"Ao Domingo era dia de banho. Não é que não me lavasse nos outros dias, mas a falta de energia eléctrica e água canalizada, obrigavam a ter alguma parcimónia nesses luxos higiénicos. A bacia, enorme, já estava atestada com água aquecida ao lume, e a grande panela, preta de fuligem, estava também cheia, e ali à mão, para “a última passagem”. Usava um pedaço de sabão azul e shampoo de ovo Palmolive, penso eu, (um luxo recente e cuja saqueta tinha de dar para todo o mês). Depois vestia roupa lavada cheirando a Clarim, e seguia para o Terreiro da Fonte, a ver “como paravam as modas”… A canalha juntava-se ali a par com os adultos que preguiçavam, e comentavam a beatitude de quem saía da missa, ao mesmo tempo que abordavam as incidências dos bailaricos do dia anterior e a previsão do jogo de futebol no Vale do Fojo, no início da tarde. De vez em quando, aparecia um amigo com uma bola e logo se começava um desafio de futebol, mas apenas reproduzindo marcações de canto, adaptando por baliza a porta da Capela do Espírito Santo. Sim, depois de tomar o banhinho, nada como transpirar um pouco para colocar tudo no devido lugar… Do fim da missa à hora de almoço era um ápice, e aos poucos o Largo ia ficando vazio de gente, porque a canja e a galinha “atestada” com batatinha assada e arroz, já esperavam na casa de cada um…bem, nem sempre, mas às vezes lá calhava..." in Memórias & Inspirações
José Passeiro
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