UM TEXTO MUITO DEVOTO …
Eu pecador me confesso. Sou um devoto do leitão. Do leitão da
Bairrada, entenda-se. A culpa foi do meu amigo Rainho, que cedo me meteu nas
lides porcinas. Lá, na catedral da Bairrada, encontrei o meu porto de abrigo. É
no “Típico” da Dona Etelvina que vou rezar. Vou em compungido recolhimento,
benzendo-me já arrependido do meu pecado da gula. As funcionárias da casa que
ali trabalham, já me conhecem de ginjeira. Com um sorriso sarcástico,
perguntam-me se quero comer pescada cozida. E eu, no meu estatuto de cliente
ofendido, lá lhes vou dizendo que pode ser a deslavada pescada e para beber que
me sirvam um pacote de leite “Gresso”, de penitência. Modéstia à parte, eu acho
que merecia uma estátua na Mealhada. Não uma estátua equestre, mas montado em
cima de um porco, com uma faca e um grafo em cada mão e um guardanapo ao
pescoço, por causa das nódoas da gula. Um dia subornei o meu filho Gonçalo para
as lides e fiz mal. Também amante do garfo e da faca, cedo ficou mais devoto
que eu. Não foram precisas muitas lições de catequese para ficar beato. Tão beato
que uma noite em que a Académica jogava em Aveiro num jogo que não podia perder
– a sina do costume – lá fomos em romagem com mais um batalhão de aficionados
do pontapé na bola. Então aconteceu uma coisa rara – marcámos um golo . Um tal
Gyano, que andava em Coimbra a tirar o curso da universidade da vida, deu uma cabeçada
na bola que só parou no fundo da baliza dos de lá e ganhámos o jogo. No
regresso e com a alegria, fomos os dois a correr para a Mealhada já noite
adentro, com os ponteiros de relógio a bater a meia-noite. Lá chegados, o
entusiasmo esmoreceu. Tudo fechado e até nos apeteceu chorar. Andámos a bater
de porta em porta, até que encontrámos um restaurante que nos recebeu e,
sozinhos na sala espaçosa, demos azo aos nossos apetites porcinos. Pelo
exposto, admito que os leitores estejam inclinados de que eu mereço mesmo uma
estátua na Mealhada. Já agora, exijo também uma rua com o nome do meu filho,
que eu cá nestas coisas de religião sou um pai muito atento e extremoso …
Kito Pereira
O próximo domingo também é de voto.
ResponderEliminarmontado em cima de um porco com um GRAFO em cada mão. Esta do "grafo" é que eu não percebo...
ResponderEliminarSó não faz sentido porque é só um grafo. Se fossem vários, seria um polígrafo.
EliminarManuel da Cruz, troquei as letras. Deve ser da graduação do vinho. Abraço ...
EliminarA foto é mesmo na sala de refeições do restaurante Típico.
ResponderEliminarSei da tua preferência pelo Típico que vem dos teus tempos de infância.
Já lá fomos todos várias vezes e sempre bem servidos.
A tua amizade com a Dona Etelvina é de velhos conhecidos.
... Também ando com muita vontade de sair do isolamento, para comer um tambaqui assado na brasa, com farofa de banana, Baião-de-dois e vinagrete. Mas só vontade mesmo, porque, por estas plagas, o "bicho tá pegando", infelizmente.
ResponderEliminarPor aqui não está melhor, Mamãe. O nosso Sistema Nacional de Saúde é que tem dado conta do recado... mas já atingiu o limite.
EliminarUm bom texto, com muita piada e, claro, bem escrito.
ResponderEliminarNão me lembrei de propor uma estátua tua, na Mealhada, mas vou falar com o Presidente da Câmara e com a minha prima que é vereadora. Depois te direi.
Tem que ser feita em frente ao TÍPICO...
ResponderEliminarIsso, mesmo !!! Uma estátua frente ao Tipico com pompa e circunstância. Tu diriges a banda, o Paulo toca ferrinhos e o Alfredo faz o discurso ...
EliminarARREMATADO!
Eliminar