Faltam uns minutos breves para as sete horas da manhã. Abro
as vidraças da sala de par em par e sento-me confortável a olhar o mar. Um Atlântico
de várias tonalidades que o sol lhe empresta, desfila perante os meus olhos
ainda pouco despertos. É um mar - chão, que mais se assemelha a uma planície
sem fim, habitado aqui e ali por pequenos barcos de pesca.
Sim, navios da faina, porque uns binóculos potentes ajudam a
satisfazer quaisquer dúvidas. Estão estáticos nessa paciência milenar de
aguardar que as redes tragam o peixe que é o sustento das mãos calejadas que
puxam as artes. E ele, o mar sereno, parece compreender este protocolo de
sobrevivência, parecendo estático também.
Da varanda onde habita uma brisa fresca, olho a nascente. Há
uma bola de fogo que se ergue no céu banhando Portimão, que ao longe aparece
como um amontoado de casas incarateristicas, aglomeradas sem critério.
Depois olhar a cidade. Esta cidade. Daqui do alto da
Freguesia de São Gonçalo e à medida que a luminosidade se torna mais intensa e
esbarra contra o branco das paredes do casario, Lagos acorda da sua letargia.
Há uma labuta que recomeça para muitos.
Fixo os olhos na porta lateral cinco
andares abaixo da minha varanda e vejo dezenas de cestos em plástico com bolos
e pão acondicionados, que seguem em carrinhas para as muitas pastelarias da
cidade. É um correr frenético, com hora marcada.
Porém, igualmente com a organização de quem há muitos anos
executa este circuito de distribuição de pão e doçaria. Sem correrias mas
atempadamente, as carrinhas vão e voltam para novo carregamento. Para outros,
os padeiros no rigor das suas fardas e barretes brancos, é o fim de mais uma
noite de trabalho que começou às duas da madrugada. Agora que a missão está
cumprida, o corpo reclama cama de tanto esforço e do calor intenso dos fornos
de cozedura.
Hoje, primeiro dia do mês de Setembro, a cidade forra-se de
calor. Mas tudo está mais sereno. Muitos dos que demandaram esta cidade do
barlavento algarvio partiram Alentejo acima, já num suspiro de saudade. Acabaram
as praias pejadas de gente. Acabaram os restaurantes das mesas marcadas pelos
ansiosos a salivar por um robalo vistoso, que viram entre pedras de gelo numa
vitrina apelativa de peixe vindo da lota.
E até um Dom Sebastião vaidoso, amua por falta de admiradores pendurados de máquina fotográfica a tiracolo. O verão começa a dar sinais de fadiga e, na Marina de Lagos, a lufa – lufa dos barcos turísticos na demanda dos golfinhos abranda significativamente.
Da esplanada do
“Amuras” vou observando todo aquele movimento de gente retardatária ou dos que
apostaram em Setembro para férias e que de coletes salva – vidas amarelos,
procuram uma aventura de mar. Mas já são menos. Muito menos do que aqueles
rebanhos de gente de Julho e Agosto, que disputam um lugar num barco de recreio,
como num qualquer restaurante se acotovelam por uma mesa para beber sofregamente
um jarro de vinho branco bem fresco e comer uma travessa atafulhada de
apetitosas sardinhas.
Com a debandada, a cidade de Lagos reconcilia-se consigo
própria. Abraça os seus habitantes de gema e rejubila dos seus heróis
históricos. E eu, resistindo à chamada coimbrã, também teimo em ainda por aqui
ficar, quando os outros veraneantes já partiram. Porque sei que Lagos no seu inventário
de afetos, percebe que eu sou num universo de quase seis décadas, uma espécie
de filho pródigo que vai e volta. E por isso, com desvelo, também me abraça
carinhosamente como se eu fosse um seu dileto filho. Um filho gerado pelas
marés. Um filho emprestado pelo mar.
Quito Pereira
O Quito esteve cá de manhã pelo Samambaia! Quem o disse? Sabes bem quem foi!
ResponderEliminarQuem havia de ser!
Deves ter madrugado para levar pão fresco para o café da manhã.
Cheguei às 11HOO à pastelaria.
Sempre pensei em lá te encontrar...mas desta vez preferistes não deixar arrefecer o pão para o barrar com manteiga!
OK! Tudo bem!
Mais logo não vais faltar ao bate-papo para contares mais alguma coisa do bem bom da estadia em Lagos.
A primeira parte já li e gostei!
Já se sabia que o dia 1 de Setembro por todas as praias trás a debandada dos turistas de verão.
Este ano quiseste comprovar se ainda era assim e por lá continuaste mais 2 ou 3 dias de Setembro. Fizeste bem. Concluíste que foi o mesmo de outros anos!Claro e o regresso foi mais calmo!
E foi óptimo abrir o computador e encontrar esta postagem. Estava a pensar o que vinha eu aqui meter...É que os assuntos cada vez são mais raros!Desta vez safei-me!
Obriga
Maravilha. Beijos
ResponderEliminarEntão agora que há menos gente, menos barulho, menos empurrões, menos bichas (filas para os brasileiros), mais lugares de estacionamento, mais lugares nos restaurantes é que tu vens embora!!!... Não te percebo!... Viste os pescadores da tua janela e nem foste à lota ver o que trouxeram! Com os binóculos até podias escolher o peixe da tua janela e depois era só esperar pelos barcos.
ResponderEliminarBom regresso! Cá vos esperamos.
Fica por aí, Quito.
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