quinta-feira, 17 de agosto de 2023

BAR DOS DIREITOS-TEXTO DE RUI FELÍCIO

BAR DOS DIREITOS 

Numa das minhas recentes visitas a Coimbra, dei uma volta pelos Gerais, passeei pela Via Latina e quedei-me durante largos minutos ao cimo das escadas de Minerva, comendo com os olhos a paisagem em frente, com o velho Mondego a correr calmamente lá em baixo.
Recuei o olhar e varri com a vista os telhados do casario que desce a encosta.
Imaginei-me muitos anos antes, naquele mesmo sitio, de capa e batina, pasta debaixo do braço, absorvendo a beleza da paisagem.
Debrucei-me sobre as grades, olhei a rua em baixo e confrangi-me com a degradação em que se encontrava o antigo Colégio da Trindade.
Tentei localizar a tasca do Pratas. Só vi portões fechados...
Atravessei lentamente o pátio da Universidade em direcção à Porta Férrea. 
Já cá fora ,olhei demoradamente a porta das Letras, recordando as belas colegas de outros tempos que por ela saiam e entravam constantemente, alegrando com os seus risos juvenis o negrume das capas negras. 
Contornei a Biblioteca Geral, desci junto à Filantrópica Académica e voltei na rua à direita, mais abaixo. 
Onde estava a tasca do Pratas, ou melhor dito, o Bar dos Direitos? Nada, tudo fechado! Perguntei a um velho que, apoiado numa canadiana, vinha subindo devagar o empedrado da rua, se a tasca já não existia.
 Confirmou-me que de facto já tinha fechado há uns anos.
Muitos se lembrarão que a Faculdade de Direito era a única que não tinha bar ou espaço de convívio para os estudantes. Era aquela tasca que pomposamente se assumia como o nosso Bar.
Tratava-se de um pequeno espaço, de não mais que cinquenta metros quadrados, as paredes decoradas com restos de capa e batina, ali deixados, como recordação, pelos nóveis doutores no dia da sua formatura e depois do rasganço da praxe. 
Como eu gostava de lá ter voltado a beber um copo de vinho e olhar a imagem tosca do meu colega Santo António empoleirado no altar espetado na parede da tasca, orgulhoso nas suas eternas fitas vermelhas.
   Rui Felício

 

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