sexta-feira, 30 de setembro de 2022

ANIVERSÁRIO PAULO MOURA

PAULO MOURA

30-09-1960

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MUITAS FELICIDADES!

PARABÉNS!

quinta-feira, 29 de setembro de 2022

ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA- COIMBRA

Coimbra, reflexos da nova Baixa

(para quem não conhece, esta é no largo da loja do cidadão, av. Fernão de Magalhães)

Foto de Leonel Brás

 

terça-feira, 27 de setembro de 2022

segunda-feira, 26 de setembro de 2022

COIMBRA ANTIGA - TEATRO AVENIDA! POR RUI FELÍCIO


 CINEMA NO TEATRO AVENIDA
( Onde também era feito o Sarau da Queima das Fitas )
Para a época, o Teatro Avenida  era uma sala de espectáculos que enobrecia a cidade.
Nela assisti a inúmeros filmes e várias peças de teatro.
Lamento que tenha desaparecido e sido transformado em centro comercial.
 Agora e sempre o mesquinho interesse económico a sobrepor-se à cultura.
Era uma sala espaçosa, com uma ampla Plateia encimada e coberta em parte por um varandim onde se desenvolvia o Balcão, frisas e camarotes, tudo sustentado por uma fiada hemicircular de pequenos pilares..
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Vivia-se numa sociedade fechada, em que as autoridades impunham um puritanismo férreo, proibindo revistas mais ousadas e até cortando passagens de filmes que considerassem atentatórias dos bons costumes.
Naquela noite, corria o filme “A queda do Império Romano”, em que Sophia Loren era protagonista.
Na sala cheia, nem o mais leve zumbido se escutava, numa cena em que a artista conversava com Livio e aparecia com um avantajado decote que deixava adivinhar os volumosos seios, cuja nudez integral a imaginação juvenil da maioria dos espectadores procurava desvendar.
Como pelo efeito de uma bomba, a paz sonhadora dos jovens foi quebrada pela voz tronitruante do Batarda que, instalado na primeira fila do Balcão, gritou cá para baixo:
- Aqui de cima vê-se tudo !
Rui Felicio

domingo, 25 de setembro de 2022

ANIVERSÁRIO - OLGA RODRIGUES VIANA

OLGA RODRIGUES VIANA

25-09-1946

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sábado, 24 de setembro de 2022

1954-MEUS ANOS DE MENINA -Conto de Georgina Ferro

 

954

        Os meus anos de menina

         A Ti Mariana estava sentada nas escaleiras a remendar as ceroulas do Ti Júlio. Era uma tarde fria e escura. Tinha vindo para a rua porque os olhos choravam e lá dentro não via nada nem conseguia enfiar a agulha. 

 _ Eu posso enfiar, se vossemecê quiser!  Mas hoje choram-lhe tanto os olhos! Quer que vá a casa pedir os óculos do meu tio? Ele só os põe quando lê o jornal e a minha tia também os põe para coser.

 _ Ai minha cachopita, és mesmo uma menina linda!

 _ Sabe, amanhã a Menina Lurdes vem de férias! As minhas primas vieram pelo Natal, agora só vêm no Verão. E as suas filhas também vêm?  

 Foi então que reparei que os olhos da Ti Mariana já escorriam pela cara abaixo e o lenço não conseguia enxugar as lágrimas!

 _ Não vêm, não, minha filha!... Este ano não tivemos batatas para vender e as castanhas gearam. Por isso elas não vieram pelo Natal nem vêm passar a Páscoa. Não arranjámos dinheiro para os bilhetes. A Mourisca pariu, mas a vitelinha vai fazer-nos falta para o trabalho porque a mãe já está a ficar velhota! O que nos valeu foram as “chibas” que tiveram chibinhos e o meu homem vendeu quatro na feira de Alfaiates para podermos mandar o dinheiro para pagar o colégio.  

