O VOTO
Eu não gostaria
De ser voto!
Causa-me uma impressão tremenda,
Um susto,
Vê-lo desaparecer num ápice
Pela greta medonha
Duma urna preta.
É assim como que atirar terra
Sobre o caixão dum defunto!
Fazem-no de cores várias:
O rosa, o amarelo, o azul, o verde…
E o branco,
Tudo em tons suaves
Para animar a soturna
Solenidade do evento.
É que o voto carrega
As nossas convicções,
As nossas expectativas,
As nossas esperanças,
As nossas frustrações
Os nossos equívocos,
As nossas desilusões.
É que o voto, também,
Fora do proscénio,
Nos camarins,
Nas catacumbas dos palcos
Onde a obscuridade
Ofusca a lei e a ética,
Leva tratos de polé
Ao desencadear a avidez
Dos malabaristas do poder.
E quando, contas feitas,
O fumo do “habemos governo”
Supor-se-ia de um níveo resplendor,
Na imponente abóbada da catedral
Tremula o negro esburacado
Duma espécie de bandeira de piratas.
Se eu pudesse,
Urnas cristalinas de transparência
E os votos todos negros,
Feitos com as ardósias
Da nossa escola velhinha
E, com giz bem branquinho,
Em letras garrafais,
Escrever-se-iam as palavras
Mais estranhas
Mais abjectas
Nas mentes do politiqueiral,
Os dono disto tudo:
Educação, Democracia,
Seriedade, Sabedoria,
Dignidade, Solidariedade,
Fraternidade, Humanidade.
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