminar da pior forma o descanso pascal. Resolvi desistir da auto-estrada fria e impessoal. Em Aljustrel, virei á direita e embrenhei-me no Alentejo profundo. Em boa hora o fiz. Os verdejantes campos, salpicados do vermelho de um mar de papoilas bem garridas, compunham a bucólica paisagem de uma tela impressionista. Passei pela simpática aldeia do Torrão. Na rua estreita, muitos jovens. E, nas janelas das casa de branco caiadas, aqui e ali, uma ou outra idosa a apurar o ouvido, à procura de uma última novidade da terra. Uma enorme faixa indicava “Meta”, e num palanque, perante a algazarra da aparelhagem sonora, umas reluzentes taças. Havia gente e havia vida naquele Alentejo ancorado no Tempo. Sem parar, percorremos léguas de rectas sem fim. De repente, aquele lago adormecido de solidão, agitou-se. Lá bem ao fundo, vislumbrei a luz intermitente das motas da polícia que me mandavam encostar. Foi então, que do dorso de um cabeço, deslizando suavemente para a planície, apareceram um mar de camisolas coloridas. Era uma corrida de bicicletas, com pompa e circunstância. Não resisti e saí do carro a aplaudir os campeões da estrada e quando dei por mim, mostrava também o meu incitamento: ”... força nessas canetas, pá ...”. Depois, encalhei em Santa Susana. Foi ali, numa noite já tardia, que o Senhor Coelho deu guarida a quatro ex-combatentes e respectivas mulheres. A coisa, afigurava-se dramática. Não tínhamos onde dormir. E aquele amigo, abriu-nos a porta da sua estalagem. Fizemos amizade. Era obrigatório parar, para o cumprimentar. A surpresa, veio depois. Do lado de lá do balcão, aquele compadre alentejano, disparou-nos á meia-volta: “… já hoje aqui falei dos Senhores … estiveram cá em 2009, a horas tardias sem terem onde dormir, vindos de um almoço de ex-combatentes …”. Era crescente a nossa perplexidade, até que o mistério foi desvendado. O Senhor Coelho, de uma gaveta do balcão, tirou uma “mica”. Lá dentro, tinha um texto que se chamava “A residencial Santa Susana”. Deu-me a prosa para ler. De imediato a reconheci. Era assinada por “Quito”. No texto, publicado no blogue “Cavalo Selvagem”, eu contava todas as peripécias daquele dia, razão pela qual ele se lembrava de nós. “…Ainda hoje o dei a ler a um casal de Lisboa” – afirmou. E de novo o guardou na gaveta. Disse-lhe então, que tinha feito aquele texto como agradecimento à forma como nos tinha recebido. Entretanto, o telefone tocou. Era um grupo de vinte e cinco pessoas, que no dia seguinte se vinham instalar na estalagem. Gente da telenovela “Laços de Sangue”, a estrear em breve num canal televisivo, e que rodam algumas cenas junto da singela capela da aldeia. Despedimo-nos com um caloroso aperto de mão. Ofereceu-nos, um frasco de mel. E, naquelas rectas sem fim, esqueci o intrincado enredo da telenovela “Laços de Sangue”. Mas meditei no envolvente significado dos “laços de amizade”, que fui encontrar naquele Alentejo profundo, neste Portugal que amamos. Este nosso Portugal bem português …
Q.P.
Q.P.
Mais uma "doce" amêndoa pascal que nos trazes, Quito!
ResponderEliminarNeste vosso regresso de férias deixas-nos um rico folar de Amizade e Camaradagem, pá!
Não mostres esse frasco de mel ao FMI, rapaz! Pelo amor da Santa (Susana)!
ResponderEliminarLembro-me bem do texto "A residencial Santa Suzana" que o Quito produziu no seu estilo pessoal e inconfundivel.
ResponderEliminarAntes de ele ir para o Algarve estes dias tinha-o aconselhado a não ir pela auto estrada, porque de Castelo Branco até lá, é muito mais curta a distância, e com a vantagem de se ir desfrutando paisagens, aldeias e gentes.
O Torrão é um entroncamento de estradas por onde passei algumas vezes, sem nunca lá ter deixado de parar, para beber um café ou uma cerveja, para ver as jogatinas de sueca no café central à hora da canícula.
Por outras razões, o Quito, no regresso optou por abandonar a auto estrada.
Mas não foi só por causa do trânsito, como ele pretende fazer crer.
Ele sabia que as miúdas dos Laços de Sangue iam pernoitar na Santa Susana e, juntou o útil ao agradável...
Um abraço aos amigos. O mel vai saber que nem gingas. Peço desculpa por, momentâneamente, ter retirado o texto. Havia por ali uns "que" a mais que não faziam parte da ementa. Rui, cheguei adiantado em relação ao pelotão. As miúdas só chegam amanhã ...
ResponderEliminarPois, pois...
ResponderEliminarA gente sabe que há sempre umas que vêem de véspera, para preparar as coisas.
Rui, as coisas já estão preparadas. É só pedalar nas bicicletas ...