 E a tia Mariana ia falando, mais para ela do que para mim, ( penso eu agora) porque ia baixando a voz e levantando a aba do avental  para esconder o rosto, eu “cuidei” que ela já tinha o lenço todo molhadinho!

 _ Ti Mariana, não chore! Eu vou num instante a casa e trago-lhe o meu mealheiro. Já lá tenho pesetas e tostões. Até já tenho uma moeda de vinte e cinco tostões, que me deram os meus padrinhos. E pode comprar o bilhete para elas virem. Está bem? 

 Ela abraçou-me com tanto carinho como se eu fosse uma das suas filhas, mas disse-me que o bilhete tinha de ser comprado com notas. O senhor cobrador da camioneta não aceitava moedas. 

 _ Mas eu vou falar com o senhor Ismael  e ele de certeza que aceita!... Pode ser?!

 Por mais que me explicasse eu não consegui perceber porque a Ti Mariana chorava e ria ao mesmo tempo!...

 Georgina Ferro


quarta-feira, 21 de setembro de 2022

ANIVERSÁRIO - MARIA ALEXANDRA FERREIRA -.XANI

MARIA ALEXANDRA CONCEIçÂO FERREIRA

                     XANI

21-09-1949

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terça-feira, 20 de setembro de 2022

sábado, 17 de setembro de 2022

CASA DOS TORRESMOS CRÓNICA DE RUI FELÍCIO

 

CASA DOS TORRESMOS


O Zé Lopes, mais conhecido por Carvalhosas, por ter nascido na aldeia do mesmo nome na margem esquerda do Mondego, afirmava sem modéstia que a sua Casa era a melhor de Coimbra para uma ceia à base de petiscos.


Nem tanto para se jantar, porque os melhores cozinheiros que ali iam fazer uma perninha, só à noite estavam disponíveis. Durante o dia trabalhavam nas sofisticadas cozinhas do Hotel Astória e do Hotel Avenida.

Mas em comida de palito o dono da Casa dos Torresmos pedia meças.

Com a dupla vantagem, dizia, de o artefacto de Lorvão servir para picar o petisco e depois para esgaravatar os dentes no fim do repasto.

A sua Casa, orgulhava-se o Carvalhosas, oferecia um bom ambiente para uma converseta entre os convivas, sobre os mais variados temas, desde política à má língua.

Degustar uns pipis, umas rodelas de morcela de arroz, umas moelas com molho picante, uns troços de farinheira frita, uns torresmos, umas tiras de presunto da salgadeira, uns nacos de leitão da Bairrada, acabado de chegar no comboio das oito, umas fatias de queijo curado de São Romão, tudo regado com uma celestial pomada do barril atestado dia sim dia não com o encorpado  tinto vindo expressamente de Cantanhede, tudo isto era o lastro estomacal, para desatar as línguas, exercitar os dedos e afinar as gargantas para a desejada sessão de música popular com que terminaria a noite.

Era especialmente aos sábados à noite que ali se juntavam os tocadores e os cantores, que eram gente de trabalho e nem sempre podiam fazer noitadas nos outros dias da semana.

A Casa dos Torresmos, na Travessa das Canivetas, atraía a vizinhança das vielas próximas que às portas e janelas se aprestava para ouvir os trinados que esperavam escutar lá por volta das onze da noite.

O Ralha na guitarra, o Arnaldo no banjo ou na concertina, o Olímpio na viola eram, todos eles, excelentes executantes e por isso presenças desejadas pelo Carvalhosas que transformariam a noite quando a sua vida lhes permitia irem à sua Casa.

O Olimpio e o Ralha também cantavam, mas a trempe ficava completa, quando, pasme-se, aparecia o Lacerda, Chefe da Secretaria do Liceu D.João III, que interpretava divinamente o Fado de Coimbra e outras canções populares beirãs.

As noites coimbrãs, ao contrário do que se pensa, não se resumiam ao ambiente universitário.

