(foto net)
O tilintar das chaves. O barulho
metálico do rodar da fechadura. Depois o escancarar da porta da casa vazia.
Entrar na sala de estar ampla e na penumbra, olhar a lareira moribunda a
reclamar a chama viva dos rigores invernais. Revisitar os móveis dispostos pela
casa com critério e os velhos sofás companheiros de tantos invernos.
Absorto e
especado no meio da sala, venerar um quadro da cidade onde nasci. Tudo é
silêncio. Um silêncio que inquieta. É como se as paredes brancas e desnudadas quisessem
falar comigo, num ressentimento de ausência.
Passo a passo, em cadência lenta, percorro
o meu lar de outrora. Em cada dependência, em cada quarto, um sopro de vida.
Esta ou aquela moldura pendurada numa parede. Esta ou aquela fotografia de eventos
ternos. Porque elas – as fotografias – são documentos de momentos felizes que
se querem perpetuar no Tempo.
Naquele compartimento de janelas largas, viradas
para uma avenida airosa da cidade, já não se vislumbra o riso sonoro e puro das
crianças. Cresceram e partiram para a vida. Ficaram as lembranças.
Deixaram - me, como legado, um póster
de basquetebol americano e um quadro encaixilhado de Chopin. Fico bloqueado nos
meus pensamentos de um passado. Oiço uma melodia breve a bailar - me no
espírito. Apuro o ouvido e tenho uma certeza: é Frédéric. Talvez o polaco,
deambulando pelas ruas frias do Campo Santo de Père - Lachaise na velha e bela
Paris, entenda o meu estado de espírito e se aproxime de mim. A música plena de
harmonia, como bálsamo das dores da alma.
Ali, naquela varanda alta e de
vista abrangente, olho os telhados da cidade. O emaranhado de prédios que se
acotovelam num aglomerado ordenado e estético, numa cópia pálida de La Défense,
da cidade de mil encantos. E os jardins floridos que resistem às gélidas
madrugadas, pelo cuidado das mãos sensíveis dos seus tratadores.
E longe, lá longe, nesta manhã
fria mas esplendorosa de sol invernal ausente de brumas calmas e misteriosas, o
perfil clamoroso e austero da Estrela e do Moradal. E a cabeleira de neve alva
como um bolo de noiva, no topo serrilhado do perfil das montanhas plasmadas num
céu azul e sereno, a dar a esta Beira profunda um toque de Eternidade …
Quito Pereira
Quantas lembranças poéticas. Enquanto lia, as ideias se alinhavam em minha mente, e pude "visualizar" o cenário que tão bem descreveste.
ResponderEliminarPois voltaste ao teu Castelo, mas que de Branco neste tempo pouco ou nada tenha. Quem sabe se só uma neve pura e branca por lá passou de fugida.
ResponderEliminarA nostalgia dos tempos passados...É natural o que sentiste nessa casa agora vazia!
Mas a vida assim o quis, ficam as lembranças! Mas agora revives mais intensamente outras lembranças, estas de infância, que começaram no teu Choupal....
Moradal...Choupal tudo é sentimental!
Sim Quito! Este é um texto teu, tal e qual!
Claro, a casa vazia deixa-te nostálgico. Foram muitos anos e as lembranças estão vivas, a fazer-te escrever este poema de saudades
ResponderEliminarEstás em forma, Quito. Abre aço!
ResponderEliminar...pois mas este sentimentalão não é d´aço!
EliminarAbre-te e vamos no domingo almoçar...
Eu chamar-lhe-ia um poema à saudade que só o Quito sabe escrever. Lindo.
ResponderEliminarO Quito acerta sempre. Aparece com um dos seus escritos quando entro de férias, só que não podia deixar de aqui vir.
Agora vou hibernar.
Acabei de pedir ao Quito para não voltar a hibernar...
EliminarNesse caso, boa hibernação mas vê se não demoras muito. As ajudas de custo não se ganham a hibernar...
Chico não hibernes demais...diz lá que tens mais que fazer...
EliminarAguardamos-te rápido
Abraço
Estiveste a armazenar nostalgia?
ResponderEliminarComo sempre, presente a poesia na tua prosa.
Toma lá aquele abraço e vê se não voltas a hibernar!
Boa prosa.
ResponderEliminarA vida é feita de uns ir e voltar.
ResponderEliminarRegressar, muitas vezes, é bom!
Acredito que não deve ser fácil, mas é assim a vida!...
ResponderEliminarAbraço!