sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O CLAMOR DO TEMPO ...

...tic-tac-tic-tac-tic-tac ...
Vagueio, dia após dia, por este Lugar de um Verbo pretérito. É aqui, debruçado sobre o casario pardo da aldeia, que me apercebo das grilhetas que me acorrentam ao Passado. E ao Presente. O Futuro, não existe. Simplesmente, partiu. E, com Ele, todas as quimeras. À minha volta, só o sussurro brando do Clamor do Tempo. E o Silêncio. Lá em baixo, no ventre do povoado, já não se vislumbra nada. Apenas ruas estreitas. Apenas ruas desertas. Apenas o assobiar lúgubre do vento agreste. Fecho os olhos e percorro este vale de solidão. Tenho vontade de partir. De saltar aquela cintura de montanhas que ao longe se perfilam, como sentinelas dos séculos, nesta roda intemporal. Baixo os braços, cansado da luta inglória. Fui vencido pela Vida e pelo Caminhar do Tempo. Resta-me glorificar a Natureza. E a Paz. De novo, olho agora o porte majestoso das cordilheiras e, do versejar de Torga, faço uma prece: “… a vida é feita de nadas, de grandes serras paradas, à espera de movimento …”. São horas de partir. De regressar ao lar. De caminhar pela Vida, neste hiato que a Eternidade me consente. E logo, quando chegar a casa, vou olhar o meu velho Relógio, que me vai descontando, sem dó nem piedade, os meus preciosos minutos de Vida. Um dia, partirei. E ele – o Relógio – ficará. Enferrujado, e atirado para o esquecimento e penumbra de um vetusto sótão qualquer. Mas, enquanto puder, Ele - e apenas Ele - medirá as horas, os minutos e segundos, deste carrossel de emoções com que a Natureza me brinda, neste ciclo que secularmente se renova das Quatro Estações do Ano. Tic-tac-tic-tac- tic-tac …
Q.P.

25 comentários:

  1. Os nossos "escritores"...também são Poetas!!!
    Isto não é prosa! É poesia límpida e cristalina!
    Parabéns Quito!
    Abr

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  2. Ó Quito, enganaste-me, pá! Dizias que o teu texto de hoje não estava ao nível da pérola do Rui Felício. Mas está! E não é ponto final...
    Coincidência, hoje no blog «a funda São» saiu um texto da Miss Joana Well, cujo título é «Tic...Tac...Tic...Tac...».
    E se um dia conseguirmos convencer a Luisa Moura a cantar para nós o poema «Tic Tac» da minha amiga Encandescente, que eu musiquei, aposto que vais gostar tanto como eu adorei cada tic e cada tac enquanto li este teu texto de prosa poética.

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  3. Quito

    Pelo que vejo, há desgarrada e quando é sã, o resultado não pode ser outro. Valeu a pena. No meu tic...tac...tic...tac..., também gostaria de escrever assim. Adorei.

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  4. Para ti, para mim, e mesmo para o teu relógio, o caminhar inexoravel do tempo, há-de atirar-nos para um lugar qualquer, irrecuperáveis, definitivamente fenecidos.
    É a Lei da Vida a que não podemos fugir...
    No teu caso, Quito, a tua alma e a tua sensibilidade hão de ficar por cá, vestidas pelas palavras que tão bem sabes escolher, e que hão de ser lidas por quem nesta altura ainda nem nasceu.
    Assim a tua modéstia não te impeça de as guardar...

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  5. Agradeço a amabilidade dos Vossos comentários.
    Costuma dizer-se, que uma imagem vale mais que mil palavras. Este relógio, muito bonito na minha opinião, estava exposto numa montra de Colmar, a cidade onde vivem os "nossos" queridos amigos, BobbyZé e a Beth.A foto e da São Vaz.

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  6. Podes sentir as grilhetas acorrentarem-te ao passado e ao presente, mas não há grilhetas que te acorrentem as palavras que usas para nos mostrar os sentimentos, a sensibilidade e a humanidade da pessoa que és e sempre serás! Isso mesmo que não o sintas, irá ficar para sempre, livre e sem grilhetas.
    Um abraço e parabéns à São pela foto, que mostra muita sensibilidade artística.

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  7. TERESA LOUSADADE MENESESfevereiro 04, 2011 7:02 da tarde

    Tic tac, tic tac, bateu o meu coração enquanto lia o teu bonito texto! Sempre sentido, cheio de sensibilidade, és uma obra-prima na tua peculiar forma de nos transmitir o que te vai na alma e no coração.
    Lindo Quito! Um beijinho!
    GOSTEI MUITO!

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  8. Se é uma desgarrada,concordo,atingiu um nível altíssimo.
    Um abraço.

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  9. Quito, o saudoso,experimenta.
    Não dês corda ao relógio!
    Pelo aspeto já está enferrujado, atirado num vetusto sótão (respeitável pela sua ancianalidade) e parece cansado de tanto tic tac!
    Compra um novo, mesmo nos chineses, mas alegre, com bonecos coloridos e um bater musical, que possa contagiar os amigos com melodias de esperanças e boas novas!
    Até amanhã.E sorri!

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  10. A nostalgia causada pelo inexorável correr do tempo está a atacar os meus amigos.
    Querem saber uma coisa? Também me começa a atacar.
    Será uma pandemia?

