Naquele domingo de verão, corro entre velhos olivais e campos
de cultivo ressequidos à míngua da água
reparadora. Ao meu redor, oiço o ruído de um silêncio perturbador. Caí para
fora de mim. Caí para fora do mundo. Caí para fora da Vida.
Olho o amontoado de casas e de telhados que me espreitam
naquele povoado plantado no limbo do nada. O cantar da água que corre numa
ribeira, é o som apaziguador de um violino numa sinfonia de angústias.
Deixo a aldeia no estertor da sua existência, agora que as
suas gentes partiram. Aquele vazio espacial, aquele caldo de solidão, mais não
é que um pesadelo feito de ausências. Um encadeado de poemas feitos do nada e
de ninguém.
Subo então ao céu. Arrasto-me por uma estrada estreita com
penhascos fundos que me estendem as garras afiadas, num hino à hostilidade.
O caminho estreito,
impede-me de voltar para trás. Sôfrego, trepo a montanha apavorado, na procura
de um cais salvador.
Lá em cima, naquele cocuruto de mundo, olho em redor e só
vislumbro montes austeros e ténues fios brancos que lhes riscam os dorsos
descarnados. São caminhos e são mistérios. Afinal o infinito existe.
Sentado num regato de pedra, inquieto, oiço o sibilar brando
do vento e sinto-me trespassado de medos, naquela terra de ninguém.
Parto montanha abaixo, na procura de uma amarra robusta que
me prenda à Vida e ao Mundo.
Na noite morna, olhando as luzes da cidade, sou assaltado de
dúvidas existenciais. Um turbilhão de pensamentos, leva-me ao desencanto e à
constatação de uma realidade crua de um outro país que é o meu.
Desfolho, lentamente, o livro da poesia do nada e de ninguém.
Um livro de páginas brancas, ausente de palavras ditas e
escritas que talvez nem façam sentido. Só o silêncio avassalador, poderá ser
prefácio de um manual de poemas breves, feitos do nada e de nadas.
Poemas do Nada, mas com muito para pensar!
ResponderEliminarIngrenal, na Beira Baixa, hoje desertificada, com um número muito escasso de resistentes, foi o mote deste pequeno texto. Quase me atrevo a dizer que só lá mora o vento. O mesmo país, uma outra realidade de um interior que definha. Que futuro para a zona raiana?
EliminarTexto bem I(E)ngrenado com a marca do teu cunho pessoal a que já nos habituaste.
ResponderEliminarEsta zona agora tão desertificadas e da qual outros apontamentos já nos transmitistes e que continuam na tua memória! Um período da tua vida que viveste e conviveste com gente triste e amargurada de que um dia talvez ninguém restará para "contar como foi" a história dessa aldeia...
E, no silêncio profundo, escutam-se maravilhas!
ResponderEliminarÉs um poeta de prosas, Quito.