Nos meus tempos de jovem,pouco mais de 20 anos,fui parar a Mafra para fazer o COM.Daí a uns meses,fui direito a Vendas Novas para completar o 2º ciclo.E assim,um pouco à força,me puseram no ombro uma espécie de galão.
Passei a ter a categoria de Aspirante...
Já com essa carga nos ombros e uma,muito maior,no coração(minha filha) e na carteira,acampei em Aveiro(no velho Quartel de Sá) para dar uma recruta.
Entre os recrutas,tinha um especial.
Um rapaz com quase 40 anos,que tinha o estatuto de "preso",que já tinha vários anos de Penamacor e que,convenhamos,já tinha idade para ser meu pai.
Tinha uma "história" simples.Anos antes,quando fazia a recruta nas Caldas da Raínha,no CSM,foi a casa num fim de semana.Ao tempo também ele já era pai e tratava dos "negócios" da família.Era uma espécie de regedor do Alto do Pina.
Numa noite de negócios e copos,houve uma grande confusão e morreu,com umas navalhadas,um dos participantes.
O recruta foi preso,despromovido e passou uns anos no Presídio Militar.
Regressou à recruta a Aveiro e foi aí que nos encontrámos.
Era uma pessoa bem educada e,com aquela idade,eu tentei fazer-lhe a vida menos pesada.Da prisão.passou para a messe,que não existia,de Oficiais.
Por facilidade de tratamento,dadas as suas origens,passou a ser chamado de PINA.
O PINA,manteve a sua vidaça.Tinha um bom carro,boas roupas e não falhou nunca o que era combinado.
Lembro-me que uma vez,a uma 4ªfeira,me disse que precisava de ir resolver um assunto a casa e que no domingo à tarde estaria de regresso.
Não esqueçamos que o PINA ainda estava preso.
Depois de reflectir(ele já me tinha dito que iria de qualquer modo,autorizado ou não),eu "autorizei"(uma autorização pessoal dado que não tinha competência para conceder outra).
Andei com o coração nas mãos até domingo.
No domingo à tarde foi a minha casa uma jovem,pouco mais nova que eu,levando um ramo de flores a minha mulher de então,um brinquedo a minha filha e,para mim,um garrafão de vinho,uma caixa de charutos e uns queijos frescos(que a mãe tinha feito nessa manhã).
Anunciou-me que tinha deixado o pai na prisão do quartel e vinha agradecer-me o facto de ter deixado o pai ir aos anos dela.
Para variar,aí vai uma história da tropa e de como comecei a gostar do Alto do Pina.
À tua,Quito.
Com esta lembrei-me de um sábado em que estava de oficial de dia no então Batalhão de Apoio e Serviços (o quartel em frente à Penitenciária de Coimbra).
ResponderEliminarUm soldado vinha de Torres Novas e tinha duas guias de marcha: uma de Torres Novas para Coimbra, com várias assinaturas e a mais importante, do coronel que era o comandante daquela unidade... mas a outra, que seria para o soldado poder ir no domingo para sua casa, não tinha essa assinatura.
Confirmei com outros oficiais que, formalmente, ele não poderia ir para casa. O soldado, um humilde rapaz do campo que iria ter com os pais nuns dias de folga, chorava baba e ranho. Pedi-lhe as guias de marcha, entrei no gabinete de oficial de dia, treinei numa folha de papel as curvas e saltos da assinatura do coronel e, quando vi que estava muito aproximada, respirei fundo e fiz esses rabiscos na guia de marcha onde isso faltava. Ficou tão parecido que até acho que a minha ficou melhor que a original! Cheguei cá fora, chamei o soldado e dei-lhe a guia de marcha:
- Toma lá. Nós tínhamos visto mal. Afinal a assinatura do teu comandante está aqui. Podes ir para casa.
Obrigado Rui Lucas. De facto,conheço bem o Alto do Pina. Recordo a Rua capitão Roby e o antigo cinema Max.Da varanda da casa dos meus avós, eu via os aviões a descerem para a pista do aeroporto. Fiz lá amizades. Mas perdi-lhes o rasto. Lembro uma familia numerosa, de quem eu destacava o meu amigo Raul. Viviam com muitas dificuldes, desde o dia em que, pelas 4 da manhã, dois Pides bateram à porta e lhe levaram o pai que era o único sustento da casa.Nunca mais voltou.
