sábado, 4 de dezembro de 2021

O CAMIONISTA Texto de KITO PEREIRA

                                                   O CAMIONISTA…




 Aquilo não era uma camioneta, era um transatlântico! Grande, ocupava toda a berma da faixa de rodagem, mesmo em frente à Farmácia “Vaz Pereira”. Ele, o camionista de pesados, desceu vagarosamente daquele castelo com rodas e a coxear entrou no Café “ Portas da Serra”. Então, perguntou se ainda havia almoço e disseram-lhe que não, que a cozinheira já tinha ido embora. Mas ofereceram-lhe uma sandes de chouriço - era o que havia. Ele, o motorista de pesados, lá foi dizendo que um simples pão não lhe amainava a fome. Depois, lá se foi queixando, de garrafa de cerveja na mão: - Ando com azar, fui mordido por um cachorro no Castelejo. Saí da camioneta e o rafeiro veio direito a mim e filou-me numa perna … logo agora que fiz uma surpresa à minha mulher e comprei dois bilhetes de avião para o Funchal a festejar o nosso aniversário de casamento … E continuou o monólogo: - O Senhor aí, que é da Farmácia, diga-me lá se o antibiótico que trago neste saco pode ser tomado com vinho … pode … não pode ? Vou folheando o “Correio da Manhã” que estava colocado em cima do balcão e vou lendo distraidamente as presumíveis trafulhices de um autarca lá do norte e atiro-lhe: - Não sou médico, mas sempre ouvi dizer que não se deve beber vinho enquanto se toma um antibiótico … - Não?! … então o Senhor acha que eu vou passear com a “patroa” para a terra do Jardim, para beber água do “Fastio” ? … tenha lá santa paciência mas isso é que não, eu tenho que beber, pelo menos, dois copinhos de tinto, um almoço e outro ao jantar … Fico a olhar lá para fora, a admirar o tabuleiro da abentesma com rodas. Ele, o motorista de pesados, diz-me de já fez um milhão de quilómetros ao volante do paquiderme. Sem acidentes, gaba-se … Despedi-me dele e parti. Mas fiquei a pensar naquela prosa da água do “Fastio”. Não cheguei a perceber se ele se estava a referir ao líquido propriamente dito ou se era uma alfinetada mordaz ao monarca da ilha. Acho que vou viver o resto da minha vida confrontado com este dilacerante dilema … Kito Pereira

2 comentários:

  1. Kito:
    Quando saio das Caldas da Rainha para Salir de Matos (estrada da Benedita), sou obrigado a passar pelo meio do que eram as ÁGUAS DO ARIEIRO. Encerrada aquela importante nascente, a unidade industrial é hoje o depósito regional para a Estremadura e o sul, das Águas do Fastio.
    Não sei se está a perceber!

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