Rui Felicio


sexta-feira, 16 de setembro de 2022

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

E NOS PROMETERAM UM NOVO NORMAL-TEXTO DE CHAMA MAMÃE

 E nos prometeram um "novo normal"...


E lá se vai um pouco mais de três anos a convivermos com a doença que causou  todo tipo de transtorno deste Século: COVID 19!

Mortes. Destinos interrompidos. Viagens canceladas. Famílias isoladas. Depressão. Sequelas da doença. Estudos e estudos (alguns conclusos, outros, não!)

Nunca se viu tantos "especialistas" comentando e "fundamentando" o que até mesmo eles não acreeditavam. 

Agora, época de eleições, as "doenças" continuam, têm outros sintomas...e graves! São as promessas descabidas; a falsa impressão de que os benditos (?) candidatos estão, sobremaneira, preocupados com a população...o povo. Os mesmos. Os de sempre. Porém, se tem algum novo candidato, a impressão que se tem é que já vem "formado" nas escolas da corrupção. Aliam-se àqueles já maculados pelas falsas promessas não cumpridas,  após eleitos, obviamente.

Mas mais doentes está o povo, acometido de uma psicopatia grave: ama sofrer. Acredita na ilusão. Não consegue sarar da ferida de anos. Retorna à cena. Deixa-se comprar, inclusive.

As mortes causadas pela COVID-19 agora servem de estatísticas - manipuladas - para acusarem-se uns aos outros, tudo com o intuito de chegarem ao poder. Um poder encharcado, enlameado, corruptível e que transpira e transborda desconfiança.

Disseram-nos que viveríamos um "NOVO NORMAL" (hã?). A normalidade a que se referiam será esta do presente? Aumento da violência, aumento da corrupção, briga pelo poder...famílias destruídas pela (maldita) droga...

Ah, não quero essa normalidade! Quero ser louca. "Inlúcida". Incapaz. Olhar para mim e me vê ainda com princípios que eu sempre entendi como valorosos para formar meu caráter. Não quero ser "normal"! Senhor, afasta de mim esse cálice!


Parece uma Pandemia...acomete o Mundo todo...infelizmente.


Chama a Mamãe

terça-feira, 13 de setembro de 2022

ANIVERSÁRIO - ANTÓNIO MANUEL QUARESMA

ANTÓNIO MANUEL QUARESMA

               TÓ MANÉ

13-09-1945

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segunda-feira, 12 de setembro de 2022

FINTERLÚDIO MUSICAL FADO DE COIMBRA, JOÃO FARINHA, SAUDADES DE COIMBRA

ANIVERSÁRIO - EDUARDO JORGE LEITÃO CARVALHO

EDUARDO JORGE LEITÃO CARVALHO

12-09-1951

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ANIVERSÁRIO- ANTÓNIO PINTO MARQUES

ANTÓNIO PINTO MARQUES

            TONINHO

12-09-1950

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domingo, 11 de setembro de 2022

ESTAVA UM LINDO DIA! Por Georgina Ferro

 


Estava  um dia lindo. Os campos cheiravam a terra fresca e regada. As batateiras já estavam enfeitadas de branco e amarelo. Não tardaria a ser preciso ir arrancá-las. 

    _ Ai mãe!, não tarda temos as batatas encascadas, home! Nem sei bem quem nos irá fazer carava! E, este ano, doente como andas, nem tu te atreves a pegar no sacho!...

    _ Pois não, Maria!  Que vai ser de nós!? 

     _ Já viste?!, este ano não há cá gente com força! Os homens fortes abalaram todos e até as mulheres estão de partida!...

     _ Falando nisso, a nossa Conceição "já se abala" esta semana com os cachopitos. Até a Alice sai do colégio. Parece que a Isabel Maria já tem trabalho por lá.

