No meu gabinete de
trabalho, há uma cadeira destinada a quem me vem consultar.
É confortável, pode ser
manobrada para baixo, para cima, para os lados, é reclinável e está
rodeada de variados instrumentos eléctricos. Parece uma cadeira de
dentista, mas não é.
Ontem, uma cliente
entrou, sentou-se e, depois de nos cumprimentarmos, perguntei-lhe ao
que vinha.
Desencaixou a máscara,
uma espécie de capacete semelhante a um grande ovo de cor creme e depositou-a em cima da
minha secretária.
Pediu-me que lhe avivasse
as sobrancelhas, lhe rosasse as faces, lhe repuxasse as pálpebras e
lhe arrebitasse um pouco o nariz.
Agora, despojado da sua
máscara craniana, o cérebro da minha cliente ficara à vista,
esponjoso, ondulado, composto por aleatórios refegos sobrepostos.
Enquanto eu retocava a
máscara craniana como me pedira, ia olhando constrangido, de vez em
quando, para o seu cérebro nu ali ao alcance das minhas mãos, provocador...
Reparei nalguns neurónios
soltos, desligados e perguntei à cliente se não queria que os
soldasse.
Respondeu-me que sim e,
já agora, que podia aproveitar para limpar o pó que devia estar a
bloquear-lhe alguns dos circuitos cerebrais.
Deixei cair dois
microscópicos pingos de solda nos neurónios afectados e testei a
passagem dos impulsos eléctricos.
Liguei a pequena escova
adjacente à cadeira e, delicadamente, fui limpando as poeiras
entranhadas nos mais pequenos interstícios, aconselhando a cliente a
não tirar a máscara muitas vezes, porque assim desprotegia o
cérebro, sujeitando-o à sujidade ambiente
Devo-me ter descuidado ao
fazer a limpeza do hipotálamo porque a minha cliente, de súbito,
foi inundada de calores, abraçou-se a mim e incitou-me a fazer amor
com ela.
Acordei hoje de manhã,
confuso, com este sonho ainda bem presente.
Retive que tudo se passou
na minha outra vida futura, no ano de 3152.
A minha profissão era (
será ) a de técnico neurológico.
Rui Felicio
Por vezes, é complicado comentar a fértil imaginação deste advogado Coimbrão, radicado na Ericeira. Tento assim distanciar-me do meu amigo Rui Felício, para que as palavras não pareçam gastas em elogios repetidos até à exaustão A culpa é dele. Toda a culpa. Porque revela uma capacidade tal de surpreender o leitor, que todos aqueles que queiram esgrimir qualquer argumento em seu desfavor, acabam encostados contra a parede do seu talento. Não estou a falar do Rui Felício. Estou a referir-me a um advogado Coimbrão, que também é escritor.
ResponderEliminarO texto é mais um delírio de genialidade. Quem pensaria em navegar num ano futuro - muito futuro - sentado numa cadeira capaz de, paciente consciente, ver o seu cérebro devassado, com os neurónios soldados nas pontas espigadas e uma higiénica, profilática e meticulosa limpeza da caixa craniana ?
Desta vez, o advogado da Ericeira que também é escritor, deu mais uma pincelada de magia no entardecer do texto. Não deixou uma qualquer impertinente pinça cirúrgica dentro do cérebro protegido por uma máscara de carateristicas marcianas, para assumir um descuido que nas asas de Morfeu, o catapultou para um sonho erótico por força de uma desajustada limpeza do hipotálamo. 3 152, não foi uma odisseia no espaço. Foi mais uma aventura febril de um advogado terreno, cuja pensamento voa pelo universo ao sabor da sua mente irrequieta. Seja noutro planeta, numa sereia que avista no mar, ou no prosar Queiroziano com que caracteriza um qualquer habitante de antanho de uma qualquer aldeia nas margens do rio Ceira, Rui Felício é igual a si próprio, na sua capacidade de prender o leitor ao seu magnifico, desconcertante e até por vezes até inquietante prosar.
Em tempo, na última linha: até por vezes o seu inquietante prosar ....
ResponderEliminarPor mim é ENGENHEIRO Neurológico e nunca técnico.
ResponderEliminarTonito.
Isto sim é um elogio!
EliminarObrigado companheiro.
O que lhe fizeste foi um verdadeiro eléctrochoque que a agitou sensualmente....
ResponderEliminarHum,hum...terás correspondido em 2013?
Fica a dúvida...
Estás a querer saber demais, Olinda.
EliminarMantém a dúvida...
Obrigado meus amigos pelas vossas apreciaçoes a este delirio...
ResponderEliminarDelirio omnisciente que nos deixou maravilhados...
EliminarPrémio Nobel para este criador literário sublime e é do nosso BNM,já!
E vou publicar este Conto Felício 1.139 anos antes de o sonho ocorrer. Se não é inédito, anda lá perto.
ResponderEliminarAh! E eu chamo a este tipo de textos "fricção científica".
E chamas bem!
EliminarÀ São Rosas, minha atenta e dilecta amiga, os meus agradecimentos pela entrada deste delirante escrito na alcova do seu recôndito e intimo espaço.
