RECORDAÇÕES DE MENINA
A Mariana pôs, ao ombro, o sacho
Compensando o peso com uma mão
Enquanto, na outra, sustinha a cesta
E, com o seu tão habitual despacho,
Saiu palmilhando o caminho do “tchão”,
Em passada miudinha, mas bem lesta
Não tardaria o toque das Trindades.
Ainda, era preciso ir à fonte
E fazer mil e uma actividades
Antes do sol se pôr lá no horizonte
Volta com a cesta cheia de renovo
Retira algumas folhas de nabiça,
Aparta os “retaços” para a vianda,
Depois de ver se havia algum ovo
Coloca o portado no galinheiro,
Mede, a palmo, a porquinha roliça
E sobe as escaleiras, mas desanda,
(Lembra-se que tem umas voltas a dar)
Terá de arranjar “caraba” primeiro,
De quem queira e possa ir ajudar
A acarretar o feno do lameiro
Lá sai ela, novamente apressada,
Entra na casa da Pepa da ti Neves,
No curral do ti Zé Ramos e da Bei
Num afã de passos afoitos e leves
Ainda vai ver do ti António Lei…
Ouve as Avé-Marias, à chegada,
Psina-se e ora com muita devoção
É a hora de acender a candeia,
Emparelhar uns gravetos ao tição
Atear o lume e fazer a ceia
Quando o sol raiou, de manhãzinha,
Já Mariana provava a merenda
Que iria levar para o lameiro
Tinha metido no meio da cozinha
O açafate com toalha de renda
Pratos de esmalte branco, do louceiro,
Talheres guardados para a altura
Barranhão, para o caldo de “baginas”
“Tchouriça” de ossos tradicional
As rodilhas e “paninhos” com fartura
Uns tantos copos e malgas pequeninas
Tudo, como era o habitual!
O seu Toino, acartara-lhe a lenha
Com que cozera as carnes e feijão,
Para os de casa e quem quer que venha
À faina do lameiro, dar uma mão.
Comera uma falha de pão e queijo
Que engoliu com um copito de vinho
Deu à Mariana um alegre beijo
E desceu à loja a jungir as vacas
Para se meter, depressa, a caminho
Com forquilhas, ancinhos, nagalhos, sacas…
Mariana tardou a findar a lida
Pois queria fazer tudo com esmero
Agradecer, da melhor forma devida,
Com ostentação e algum exagero,
Na comida que levaria ao “tchão”
Aos amigos que a vinham ajudar
A enfeixar e acarretar os fenos
Desde os lameiros até ao palheiro,
Que, embora fosse obra de somenos
Não era menos digno de gratidão
Davam, no campanário, as onze horas
Blusa rameada cingida à cintura
Saia de godés e avental franzido
Rosto rosado cor de maçã madura
A Mariana lá vai, sem mais demoras
Calcorreando o caminho comprido
Com a mãe e a comadre a seu lado
Levando à cabeça o açafate
Tão primorosamente organizado
Como pelo arraial da “Sacraparte”
Foi uma festa a chegada das três
O realejo do Toino deu o mote
A cantoria seguiu em desgarrada
E todos acorreram a tomar vez
Em redor duma mesa improvisada
E, ali, se ajeitavam em magote
Partilhando as sopas do barranhão
Ou enchendo a sua malga pequena
Que, cada qual seguravam na mão
Numa liberdade alegre e plena
E havia de tudo um poquenino:
“Tchouriça d’ ossos” e da outra também,
Farinheira e farinheiro cozidos
Queijos de leite de vaca e caprino
Presunto bem curado, como convém,
Copos de vinho vezes e vezes enchidos
Não faltaram as “bicas” doces da festa
Aquela água cristalina da fonte
A força que a alegria empresta
Mesmo que o suor escorra da fronte!...
Georgina Ferro
A Mariana pôs, ao ombro, o sacho
Compensando o peso com uma mão
Enquanto, na outra, sustinha a cesta
E, com o seu tão habitual despacho,
Saiu palmilhando o caminho do “tchão”,
Em passada miudinha, mas bem lesta
Não tardaria o toque das Trindades.
Ainda, era preciso ir à fonte
E fazer mil e uma actividades
Antes do sol se pôr lá no horizonte
Volta com a cesta cheia de renovo
Retira algumas folhas de nabiça,
Aparta os “retaços” para a vianda,
Depois de ver se havia algum ovo
Coloca o portado no galinheiro,
Mede, a palmo, a porquinha roliça
E sobe as escaleiras, mas desanda,
(Lembra-se que tem umas voltas a dar)
Terá de arranjar “caraba” primeiro,
De quem queira e possa ir ajudar
A acarretar o feno do lameiro
Lá sai ela, novamente apressada,
Entra na casa da Pepa da ti Neves,
No curral do ti Zé Ramos e da Bei
Num afã de passos afoitos e leves
Ainda vai ver do ti António Lei…
Ouve as Avé-Marias, à chegada,
Psina-se e ora com muita devoção
É a hora de acender a candeia,
Emparelhar uns gravetos ao tição
Atear o lume e fazer a ceia
Quando o sol raiou, de manhãzinha,
Já Mariana provava a merenda
Que iria levar para o lameiro
Tinha metido no meio da cozinha
O açafate com toalha de renda
Pratos de esmalte branco, do louceiro,
Talheres guardados para a altura
Barranhão, para o caldo de “baginas”
“Tchouriça” de ossos tradicional
As rodilhas e “paninhos” com fartura
Uns tantos copos e malgas pequeninas
Tudo, como era o habitual!
O seu Toino, acartara-lhe a lenha
Com que cozera as carnes e feijão,
Para os de casa e quem quer que venha
À faina do lameiro, dar uma mão.
Comera uma falha de pão e queijo
Que engoliu com um copito de vinho
Deu à Mariana um alegre beijo
E desceu à loja a jungir as vacas
Para se meter, depressa, a caminho
Com forquilhas, ancinhos, nagalhos, sacas…
Mariana tardou a findar a lida
Pois queria fazer tudo com esmero
Agradecer, da melhor forma devida,
Com ostentação e algum exagero,
Na comida que levaria ao “tchão”
Aos amigos que a vinham ajudar
A enfeixar e acarretar os fenos
Desde os lameiros até ao palheiro,
Que, embora fosse obra de somenos
Não era menos digno de gratidão
Davam, no campanário, as onze horas
Blusa rameada cingida à cintura
Saia de godés e avental franzido
Rosto rosado cor de maçã madura
A Mariana lá vai, sem mais demoras
Calcorreando o caminho comprido
Com a mãe e a comadre a seu lado
Levando à cabeça o açafate
Tão primorosamente organizado
Como pelo arraial da “Sacraparte”
Foi uma festa a chegada das três
O realejo do Toino deu o mote
A cantoria seguiu em desgarrada
E todos acorreram a tomar vez
Em redor duma mesa improvisada
E, ali, se ajeitavam em magote
Partilhando as sopas do barranhão
Ou enchendo a sua malga pequena
Que, cada qual seguravam na mão
Numa liberdade alegre e plena
E havia de tudo um poquenino:
“Tchouriça d’ ossos” e da outra também,
Farinheira e farinheiro cozidos
Queijos de leite de vaca e caprino
Presunto bem curado, como convém,
Copos de vinho vezes e vezes enchidos
Não faltaram as “bicas” doces da festa
Aquela água cristalina da fonte
A força que a alegria empresta
Mesmo que o suor escorra da fronte!...
Georgina Ferro
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