A ROTUNDA FACE DE DEUS
Deus?
Pessoalmente,
Não O conheço!
Jamais Lhe vi a face!
Preto?
Branco?
Amarelo…?
Quantos olhos?
Quantas orelhas?
Meus olhos varrem o firmamento,
Minhas mãos apalpam o espaço…
Todavia, em vão,
Não O encontro.
E, no entanto,
Tudo me fala d’Ele.
Leio nas linhas e entrelinhas
De bíblias e alcorões,
Das teodiceias,
Das escatologias,
Das resmas de escritos
De crentes e agnósticos
Das aparições
E outras revelações
E só me falam duma voz
Grave e solene,
Poderosa!
Da face,
Nem um traço,
Um reflexo!
Os crentes,
Fervorosos,
Aguardam piamente
O etéreo momento
De O verem
Com os olhos da alma!
Os artistas
Deram-lhe rosto humano,
O rosto do juízo final!
Na miraculosa,
Na deslumbrante complexidade da Criação,
A conhecida e a desconhecida,
Por que imperativo teria o Criador
Este humano frontespício???
Abri desmesuradamente
Os olhos,
Remexi aturadamente
O espírito,
Devassei todos os horizontes
Possíveis,
Imaginários,
Bisbilhotei todos os recantos
Todos os escaninhos,
Apontei telescópios e microscópios,
Mirei quadros e esculturas,
Monumentos e demais arquitecturas
E comecei a entender
O selo da divindade.
O rotundo,
Circulante,
Rolante,
Coleante,
Enleante…
O ancho,
O abrangente.
Os astros e os seus movimentos,
A gota de água caindo na flor,
As ondas do mar enrolando na praia,
As velas pandas ao vento,
Os animais e os frutos da terra,
As aves do céu,
Os peixes do mar…
A ovular universalidade da procriação,
Os rituais da fecundação,
O diligente cirandar da abelha,
As danças corteses e nupciais
O gentil balancear da flor…
A rotunda imagem da gestação.
E o arredondado esmero
Dessa diva obra-prima:
A mulher?!
As caprichosas ondas dos cabelos,
O cintilante arredondado dos olhos,
O elíptico desenho dos lábios,
A sigmática leveza dos ombros,
A cósmico arredondado dos seios,
As lascivas ondulações das ancas e da cintura,
O suavíssimo torneado das pernas,
Meneando,
Ondeando,
Requebrando…
O sacrossanto,
O esférico esplendor
Da maternidade…
Os círculos do afecto:
O beijo,
O abraço…
O generoso,
O infinito
Amplexo do amor!
Meu Deus,
Em tanta beleza,
Em tanta justeza,
Em magnanimidade tamanha,
Extasiados,
Os meus olhos divisam
O rotundo da Tua face!
Páscoa de 2021
Ninguém o Vê mas toda a gente chama por Ele.
ResponderEliminarUm abraço.
Excelente. Esta métrica desalinhada lembra-me os primeiros poemas do Ary (Aristóteles visita da casa de minha avó).
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