     Lembro-me tanto destas conversas no ano de 1955 e nos seguintes. Era tão triste ver a aldeia a ficar sem gente. Aquela aldeia cheia de vida desde o romper da aurora até ao toque das Trindades de cada dia. 

     Na década de sessenta, a pouco e pouco deixavam de passar as vacas a caminho dos lameiros, não havia rebanhos, não se semeava o linho, já eram as mulheres que jungiam as parelhas e pegavam na rabiça do arado. Não havia cantigas ao domingo pelas quelhas e ruas do povoado! Os velhos castanheiros iam secando, a canalhita já não jogava ao motcho, ao berlinde, às chinas... no Largo do Enxido, nem havia meninas que chegassem  para fazerem uma roda no pátio do recreio. As cachopas já não se aperaltavam para ir à fonte, porque os mancebos que deveriam estar a esperá-las tinham emigrado, estudavam ou, na maior parte, tinham sido mobilizados para a guerra no Ultramar. 

     Os que arranjavam força para partir sofriam o embate da despedida, de usos, costumes e da nova língua. Como era difícil querer falar e não saber palavras para se exprimirem. Mas os que ficavam, Deus meu, sem terem quem ajudasse a acarretar a lenha para o lume de todos os dias, quem ajudasse naqueles trabalhos sempre feitos em conjunto, quem jogasse às cartas ao serão... Ali ainda não tinha chegado a electricidade, o rádio a pilhas só fazia ruído e não se percebia nada, o cinema projectado nas paredes da garagem deixou de aparecer e dos saltimbancos em caravana ninguém mais ouviu falar . 

    As cartas eram desejadas como o maior tesouro. Quem tinha  ficado mal as conseguia ler. Uns porque nunca tinham aprendido, outros porque os olhos já não conseguiam decifrar aqueles rabiscos... E as saudades eram tantas!... 

    Vinha Agosto! Que mês mais desejado! Que euforia!... Mas era tão pequenino! Passava tão depressa! Nem dava para se reconhecerem.    

  Uns queriam fazer tudo: ceifar o feno, fazer a malha do centeio, acarretar lenha para deixar na alpendurada do curral, ir regar,  abrir as arcas e pôr a roupa ao ar, arear as panelas de ferro na ribeira, esfregar os soalhos da casa... como se quisessem deixar gravada a sua presença o ano inteiro... ;    

     Outros queriam ir às festas da aldeia e dos arredores, ir à praia passar uns dias a descansar ... e mostrar Portugal aos filhos...

     Enquanto se mantinham  por lá, todo o tempo era pouco para falarem dos "achalemes", dos "briques", das "vacanças", das "vuaturas"...

     Nunca me lembro de lhes ter ouvido falar dos enormes sacrifícios que a vida lhes impunha para poderem juntar um bom mealheiro. Sei que a esperança duma vida melhor para os filhos e seu próprio futuro era mais importante do que aquele tão penoso tempo presente. Bastava vivê-lo não era necessário falar dele.

     Georgina Ferro


quinta-feira, 8 de setembro de 2022

ANIVERSÁRIO- JORGE ROSA

JORGE LOPES ROSA

08-09-1948

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sábado, 3 de setembro de 2022

«Salatinas» - Artigo de Rafael Vieira e fotografias de Mário Canelas para a revista digital Coimbra Coolectiva

 Por que é que devíamos todos saber quem são os salatinas de Coimbra

«Oh as casas as casas as casas

mudas testemunhas da vida 

elas morrem não só ao ser demolidas

Elas morrem com a morte das pessoas

(…)

Na casa nasci e hei-de morrer

na casa sofri convivi amei

na casa atravessei as estações

Respirei – ó vida simples problema de respiração

Oh as casas as casas as casas».

