12-02-1949
Nesta data Especial...
"Encontro de Gerações " deseja
MUITAS FELICIDADES!
PARABÉNS!
12-02-1949
Nesta data Especial...
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MUITAS FELICIDADES!
PARABÉNS!
09-02-1945
Nesta data Especial...
"Encontro de Gerações" deseja
MUITAS FLICIDADES!
PARABÉNS!
Apula aí e aprende!
Quem caminha sem destino, só pode mesmo sentir prazer em
cada passo que dá. E é essa a magia do caminhar. A beleza dos caminhos não está
na chegada; está no percurso. É no percurso que as coisas aparecem, que as
curvas se desmontam em novas imagens que nos esperam logo ali e que as
histórias se desenrolam nas telas da natureza.
Mas cada história precisa de atores e cada ator
precisa das suas falas, falas essas que desfilam assuntos que vão das tripas de
Deus aos gatos que mexem nas panelas, como dizia o castelhano do Auto da Índia.
Foi exatamente num dos caminhos sem destino que nos achámos
em Vale Longo do Côa, hoje Valongo, e noutros tempos também conhecidos como
“Tamanquinhos”, numa terra de moleiros.
O ligeiro cansaço começava a fazer-se sentir quando
decidimos entrar e abancar no café/tasca da Associação Cultural da aldeia. À
falta de necessidade de café, propuseram um Favaios fresquinho..Não que a sede
fosse muita, mas ainda não tínhamos almoçado. Havia uma só mesa longa, onde
toda a gente se sentava e quem senta à mesma mesa é amigo e não há outra
maneira de dizer as coisas.
- Então, o que andam a fazer? A caminhar?
- Sim, viemos dar uma volta e ver a ponte de Sequeiros.
Muito bonita.
- Ai é. Sabe que foi por ela que os franceses passaram e
deram cabo aí de tudo. Mas o povo recolheu-se aqui debaixo de uns
barrocos e coube lá toda a gente. Depois de os franceses se terem ido embora, a
última pessoa a sair chamava-se Maria e disseram-lhe de fora: “Anda Maria
que já só há um!” Então ficou conhecida aquela gruta como Lapa de Maria.
Os de fora pensam que é uma coisa religiosa, mas não é nada disso.
Metia conversa como se nos conhecêssemos há anos. Tinha nos
olhos a cor de cada ano vivido e o sorriso era franco. Confessou a alcunha dos
habitantes, conhecidos por “tamanquinhos”, pois noutros tempo faziam-se na
aldeia as solas dos tamancos e das socas, a partir dos paus de amieiro,
abundantes nas margens do Côa. Lembrei-me de quando usava também os tamancos
comprados na feira de Lamego e das estratégias que o meu pai usava para lhes
dar mais vida. Para que durassem nos pés da canalhada, pregava-lhes uns pneus
por baixo e à frente punha umas testeiras feitas de lata recortada de
embalagens de azeite, fixadas por brochas arredondadas. Mesmo assim, usar uns
tamancos tão catitas não era muito confortável e não nos deixavam jogar à
bola, porque uma canelada com socas ou uma trivela com as testeiras perfurantes
eram sempre de evitar.
Outra cara resolveu ensinar-nos palavras que só ali se usam.
Com gestos e explicações detalhadas falaram-nos do verbo “apular”, apanhar um
objeto que vai pelo ar; falaram-nos de ir tomar banho em “pelo” e da diferença
subtil entre “pulo” e “salto”. Explicou ainda por que razão esta terra era
conhecida por terra de moleiros, evidências que se estendem pela margem
esquerda do rio, uma miríade de moinhos de construção que nunca tinha
visto.
Mais adiante entrou um casal que também se sentou à mesa.
Vivem em Penamacor, mas vêm à aldeia no fim-de-semana. Também conversaram como
se fôssemos família. Ao sabermos que éramos de Lamego, mas a viver em Coimbra,
debitaram os segredos de casa, dos familiares que já trabalharam por lá e do
filho que hoje vive na Polónia, mas que tirara o curso de Economia em Coimbra.
Nunca tinham visto nem ouvido que tanto se jantasse na cidade do Mondego. Pois
eram jantares de curso, jantares do carro, jantares disto e daquilo… enfim, um
abuso de jantares. Mas achavam piada. Lembrei-os de que daqui a quinze dias
seria a festa de Aranhas e acharam estranho que soubéssemos dela. Explicámos
que costumámos ir lá com a Bota e ficou combinado que nos procurariam no
dia.