    Entretanto, deixem-me aproveitar os tic-taques que me vão restando para gozar momentos como estes, saboreando o pensamento do Quito e a forma como ele o transmite.
    Abraço.

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  11. Este é talvez, para mim, um dos melhores e mais belos textos do Quito. Parabéns.

    A relação do homem com o tempo é um triste desafio em que o homem sempre perde, pois em cada momento em que o nosso tempo é descontado pelo tal tic tac do relógio, mais nos aproximamos daquele conceito de eternidade em que alguns de nós se vão da lei da morte libertando ou não passamos de um simples nome perdido num Registo Nacional qualquer...é a vida.

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  12. Ai Quito, Quito que me deixas "desconcertado"!
    Será que escreveste este texto porque ao rever fotos, esta que a São fixou em Colmar, te empurrou para o texto que há muito tinhas já congeminado?
    Sim, porque o que escreves não é mais do que o exteriorizar algo que tens vindo a interiorizar, sentimentos de novos afetos vividos em ambiente de solidão, de constatação de uma vida rural sem futuro, a preocupação pela vida sofrida de gentes a quem te dás de alma e coração, mas impotente para lhes vislumbrar um futuro mais risonho!
    A desertificação do mundo rural dilacera-te a alma e aos que por aí ainda resistem em ficar, tem em ti alguém com quem desabafar, que os ouve e os encoraja na esperança de que melhores tempos virão!
    Só mesmo para encorajar...porque sabes que dificilmente a realidade pode mudar o rumo do inevitável!
    Mas os fins de semana são como que um oásis!
    Nem mesmo os longínquos Kms são entrave para recarregares o ânimo para mais uma semana...de rotina, do tal tempo parado, do mesmo silêncio que mais vinca o Tic Tac do velho relógio!
    Mas seja por aí nessa vida bucólica ou por aqui neste frenesim da cidade,todos vamos um dia partir e o relógio de cada um de nós cá ficará enferrujado...

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  13. Numa futura reunião em que a Luisa Moura possa estar presente,vamos fazer uma forcinha para conseguir o que o maridinho deixou escrito mais acima, mas que aqui repito!!!
    E se um dia conseguirmos convencer a Luisa Moura a cantar para nós o poema «Tic Tac» da minha amiga Encandescente, que eu musiquei, aposto que vais gostar tanto como eu adorei cada tic e cada tac enquanto li este teu texto de prosa poética.
    A Luisa tem uma voz maravilhosa e esta canção, nada fácil de interpretar é uma maravilha!

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  14. Nada fácil mesmo. Mas a gravação que fiz foi de uma primeira experiência, imediatamente depois de compor a música. Aquilo bem arranjadinho (e tocado pelo Rui Pato, então...), iss'é qu'era...

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  15. O tic-tac deste profundo texto bateu com muita
    intensidade emocional cá dentro...
    Quito,como foi bom reflectir O TEMPO na tua perspectiva de entender e aceitar os ciclos da vida com naturalidade e alegria!
    Nem sempre fácil...
    Beijinho

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  16. Olá Luísa!

    "Ao rico não devas e ao pobre não prometas".

    Fico a aguardar que o projecto avance. Se for um pouquinho mais rápido do que o do Metro, agradeço penhoradamente.
    Tic-tac-tic-tac...

    Linda Olinda, vê se te vês livre da porra do gesso para poderes estar presente na audição.
    Tenho a certeza de que vais gostar e que vais contribuir com a tua alegria para mais um bom momento de convívio entre amigos.
    Tem fé em mim! Nunca mais os largo e a coisa vai-se dar!...

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  17. A Luisa é que tem juízo, que nem comenta aqui nem lê os e-mails.
    Carlos Viana, se conseguires convencê-la, nomeio-te mestre honorário em persuacção!

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  18. Querem ver que, finalmente, vou ter um "tacho" honorário?!

    Vou criar uma Comissão de Convicção.
    Vamos ver se será suficientemente convincente.
    Eu disse "convincente" e ponto final, sua malandreca...já estava com a cabecinha, tonta, a pensar noutras coisas.
    Mas vamos ver, está bem? E a menina ajuda?
    Porque sem a sua ajuda a Comissão bem pode limpar as mãos à parede porque não vai a lado nenhum...

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  19. A Luisa Moura canta bem. Canta mesmo muito bem. Num almoço em Santa Clara, apercebi-me do seu belo timbre de voz. Comentei com a São e ela disse-me o mesmo. Que também não lhe tinha passado despercebido o grande dote vocal desta amiga ...

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  20. Quito,
    Tomei boa nota. A São ( a tua ! ) já está na Comissão de Convicção.
    Porque a São ( a Rosas ) também já cá canta... a coisa vai-se dar, vais ver.

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  21. Como é que não poderia alinhar? Eu sou uma alinhadeira!

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  22. Faz favor ! que trocadilho vocês fazem com as palavras ! Divirto-me ao máximo, e o Sr. Viana anda com piada, sim senhor! já me confessou ser um grande admirador da voz da Luisinha Moura...
    Mas não me quero desviar do que me fez comentar.
    Quito, tu estás a ficar um escritor de "alto gabarito"! este teu texto é maravilhoso, e parafraseando o amigo Abílio, o melhor dos melhores. Continua a deliciar-nos enquanto temos tempo.

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