 Excerto de poema de Ruy Belo

A Alta de Coimbra já foi outra, teve outros quarteirões, outras casas e ruas. Num impulso de rápida modernização, o Estado Novo pôs em marcha o plano para uma nova cidade universitária, o que implicou o derrube de casas, colégios e igrejas, a demolição de quarteirões inteiros a partir de Abril de 1943, obrigando à saída forçada de centenas de famílias, um historial de desenraizamento que importa contar, a história dos salatinas.

 Ladeira do Castelo, actual Calçada Martim de Freitas

Os salatinas eram aqueles nascidos na Alta, sem distinção, comenta Ricardo Figueiredo, nascido na Alta em 1936. Alguns dos descendentes de salatinas reclamam também para si o nome. Eduardo Albuquerque, um dos historiadores responsáveis pela Cooperativa Rebobinar, esclarece que era um termo que servia para designar os habitantes da Alta, surgido «da bravura da gente de Coimbra que ajudou D. Afonso IV na Batalha do Salado (1340)».

Apontam-se outras origens do nome, umas mais remotas do que outras e fala-se também dos chibatas, que seriam os oponentes dos salatinas. Acima da Sé Velha ficava o Bairro Alto, Latino ou salatino; abaixo o bairro chibata, que incluiria o Arrabalde, a Baixa. O Quebra Costas servia de fronteira, local de despique e batalhas entre os dois grupos. A etimologia e até os limites da Alta são fluídos, juntam-se ainda os futricas e as tricanas, os termos não são definitivos, diluíram-se com os anos; sobrou o nome de salatinas para celebrar a população deslocada da Alta.   

Construíram-se bairros para alojar estas famílias, o de Celas, o da Fonte do Castanheiro e o Marechal Carmona, que se viria a chamar de Norton de Matos, entre outros, construídos apressadamente e sem grande esmero qualitativo. Construídos em 1946, em zonas ermas afastadas da cidade, Celas e Fonte do Castanheiro permanecem como os bairros sociais mais antigos de Coimbra, neles ecoam tradições e memórias da última geração de salatinas e seus descendentes.

Memórias de Salatinas

Maria de Lurdes Dias, a quem todos tratam por Milu, recebe-nos na Associação de Moradores do Bairro de Celas (AMBC), da qual é tesoureira. Nasceu há 86 anos na Rua dos Militares, na Velha Alta, ao lado do Hospital dos Lázaros. «Eu era telefonista, tinha centenas de números na cabeça, mas a memória já não é o que era», desculpa-se, apesar dos detalhes de que se recorda, que acompanham a sua vivacidade.

 «Foi no tempo de Salazar. Ele entendeu que devia fazer a cidade universitária naquele sítio e, quando este Bairro [de Celas] ficou concluído, puseram uma camioneta à frente da casa das pessoas [na Alta] e fizeram um ultimato. Isto aqui era um deserto, o caminho era em terra, quando chovia era só lama, ouviam-se apenas os passarinhos. Formou-se aqui uma grande família, toda a gente se ajudava».

Os salatinas recriaram a sua Alta no Bairro de Celas: o centro do bairro recebeu a estátua de São João Evangelista, que coroava o topo do Colégio dos Lóios, situado diante da Sé Nova e que albergava o Governo Civil à época das demolições. Baptizaram as ruas com nomes de ruas desaparecidas da Alta: Borralho, Cozinhas, Marco da Feira, Forno, Castelo. Duas ruas cometem a proeza de se duplicarem: a Rua Larga e a dos Estudos existem tanto na Alta como no Bairro de Celas. Do Hospital dos Lázaros, que se localizava onde está agora o Departamento de Matemática da Universidade de Coimbra, salvou-se um portão, colocado no muro do IPO. Nele pode ler-se, desenhado a ferro forjado: «Hospitaes da Universidade». Objectos salvos dos escombros e toponímia para reconstituir uma vida perdida, um pequeno mundo circular de cem pequenas casas geminadas, com o Largo de São João como centro.