Precisávamos de continuar a andar e levantámo-nos para irmos
pagar a despesa. Quando perguntei quanto era, disseram que já estava pago. Nem
valeu a pena reclamar. Não conseguimos saber quem foi, pois tantos olhares se
riram.
- Atão a gente ia deixar as visitas pagar? Nem pensem.
Restou-nos agradecer e prometer voltar, porque nos pertence
voltar aonde nos tratam bem. É destas curvas do caminho que falava.
Antonino Silva
01-02-1947
Nesta data Especial...
"Encontro de Gerações" deseja
MUITAS FELICIDADES!
PARABÉNS!
LAU
31-01-1945
Nesta data Especial...
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MUITAS FELICIDADES!
PARABÉNS!
A VALSA DOS PATINADORES ...
Naquele ano e naquele dia de outono, a Mata Nacional do Choupal foi brindada com as primeiras chuvas. Uma chuva miudinha que fazia subir no ar o cheiro da terra molhada e um aroma mais intenso a eucalipto.
Naquele quarto largo de janelas amplas e paredes brancas, batalhava-se pela vida. A parturiente, cansada, tentava dar à luz a sua criança. Então ele, o pai, preocupado, tomou uma decisão. Subir o Choupal a pé em direção à cidade de Coimbra, na procura de um médico que assistisse ao nascimento de quem teimava em não querer sair do ventre de sua mãe.
A arfar, chegou à cidade. E, por indicações de gente solidária com o drama, bateu ao ferrolho de um médico. O clínico, de cabelo grisalho, ouviu o pedido de socorro. Ficou pensativo, quase relutante em partir. Afinal, naquele fim dos anos quarenta do século passado, a Mata do Choupal era um arrabalde sombrio da cidade. Um talefe nas margens do Mondego e do mundo. Mas decidiu partir, levando ao seu lado num velho Ford, um pai aflito.
Guiando devagar e aos solavancos, evitando as poças de água do caminho de terra batida e de pontes de madeira que eram pulos entre braços do rio, os dois homens chegaram junto ao cais das angústias. A futura mãe ganhou um ânimo novo, ao ver ali uma luz ao fundo do túnel do seu sofrimento. Em mangas de camisa e tendo como ajudante a Maria José, mulher de baixa estatura e rosto trigueiro, mãe de um pai ancioso, o parto difícil teve um fim feliz. Com a criança de pequeno porte de cabeça para baixo e presa pelos pés, o médico deu-lhe um açoite nas nádegas e o menino chorou num vagido sofrido.
Então o médico, de óculos na ponta do nariz, olhou melhor o nascituro débil e escanzelado e teve a frase proscrita - minha senhora, o seu rapaz não presta para nada. Talvez uma forma dilacerante de expressar o seu desagrado, por ter sido quase coagido a deslocar-se àquela casa plantada no coração da Mata nas margens do Mondego. Com o valor dos seus préstimos no bolso, despediu-se numa saudação soturna, rodou o Ford de proa virada para a cidade e, de novo evitando as poças de água, aos solavancos partiu.
Num alguidar com água morna, a Maria José lavou com cuidado e desvelo o seu pequeno neto. Depois, aconchegou-o na cama junto de uma mãe depauperada do esforço de horas heroicas. A criança foi deitando corpo com o leite da vaca que o Vale todos os dias trazia numa pequena vasilha de alumínio, já que o leite materno tinha secado dos seios exauridos daquela mãe-coragem. Batia à porta de mansinho e, de boné na mão num sinal de respeito e cortesia, saudava a Maria José que, junto à lareira, o pequenito enrolado num cobertor no seu berço de madeira - feito na carpintaria da Mata com os materiais recolhidos nas margens do Choupal e oferecido pelos seus trabalhadores - mexia com uma colher de pau o café que borbulhava nas brasa da lareira num aroma enleante e divino. O menino em suave repouso, era filho primogénito da Mata e dos assalariados daquele pulmão de Coimbra, que também o adotavam como seu.
A frase terrível do médico sobre aquele menino, ficou gravada para sempre como um ferro em brasa num coração de mãe. Talvez uma premonição na Ata dos Livros da Vida. Com o amor de mãe, de pai, da Maria José e do José António - o avô, o menino aprendeu a amar a natureza. E a respeitá-la. E a ouvir, de janelas abertas de par em par e na grafonola de cor verde-escuro, a "Valsa dos Patinadores" que invadia a Mata nos seus acordes, uma obra de Émile Waldteufel tão ao gosto do avô José António, que tinha na música entre choupos, plátanos e eucaliptos, a moldura dourada que lhe adoçava a existência de uma imaculada vida.
Kito Pereira (Contos da cidade)