segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

SABIA QUE O AERÓDROMO DE COIMBRA ESTEVE PARA SER ONDE ERA O CAVALO SELVAGEM!...

...então leia a história contada no Livro "O CALHABÉ DO MEU TEMPO" por FERNANDO ROVIRA

 A ABORTADA CONSTRUÇÃO DO AERÓDROMO DE COIMBRA NO PLANALTO DA QUINTA DA CHEIRA
  
  A I Grande Guerra mostrara as enormes potencialidades da aviação, não só da militar, mas também da chamada aviação civil, ao nível das ligações a grande distância, deixando adivinhar que o avião seria o transporte no futuro revolucionaria por completo a vida do homem.
      A ideia da construção dum aeródromo já vinha de trás, mas um acréscimo de entusiasmo foi trazido pelo episódio da aterragem que fez em Coimbra, pela 1ª vez, o biplano Vila Nova, pertencente à esquadrilha República da nossa aviação militar, pilotado por Sarmento de Beires e mecânico João Costa, num voo de preparação da famosa viagem Lisboa-Macau que os mesmos aviadores realizaram em 1942. Na falta de aeródromo, a intenção dos aviadores era aterrar na Quinta da Várzea, a montante da ponte, mas devido às irregularidades do terreno, que se apresentava na altura cultivado de milho, tiveram os aviadores que optar pelo leito do rio, o que custou algumas pequenas avarias no biplano que o obrigaram a permanecer ali vários dias a fim de ser reparado.
      O acontecimento, por insólito na cidade, atraiu milhares de pessoas à Ínsua dos Bentos e ao areal do rio, tendo os conhecidos fotógrafos Tinoco e Rasteiro feito algumas fotografias que estiveram vários dias expostas nas vitrinas da Tabacaria Crespo. Estávamos em vésperas dos grandes voos transcontinentais, alguns deles levados a cabo por portugueses, como o de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, que fizeram a travessia aérea do Atlântico pela primeira vez, e os de Sarmento de Beires que, além da ligação Lisboa-Macau, fez a travessia do Atlântico Sul, e de Humberto Cruz, oficial-aviador natural de Coimbra, que em 1930 efectuou com Carlos Bleck a viagem Lisboa-Guiné-Angola-Lisboa e veio a participar, já na década de 30, noutra importante viagem a Timor-Macau-India Portuguesa e regresso.
     Algumas cidades de muito menor importância que Coimbra, já então tinham ou estavam em vias de ter, os seus aeródromos, e Coimbra, como quase sempre foi acontecendo ao longo dos tempos, estava a deixar-se ficar para trás. Felizmente, há “sempre alguém que resiste”, e vem para a frente dar a cara à luta. E nisto, temos de reconhecer que a imprensa, os jornais de Coimbra, estiveram na primeira linha do combate. Foi esse o momento em que se começou a pensar mais sèriamente  no assunto, gerando-se um movimento que em pouco tempo aglutinou muita gente entusiasmada na procura de um terreno para o aeródromo, tendo à cabeça a Sociedade de Defesa e Propaganda de Coimbra. Convinha que não fosse muito distante da cidade e, claro está, que fosse plano, de modo a se evitarem grandes e dispendiosas movimentações de terras, mas, ao mesmo tempo, suficientemente amplo (600 por 600 metros), com fraca arborização ao redor e não ser demasiado ventoso.
      Um terreno situado no Picoto dos Barbados “ na borda da estrada do Dianteiro” foi rejeitado por um oficial aviador que ali foi proceder a um exame no local. Este obedecia a todos os requisitos, apenas com um senão: não tinha as dimensões julgadas necessárias; um segundo, situado na margem esquerda, junto à Quinta da Torre, cujo proprietário, o lente de Medicina e grande escritor Silva Gaio, o ofereceria, caso viesse a ser aprovado, pelas mesmas razões, ou semelhantes às do Picoto, também esta segunda alternativa viria a ser abandonada. Restava, pois,  última, o enorme planalto constituído pela Quinta da Cheira, o olival onde se veio a construir o Bairro Marechal Carmona, hoje Norton de Matos, e o Cascalhal ou CAVALO SELVAGEM, muito nosso conhecido de por ali termos passado parte da nossa juventude.
      Em 1930, um oficial aviador tentou aterrar no Cascalhal sem o conseguir, porque duas ou três oliveiras o impediram. No ano seguinte, outro avião militar sobrevoou o local para estudar as condições oferecidas pelo espaço. As opiniões convergiram: entradas magníficas, abrigadas dos ventos.
      Em 1933, o capitão Esteves que fez a primeira viagem aérea a Luanda, em 6 de Setembro de 1928, esteve no local a estudar o terreno que, antes dele, já fora escolhido  pelo aviador Carlos da Cunha e Almeida.
      O facto de os proprietários dos terrenos, os advogados Fernando Lopes, António Bourbon e alguns outros pedirem 15$oo por metro quadrado, preço exorbitante para a época, juntamente com a incúria da Câmara que foi fechando os olhos às construções sem licenciamento na Quinta da Cheira, porventura consequência de uma mudança de atitude em relação ao local por ela aprovado para localização do aeródromo, conduziram ao abortamento desta terceira opção, tanto mais que em Janeiro e Fevereiro de 1935 apareceu exposto numa das montras dos Armazéns do Chiado um projecto de urbanização do Calhabé, assinalando a construção dum núcleo populacional, que se chamaria Bairro dos Aviadores nos terrenos antes escolhidos para aeródromo. Enfim, impediu-se que ali aterrassem aviões e quis dar-se a quem ao longo dos anos pugnou pela ideia um desenxabido rebuçado. Aviadores sem aviões?
Só por humor! E do mais negro…

      A problemática da escolha de terreno vai manter-se em banho.maria por alguns anos ainda, mas o aeródromo não foi esquecido. Um jornalista, de seu nome Humberto Cruz, o mesmo nome do glorioso aviador conimbricense, que também foi aviador e como o seu homónimo um entusiasta da aviação, moveu, a partir de 1933, uma luta se tréguas no seu modesto jornal bairrista A Voz do Callhabé em favor da causa, até que a Junta Distrital de Coimbra, presidida por Bissaya Barreto, deitou mãos à obra, tendo-se então optado por CERNACHE. Foram compradas algumas dezenas de propriedades, antes de, em 10 de Março de 1940, o major Humberto Pais, aos comandos do TIGER nº 146 da Força Aérea ali ter aterrado, numa pista de 900 metros. A inauguração do aeródromo teve assim lugar em 15 de Julho do Mesmo ano.

5 comentários:

  1. Interessante, mesmo muito interessante, esta passagem de Coimbra de outros tempos. Li com curiosidade e prazer. E já agora, pela mão de Fernando Rovira relembrar gente da aviação e não só.

    Bom apontamento Fernando Rafel. Parabéns ...

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  2. Excelente texto, me deu a conhecer uma história interessante. Só como curiosidade, o Advogado Fernando Lopes, foi o Padrinho do casamento dos meus pais.

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    1. Ainda na Rua da Guiné moraava junto a mim um sobrinho dele o meu amigo Fernando Lopes

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  3. Nao sabia da ligacao do Bairro a aviacao ,gostei de saber e gostei da historia que este texto nos conta .

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