Milu continua: «Foi muito triste virmos para aqui. Muitas pessoas morreram com saudades, houve um senhor que se matou com desgosto, o Senhor Colaço. O meu tio Eurico ficou muito doente, sempre que ia [à Alta] chorava, um dia até desmaiou. Tenho muitas saudades da Alta, vivi lá pouco tempo, mas era muito bonita. Quando era miúda corria tudo a pé, quando ia para a escola da Boa Vista (ao lado da Casa da Escrita), era muito cabrita». E recorda-se de personagens coloridas do imaginário coimbrão, do Formiga, da Ana da Venda, do João Lambufa, «sempre bêbado, que a protegia».

Ricardo Figueiredo viveu no Bairro de Celas até 1962, do qual conta: «Bons tempos. Reproduzia-se a vivência da Alta. Já nos conhecíamos». Da Alta, recorda-se «do companheirismo, num mundo tão diverso. [Davam-se] filhos de uma sociedade com níveis muito diferentes, que se encontravam na rua, na escola pública, na catequese, no Largo da Feira [dos Estudantes], no Jardim do Leão». O Leão a que se refere é o monumento a Camões, muito importante no ideário salatina. Monumento nómada, estava originalmente colocado num largo em frente da Porta Férrea, repousou décadas ao lado do Instituto Justiça e Paz e foi colocado finalmente na Manutenção.

Para os Bairros de Celas e Fonte do Castanheiro foram os salatinas de menores posses. Já para o Norton de Matos foram, conta Milu, «aqueles que tinham empregos melhores, ou cursos, enfermeiros, escriturários, etc.», já que a renda era o dobro da praticada nos restantes bairros, o que se reflectia também nos equipamentos e na infraestrutura.  

Fernando Ribeiro, presidente da AMBC – Associação de Moradores do Bairro de Celas, que também nasceu na Alta, conta: «Este bairro tem tradições com tendência a acabar, como a Feira dos Lázaros, que era uma tradição da Alta transportada para aqui; também as Fogueiras (de São João). As visitas que iam ver os doentes no Hospital dos Lázaros compravam brinquedos e lambarices nas bancas que estavam cá fora e levavam aos doentes. A tradição [da Feira dos Lázaros] continuou na Alta, mas aqui este ano não aconteceu. Disseram-me que as pessoas que pertencem ao Grupo Folclórico [que organiza a Feira] já têm uma certa idade, que dá muito trabalho. Se a AMBC tiver ideias de fazer Fogueiras é preciso licenças para o som. Como o Bairro de Celas foi circundado de unidades hospitalares, fazer aqui barulho levanta problemas. Isto desanima as pessoas, tudo tem tendência a acabar. Os salatinas estão a ir embora, ainda há uns dias faleceu uma senhora. Estamos a desaparecer».

 Milu percorre com o olhar uma galeria de fotografias que preenche a parede da Associação: «Estas caras vieram todas para aqui. Primos e tios. Eu sou a última geração da Alta, quando eu morrer vai-se tudo». 

Filhos da Alta

No Bairro da Fonte do Castanheiro, com quase uma centena de casas aninhadas na encosta do Vale da Arregaça, resta apenas uma salatina. Fernando Coelho, Presidente da Associação de Moradores do Bairro, não se considera salatina, porque não morou na Alta, nasceu já no Bairro. Para ele, a «vida no bairro era uma vida solidária, completamente diferente daquilo que temos hoje, mais individualista. Se uns faziam broa, iam levar a broa aquele e àquela. Havia essa entreajuda, porta aberta, característica de uma aldeia. Tudo mudou. As pessoas que estão agora no bairro já não têm nada a ver com os desalojados da Alta».

Na Rua das Fogueiras faziam-se as Fogueiras, reminiscências da Alta. «Isto era um ermo», continua Fernando Coelho, «não tínhamos acesso a nada. Íamos para a escola na Rua dos Combatentes, tínhamos transporte apenas [em frente ao Colégio de] São Teotónio, tínhamos que ir a pé».