EliminarO meu espaço não é assim tão recôndito e intimo, meu bom Rui Felício. Isto é todos os dias, em média, uns 1.000 afundanços no blog e 1.100 leitores no Facebook.
EliminarMas está descansadinho, que o meu lema é: sou funda mas não sou larga.
E tudo se pode esperar da imaginação prodigiosa deste autor. E com o comentário do Quito fica a História completa. Abraço aos dois
ResponderEliminarO comentário do Quito, pese embora o exagero da sua injustiça, vale mil vezes mais que este momento de antecâmara da loucura.
EliminarUm beijinho Ló
Alguém já disse que os cientistas se aproveitam das ideias dos escritores de ficção, para passar à prática essas ideias. Eu concordo com esta opinião e estou convencido que se algum cientista ler este conto do Rui, certamente que muito antes do ano 3152 teremos técnicos soldadores de neurónios e limpadores de cérebros!...
ResponderEliminarUm conto que nos faz pensar, ou melhor, que nos faz sonhar!....
sonhar com este delirio para 3152 vou para o vale dos lençóis já...
EliminarObrigado Alfredo.
EliminarHá de facto exemplos de invenções originadas em histórias ficcionadas.
Mas são ficções com substracto argumentativo que as sustentam.
O que, claro, não é o caso...
Fantasmas nocturnos que o Rui Felício trouxe até nós como uma antevisão do futuro cuja leitura uma pessoa acompanha com interesse. Ainda por cima tem o picante de nunca se saber como vai acabar. Será que o ser humano vai originar a sua destruição? Francamente, não tenho resposta.
ResponderEliminarpois,pois....Chico!
EliminarPara já sonhemos.
À duvida do Chico, a Olinda junta o sonho.
EliminarPorque o sonho existe e é ele que comanda a vida.
Depois de ter lido os comentários a tão
ResponderEliminarbrilhante texto Rumo ao Futuro, resta-me desejar ao Rui um brilhante futuro como Técnico Neurológico!
Mas espero que possas começar a exercer um pouco antes da data prevista!
Nota: fiquei impressionado com a limpeza do hipotálamo!
Já depois de ter limpo o hipotalamo ( deficientemente ) e de dar por concluido o trabalho e cerrado a caixa craniana, tive de voltar a abri-la para corrigir o descuido.
EliminarFoi então que vi que a glandula pituitária estava gripada.
Dado o elevado preço da peça nova para substituir a avariada, a cliente optou, por causa da crise, só fazer a substituição quando recebesse o subsidio de férias em Dezembro...
Não me digas que a crise vai durar até ao ano 3152?! E será que ainda é o Coelho, Portas e Cavaco?...
EliminarComo nos ensinou o padre. Pacheco a. crise ha de ser per secula seculorum. Mas quem estara' no poder e' o Medina Carreira e o Dr. Miguel Relvas.
EliminarNão depois é a raposa, o portão e o graveto!
EliminarAdorei a escrita. Já que te intitulas "técnico neurológico" eu vou-te promover!!.., "és cirurgião neurológico" tal a tua versatilidade com o bisturi a recortar e juntar as palavras que nos deixa encantados enquanto as lemos.
ResponderEliminarFernando AZENHA
Obrigado Azenha, pela promoção.
EliminarPorém, fico na dúvida se devo aceitá-la ou não.
Por causa dela, entro no escalão seguinte de IRS e, se calhar, o acréscimo de rendimento que ganhar deverá ser insuficiente para pagar o imposto adicional.
Mas vale a intenção...
O Rui anda com sonhos muito curiosos!
ResponderEliminarO Presidente da Venezuela, um tal Maduro, também sonhou que já era Natal!...
Enquanto o nosso técnico neurológico não compõe a pituitária, nem cheiramos o nosso novo Natal com filhoses compradas com o subsídio de férias!!!
Rir é o único remédio, meu distinto cirurgião Rui.
Deixem-me imaginar, porque imaginar ainda não paga qualquer imposto, estou a ver uma enorme placa, colocada não sei onde mas sei que será no próximo ano de 3152, que assim rezará :
ResponderEliminarPROFESSOR DOUTOR RUI FELÍCIO
TÉCNICO NEUROLÓGICO
ESPECIALISTA NA LIMPEZA DO HIPOTÁLAMO.
Nota: prevenindo o futuro e partindo do principio de que não haverá qualquer tipo de descriminação sexual, marca-me uma consulta.
Privada!
Ao que tu te sujeitas para viveres mais uns anitos...
EliminarAmigo Viana
EliminarAo placard que idealizaste vou acrescentar:
PEÇAS DE ORIGEM
RECONSTRUÇAO DA PITUITARIA COM GARANTIA
Quanto a tua consulta ja esta marcada provisoriamente
Passa a definitiva apos recepçao de pagamento
Não vás nisso Carlos Viana, quem paga adiantado é mal servido!
ResponderEliminarPaga adiantado mas eu dou garantia
EliminarAssim ele ainda seja vivo em 3152
Está descansado, Alfredo.
EliminarAcabei de emitir um cheque pré-datado para 3152. Para 31 de Dezembro, à cautela,,,
Abração a ambos os dois.