O berço de um jornal ...
O “Jornal do Fundão”, faz sessenta e sete anos. Sessenta e
sete anos a remar contra ventos e marés. Sessenta e sete anos a lutar pela
justiça social. Sessenta e sete anos a glorificar a amizade fraterna. Sessenta
e sete anos na defesa dos mais deserdados e simples.
Hoje, nesta roda da vida, o prestigiado semanário tem um novo
timoneiro. Já um dia, talvez há um ano, vos falei dele. Chama-se Nuno Francisco
e tem agora aos ombros a pesada tarefa de prosseguir esta aventura de erguer a
voz quando alguns pretendem que o lago esteja adormecido.
E, na comemoração desta efeméride, na separata da última
edição, o Dr. Nuno Francisco escreveu um artigo que eu, simples amador das
palavras, acho uma pérola. De resto, já tive ocasião de lho dizer. Com o título
“Palavras, para que vos quero”, Nuno Francisco escreve:
“ O caminho fez-se no alvoroço das palavras, no sentir de
cada letra que se estende sobre uma alva página de jornal. Construiu-se a
realidade de uma região com palavras ancoradas em papel, o porto de abrigo
deste jornal, mesmo quando amordaçado nas masmorras da longa noite da Censura.
Estas palavras resistiram, cresceram e fizeram-se amplas, maiores que uma folha
de papel, maiores que as mordaças, maiores que os riscos. Homens e mulheres
pegaram no nome do semanário e elevaram-no. Eles que construíram as palavras
que nos mostraram todo um tempo e tantos lugares. Estas palavras são as de
António Paulouro, são as de Fernando Paulouro Neves, serão as minhas, serão as
dos jornalistas e colaboradores que ao longo de décadas as tornaram vivas e
precisas, intensas, celebrantes e indignadas (…). São daqueles que de longe as
elevaram e as fizeram gritar por uma região. Sim; gritaram-se palavras no
papel, gritaram gente que sofreu. Gritaram gente que sorriu. Foram – mesmo
quando amordaçadas, mesmo quando suspensas – e continuarão a ser palavras
vibrantes.
São palavras apenas, dirão. Não, não são. São lugares, são o
fundo da noite eterna da mina, o campo lavrado de sol a sol, as mãos ásperas
que amanham os dias íngremes, o sorriso da esperança, a desesperança do
infortúnio. Somos nós, são a Beira, são Portugal, são o Mundo. Estas palavras
são lugares onde cabe a nossa memória e onde cabe o nosso futuro. Foi esta
longa cadeia que se iniciou a 27 de Janeiro de 1946, que passou por tanta gente
e lugares, que nos trouxe até aqui, caro leitor.
São palavras, tantas, de tanta gente, de brilhantes
tradutores da realidade para o papel impresso. A efeméride não é lugar para
eles, nem para nós, nem para os que virão.
Porque são palavras, muitas.
Eternas. “
No alvoroço das palavras, das suas palavras, a força das
palavras de Nuno Francisco.
Quito Pereira