Patrícia Sousa Carlos, a Tixa, já nasceu no Bairro de Celas, tem 47 anos. «Na minha casa, antes de eu nascer era a minha avó, a minha bisavó, mais dois tios, e duas tias, a minha mãe pequenina, quatro filhos. Numa casa com três quartos, imagine como é que eles viviam». No outro extremo da cidade, Fernando Coelho completa: «Os salatinas eram classe operária, funcionários públicos, polícias, etc. Eram a classe mais pobre, digamos assim. Uma pessoa assim desalojada, deslocada do seu habitat original, não é fácil».

Se muitos salatinas escaparam às dificuldades monetárias e lograram sair destes bairros, noutros, as questões sociais ecoam após uma primeira e segunda geração, fazendo reviver assimetrias económicas bem vincadas na Alta antes da sua destruição.

Fragmentos

Nádia Duarte concluiu o curso de Arquitectura no Brasil, prosseguiu os estudos ao ingressar no Mestrado de Design e Multimédia na Universidade de Coimbra e interessou-se por documentar os salatinas do Bairro de Celas. «Surgiu essa curiosidade: e se as pessoas [desalojadas da Alta] ainda estão por aí? Nunca ninguém as ouviu, são setenta anos calados, é muito tempo». Nádia registou depoimentos de salatinas, alguns já entretanto desaparecidos, «emocionavam-se, porque muitos casos foram traumáticos, o deixar a casa da Alta, as memórias. Na sua inocência, comparavam o que têm agora, com aquilo que tinham na Alta».


Nádia doou a sua interessante recolha documental, «Fragmentos», à Associação Tarrafo. Nela, adivinham-se sensibilidades profundas em relação à perda de um chão e à usurpação da identidade de lugar. Na mesma altura, o designer Joaquim Borges materializou a Alta de Coimbra pré-1942, aliando a recriação material à recolha imaterial de Nádia [ver marcador em cima].

O Bairro de Celas despertou diversos outros interesses, como o de Sara Silva, que desenhou as casas do Bairro, o que originou uma exposição e um projecto de livro para colorir, que não avançou por indisponibilidade financeira da Câmara Municipal de Coimbra. «[Os moradores] receberam-nos com entusiasmo, como se fossemos família». 




Também Pierre Marie, outro dos historiadores responsáveis pela Rebobinar, diz que estão a ponderar fazer visitas guiadas relacionadas com a Alta. Teriam forçosamente que contar a história salatina. «É uma história muito por fazer, parece que a cidade universitária faz todo o sentido e nunca se questiona o que havia lá antes. O projecto do Estado Novo era algo muito mais imponente, não conseguiu fazer o que pretendia, a construção arrastou-se por décadas e há toda uma falta de simetria em relação ao que o regime pretendia inicialmente. A dimensão imaterial é algo que não estudámos a fundo, era uma zona com muitas vivências e tradições. Havia bastantes tabernas, havia um lado cultural e social muito forte. É natural que as pessoas tenham trazido isso nas suas bagagens [para os bairros]. Foi um trauma muito forte, porque perderam toda esta parte de sociabilidade que estava ligada a um local que desapareceu». 

Canção do barbeiro

Tiago Rodrigues Martins é professor de música e o Presidente da Associação Artística e Cultural Salatina, não muito distante da Fonte do Castanheiro. Criada em 2016 por um grupo de pessoas que se juntava na extinta Escola de Música da Fundação Inatel, esta é uma associação para pessoas adultas.