ResponderEliminarMas sobreviveram com a ajuda dos vizinhos, incluindo os meus avós, também pessoas simples, mas que ajudaram na medidadas suas possibilidsdes naquela tragédia. Por isso, quando A MARCHA DO ALTO DO PINA venceu, emocionei-me. Fiz o filme das férias em Lisboa na casa de meus avós, relembrei amigos e sobretudo a memória da minha mãe. Que alegria teria ela se fosse viva! Não sei se a marcha alguma vez ganhou, Nunca me recordo dela me ter falado nisso. Agradeço-te, mais uma vez, meu caro Rui Lucas, esta dedicatória. São momentos assim, de estreitar de amizades, que me faz partilhar deste espaço que em boa hora o Fernando Rafael ofereceu a todos nós. Por entre marchas "ricas", David venceu Golias. Viva o Alto do Pina. E tu, MÃE, estejas onde estiveres, que tanto gostarias de ter saboreado aquele momento, esta é também a tua vitória...
Autêntcos "dispenseiros" à lá trouxe...
ResponderEliminarAssinavam as dispensa com o coração...
Toma lá Quito e Rui Lucas...CANTEM!
MARCA DO ALTO DE PINA
Do reportório de Amália Rodrigues.
Terá sido a Letra cantada este ano?
Lisboa vem à janela
Olha a marcha vem com ela
Lisboa vem ver num trono
O Santinho, meu patrono.
O Bairro aonde moro
Tem lá tudo que eu adoro
Lisboa cantando de novo
Traz o Alto do Pina
Na boca do povo
O Alto do Pina
Faz um vistão
De cravo ao peito
E arraiais no coração
O Alto do Pina
Por brincadeira
Diz que ao passar
Põe a cantar
Lisboa inteira
Lisboa quem foi que disse?
Que ir na Marcha é tolice
A Marcha tem luz aos molhos
E fogueira nos teus olhos
Cantigas que o povo canta
Põe a alma na garganta
Lisboa tem arte é ladina
Não há melhor Marcha
Que a do Alto do Pina.
Rapaziada, um momento alto.
ResponderEliminarTonito.
Aqui está um caso de um excelente artigo com comentários ao mesmo nível. Continuem.
ResponderEliminarCaríssimo Quito:
ResponderEliminaro texto foi escrito de supetão,com o coração a martelar no teclado e lágrimas nos olhos.
Um teu comentário,em baixo,desencadeou estas minhas emoções.
Nunca saiu tal desabafo e,se não tivesse saído nessa altura,talvez se mantivesse abafado para sempre.
Lamento ser um homem que chora.
Quanto a mim,as emoções não têm Bairro.
Continuemos a compartilhar as nossas emoções.
Um grande abraço.
Grande é o meu orgulho de vos ter como amigos, que choram e nos fazem chorar!
ResponderEliminarHá alturas em que intuímos da necessidade de acreditar no próximo.
Quito, sei que a marcha do "Alto do Pina" não ganhava há 26 anos!
Bravo!!! Bem hajam!!!
ResponderEliminarObrigado Celeste Maria, pela informação que eu desconhecia.
ResponderEliminarOs homens também choram, Rui Lucas.
Um abraço a todos.
Boa história dedicada a um bom amigo.
ResponderEliminarO Pina, se for vivo, ainda se lembrará daquele maluco que se arriscou a ir para a prisão para lhe dar uns dias de liberdade...
Também em Torres Novas alguém se lembrará de um jovem oficial que lhe deu guia de marcha até casa, arriscando o "coiro" - sim, que falsificação de assinaturas dá "grelha".
Duas histórias deliciosas.
Quanto ao Quito, é o mesmo piegas de sempre!
Grande abraço para ambos os três.
Curiosamente, esta interessantissima crónica do Rui Lucas, refere o quartel de penamacor por onde passei e um soldado de 40 anos que ali também tive como recruta.
ResponderEliminarNão se trata do mesmo, porque aquele de quem falo era natural de Idanha a Nova. Mas a história é em tudo semelhante.
Para que conste:o PINA faleceu há meia dúzia de anos;a filha vejo-a,com frequência,na televisão;quando vou a Lisboa,telefono à neta e costumamos beber um copo.
ResponderEliminarFicou sempre uma grande amizade.