ResponderEliminarQuito
ResponderEliminarComeçando por cima, que bela fotografia. A brancura das casas com o azul a sobressair, a rua muito limpa, sem dúvida: é Alentejo. Quanto ao texto: lá fui conhecendo terras e a vivência das suas gentes aonde não faltou uma corrida de bicicletas com as motas da polícia. Depois lá voltámos a visitar o Senhor Coelho que "é um homem de trato afável e educado" para terminar-mos a meditar no Portugal bem português, que esse ninguém nos tira. Enfim, que leitura ao correr das letras aonde até o que seria difícil de expôr, está mesmo à vista.
Uma abraço
Quito,só tu nos podias contar uma estória tão portuguesa...Onde quer que vais encontras sempre um "bocado" de ti e este, religiosamente,guardado pelo alentejano sr.Coelho.
ResponderEliminarA equipa de Laços de Sangue ainda vai aproveitar
o teu texto anterior e,fará uma boa cena com ele...
Boa, Quito! Mais uma bonita estoria daquelas que só podem ser escritas por quem, como tu, tens afecto espalhado por onde passas...
ResponderEliminarAo ler este teu texto Quito também recordei as minhas idas a Coimbra pela Páscoa,saía da cidade de Faro na tarde de 5ª feira santa, como nessa altura ainda não estava completa a A2, e para fugir ao imenso trânsito das nacionais, eu escapava pelo meio do Alentejo e lá ia eu passar pelo Torrão, Montemor- o -Novo, seguia por Coruche,depois passava por Alpiarça, atravessava o Tejo e depois segui até Tomar, passava na terra do nosso Amigo Castelão e finalmente Coimbra.
ResponderEliminarObrigada Amigo pelo teu texto, que me fez lembrar tempos passados.
Boa prosa QUITO.
ResponderEliminarTonito.
Quito!Depois de ter visto a ultima parte do documentàrio sobre o ZECA AFONSO e ter ficado bastante chateado ao saber das suas dificuldades financeiras para combater a sua doença, vir aqui ler esta tao bonita prosa, fez-me imenso bem!
ResponderEliminarCom milhares de quilometros percorridos no "nosso" Portugal e apesar de viver bem longe hà jà 38 anos,reconheço que tivémos a sorte de nascer nesse belo jardim à beira-mar plantado!
"On choisit pas ses Parents", como canta MAXIME LEFORESTIER,mas o que é certo é que entre as vàrias vertentes do nosso Povo, houve sempre uma osmose criativa, onde lançar amizades sempre se revelou uma caracteristica bem propria dos Portugueses.
Agora, antes de me deitar, falta-me um doce conventual!!!
Este teu texto fêz-me recordar os bons velhos tempos em que a ida e a vinda do Algarve faziam parte das férias.
ResponderEliminarDemorávamos muitas horas para lá chegar e depois no regresso!
Mas eram viagens turisticas, sem pressas!
Para lá até faziamos em dois dias, pois pernoitávamos em Alcácer do Sal!
E mais, levavamos fogareiro e faziamos as refeições!
Parece anedota...mas não é!
Era à português de "gema"
Estão a rir-se e a chamarem-me parolo?
Não tem importância..mas a vida dessa Geração sofrida era assim!
E algumas era para irmos para as colónias de férias da FNAT em Albufeira...sempre era mais económico!
Pobretes mas...alegretes!
Mas recordações felizes à parte devo dizer e não é novidade que gostei muito de ler mais este excelente texto!
Um abraço vá e agora ao trabalho aí por Salgueiro do Campo não vão os senhores do FMI saber que andaram desenfiados estes dias todos e eles desgraçados a acertarem as contas...para nos fazerem a cama!
Rafael,
ResponderEliminarParolo por levar o fogareiro? – Na praia das Chocas nós abríamos um buraco na areia, punhamos carvão no fundo, um peça metálica por cima, bacalhau com batatas a seguir, outra peça metálica em cima e mais carvão. Fazíamos assim um forno. Era uma delícia.
Aqui as pessoas nos fins de semana quentes vão até aos parques públicos com barbecues e fazem churrascos, sardinhadas, salsichas, etc. Cá são muito conservadores.
Últimas de cá : acabamos de ter conhecimento nas últimas notícias que foi preso hoje um ex-presidente de cãmara de Boisbriand por abuso de confiança, fraude e complô, o que é muito grave. A antiga presidente da mesma cãmara também já teve a mesma medicina há dias. Assim o FMI não é cá preciso para nada.
Que bom, tantas"Páscoas" diferentes e enriquecedoras!
ResponderEliminarDo Alentejo, um folar composto com vários ovos. Um ovo de carinho, outro de sensibilidade, outro de amizade, outro de afetos...
Um texto tão brilhante quanto a fotografia que o ilustra!
Obrigada, Quito.
Quito, belo e ternurento texto em que abres o teu coração, pleno de afectos, para com os amigos e para o universo que vais descobrindo nesta peregrinação da vida.
ResponderEliminarUltimamente tenho optado pelo auto-estrada, mas que saudades enormes tenho desse Alentejo imenso onde ainda me ligam recordações e laços familiares. Não sei ao certo qual das minhas costelas é a alentejana mas sei que tenho uma que me prende aquelas terras.
A fotografia que escolheste é de enorme beleza, qualquer uma daquelas casas poderia ser a da minha bisavó Mariana, que conheci já com alguma idade pois morreu por volta dos cem anos.
Depois de Coimbra, se tivesse que viver noutro sitio, só poderis ser no Alentejo onde o tempo dá lugar à vida...
Obrigado.