Na altura da escolha de um nome para a associação, Tiago conta que «achámos interessante os salatinas, porque, metaforicamente, está relacionado com o aparecimento da nossa associação. O povo salatina é um povo que foi obrigado a sair do local onde estava, o nosso surgimento deve-se um pouco a sair do sítio onde estávamos. Depois, a nossa actividade rainha: a música. Na sua génese, o povo salatina tem raízes culturais fortíssimas; foi naquele local da Alta que existiu a primeira “escola de música” de Coimbra. Os senhores barbeiros da Alta, quando não cortavam cabelo, tocavam guitarra portuguesa. Eram locais sociais, tal como agora os cafés, e quando as tesouras não trabalhavam, ouvia-se uma guitarra a tocar. E claro, um som de uma guitarra a tocar, alguém está a ouvir, e se está a ouvir está a aprender. Davam-se ali aulas de forma informal, estava a existir música. A associação vive dessa actividade rainha, que é a música».

É uma continuidade musical que representa e dignifica a tradição musical salatina, além de que membros da direcção são salatinas e há grande proximidade entre a associação e a comunidade do Vale da Arregaça.


À entrada do Bairro de Celas, uma placa celebra onde morou Flávio Rodrigues, um aclamado músico, compositor e mestre da guitarra. Era um desses barbeiros-guitarristas salatina a que Tiago se refere, assim como o foi o seu irmão Fernando. Ensinavam guitarra entre tesouradas, primeiro na Alta, depois já nesta casa, onde chegou a ter Zeca Afonso como visita. O seu bisneto, Filipe Sampaio, vive ainda nesta casa, com a sua família. 

Pierre Marie recorda também o papel do Centro de Recreio Popular do Bairro de Celas, então com o nome de Centro de Trabalhadores de Celas, como um «palco bastante importante nos anos 80 e 90, no desenvolvimento do rock em Coimbra». Mais um nó a desatar da relevância musical destes bairros.

Continuidades e sugestões

Fernando Coelho acha que «a vivência na Alta coimbrã devia ser salvaguardada. Numa fase inicial, havendo material, seria interessante enveredar por uma exposição».  

Já para Nádia Duarte, seria «um sonho para mim se outros estudantes pudessem pegar [na recolha de testemunhos], fazer um laboratório disso, usar a infraestrutura do cinema. Também porque é um trabalho urgente, porque as pessoas estão a desaparecer. Seria interessante reunir biblioteca de livros relacionados, seria um bom apanhado histórico, devia haver uma exibição permanente, pelo menos. Na época eu queria continuar com o documentário. Havia pessoas que estavam a favor da mudança. Era uma ditadura, às vezes não dava para perceber se as pessoas eram a favor ou contra, estavam formatadas para se conter».

Para Filipe Sampaio, «a preservação da tradição da cidade e da Alta, passa pelo transmitir conhecimento e abrir esse mesmo caminho para que este não se perca. Para mim, ser salatina é um orgulho, tenho pena e algum ressentimento por viver numa cidade que parece esquecer os seus habitantes, e que dá mais valor aos que passam por cá três ou cinco anos, e que na sua maioria nem sequer cá ficam ou voltam a visitar. Os que cá estão têm saudade dos que já partiram, sejam tempos ou pessoas. Eu tenho saudades dos meus amigos, familiares e tradições que cada vez mais se ignoram, há muita coisa que poderia ser feita para manter a memória dos salatinas, a sua cultura e tradição, mas poucos são os que estão interessados nisso. A CMC tinha a obrigação de manter viva essa chama, ao incentivar convívios, espectáculos, exposições, entre outros eventos e iniciativas, mas parece evidente que não há nem haverá no futuro próximo qualquer tipo de interesse nisso».

*Imagens antigas retiradas do livro «Coimbra através dos Tempos» (Coedição Cruz Vermelha com G.C. – Gráfica de Coimbra Lda., 2004), de Rafael Marques

Artigo de Rafael Vieira

Fotografias de Mário Canelas - livro «Coimbra Através dos Tempos»

para a revista digital

Coimbra Coolectiva


quinta-feira, 1 de setembro de 2022

ANIVERSÁRIO - JORGE ARTUR ALMEIDA

JORGE ARTUR ALMEIDA

01-09-1942


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