O TI´ JOÃO …
Naquele espaço, junto da austera Sé de Castelo Branco,
olhamos a praça. Um local airoso, de casas caiadas e modestas. Também do
pequeno comércio de proprietários à porta de mãos atrás das costas, na espera
da entrada do cliente apetecido. E acolá, naquela fileira de habitações de
tetos baixos, uma pequena entrada de portadas verdes. É ali a taberna do Ti´
João. Lá dentro, o pequeno compartimento é escuro. Um balcão corrido e acanhado
e uma prateleira onde repousam algumas garrafas de vinhos e licores. Também um
busto de barba e faces rosadas na recriação de Rafael Bordalo Pinheiro numa
pose sugestiva e uma inscrição na base: SE
QUERES FIADO TOMA !!!. E, do lado de lá
do balcão, um homem. Um homem já de idade simpática, de baixa estatura num
rosto bondoso e bonacheirão. A barriga é proeminente e vai falando como
estivesse cansado. Fala baixo, a medir bem as palavras, como se tudo o que
dissesse tivesse o rótulo de confidencialidade. Naquelas tardes de verão, por
vezes eu entrava naquele seu mundo. O café ou a ginjinha obrigatória para dois
dedos de amena conversa. O Ti´João taberneiro, para além de ganhar a vida a
vender copos de vinho, tinha também no folclore o amor de quem gostava das
voltas e reviravoltas da dança. E foi nos ensaios do Rancho Folclórico de
Juncal do Campo que o conheci. Apesar de leigo na matéria, cedo percebi que era
um homem que sabia daquela vertente da cultura popular. Nos ensaios era
perfeccionista e repetia as modas e as danças até à exaustão. Pese o seu
coração mole, era respeitado por cantadores e dançadores. E pelo grupo de
tocadores. Nunca o tambor, a concertina, o reco – reco ou a pandeireta se rendiam
no esforço que era exigido pelo Ti` João. E foi assim que tive uma simpatia
crescente por ela. Sempre que passava junto ao seu pequeno estabelecimento em
tardes de calor, era obrigatório entrar e conviver com um homem simples e cordato,
grande na sua dimensão humana e de fiel seguidor das tradições culturais de um
povo que devem ser preservadas. Falava-me sempre com entusiasmo nas deslocações
do grupo a festivais de folclore e dizia-me no meio de mais um brinde de uma
taça de vinho branco ou de uma aguardente – velha que eu sempre fazia questão
de pagar:
- Amanhã, no Ladoeiro, vamos entrar a todo o gás e arrasamos
com a concorrência …
E eu, já na soleira da porta, lá lhe ia dizendo:
- Pois amigo João, com a “Dança da Tranca” vamos rebentar com
eles …
Então ele ria e eu a acenar - lhe partia …
Quito Pereira
SE QUERES FIADO... Não sei se sabes Quito, esta imagem foi publicada pela primeira vez num jornal humorístico o ANTÓNIO MARIA. E porque é que o Rafael Bordalo Pinheiro deu esse nome à publicação: é que o chefe do governo era um tal, de nome completo, António Maria Fontes Pereira de Melo, que ficou conhecido para a história apenas pelos seus apelidos.
ResponderEliminarObrigado pela informação histórica ...
EliminarUm texto que através das conversas com o TI'JOÃO, podemos concluir que também o folclore te ocupou parte do tempo em Salgueiro do Campo.
ResponderEliminarRancho de Juncal do Campo. Realmente andei metido naquelas lides a pedido da direção do grupo. Modéstia à parte, dei um impulso no sentido do grupo conhecer novos horizontes e começou a atuar em todo o país. Recordo o dia em que foram ao Algarve e no fim de semana seguinte a Trás os Montes ...
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