sexta-feira, 8 de abril de 2016

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 (foto net)

O tilintar das chaves. O barulho metálico do rodar da fechadura. Depois o escancarar da porta da casa vazia. Entrar na sala de estar ampla e na penumbra, olhar a lareira moribunda a reclamar a chama viva dos rigores invernais. Revisitar os móveis dispostos pela casa com critério e os velhos sofás companheiros de tantos invernos. 

Absorto e especado no meio da sala, venerar um quadro da cidade onde nasci. Tudo é silêncio. Um silêncio que inquieta. É como se as paredes brancas e desnudadas quisessem falar comigo, num ressentimento de ausência. 

Passo a passo, em cadência lenta, percorro o meu lar de outrora. Em cada dependência, em cada quarto, um sopro de vida. Esta ou aquela moldura pendurada numa parede. Esta ou aquela fotografia de eventos ternos. Porque elas – as fotografias – são documentos de momentos felizes que se querem perpetuar no Tempo. 

Naquele compartimento de janelas largas, viradas para uma avenida airosa da cidade, já não se vislumbra o riso sonoro e puro das crianças. Cresceram e partiram para a vida. Ficaram as lembranças.


Deixaram - me, como legado, um póster de basquetebol americano e um quadro encaixilhado de Chopin. Fico bloqueado nos meus pensamentos de um passado. Oiço uma melodia breve a bailar - me no espírito. Apuro o ouvido e tenho uma certeza: é Frédéric. Talvez o polaco, deambulando pelas ruas frias do Campo Santo de Père - Lachaise na velha e bela Paris, entenda o meu estado de espírito e se aproxime de mim. A música plena de harmonia, como bálsamo das dores da alma.


Ali, naquela varanda alta e de vista abrangente, olho os telhados da cidade. O emaranhado de prédios que se acotovelam num aglomerado ordenado e estético, numa cópia pálida de La Défense, da cidade de mil encantos. E os jardins floridos que resistem às gélidas madrugadas, pelo cuidado das mãos sensíveis dos seus tratadores.


E longe, lá longe, nesta manhã fria mas esplendorosa de sol invernal ausente de brumas calmas e misteriosas, o perfil clamoroso e austero da Estrela e do Moradal. E a cabeleira de neve alva como um bolo de noiva, no topo serrilhado do perfil das montanhas plasmadas num céu azul e sereno, a dar a esta Beira profunda um toque de Eternidade …

Quito Pereira             


12 comentários:

  1. Quantas lembranças poéticas. Enquanto lia, as ideias se alinhavam em minha mente, e pude "visualizar" o cenário que tão bem descreveste.

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  2. Pois voltaste ao teu Castelo, mas que de Branco neste tempo pouco ou nada tenha. Quem sabe se só uma neve pura e branca por lá passou de fugida.
    A nostalgia dos tempos passados...É natural o que sentiste nessa casa agora vazia!
    Mas a vida assim o quis, ficam as lembranças! Mas agora revives mais intensamente outras lembranças, estas de infância, que começaram no teu Choupal....
    Moradal...Choupal tudo é sentimental!
    Sim Quito! Este é um texto teu, tal e qual!

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  3. Claro, a casa vazia deixa-te nostálgico. Foram muitos anos e as lembranças estão vivas, a fazer-te escrever este poema de saudades

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  4. Estás em forma, Quito. Abre aço!

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    1. ...pois mas este sentimentalão não é d´aço!
      Abre-te e vamos no domingo almoçar...

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  5. Eu chamar-lhe-ia um poema à saudade que só o Quito sabe escrever. Lindo.
    O Quito acerta sempre. Aparece com um dos seus escritos quando entro de férias, só que não podia deixar de aqui vir.
    Agora vou hibernar.

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    1. Acabei de pedir ao Quito para não voltar a hibernar...
      Nesse caso, boa hibernação mas vê se não demoras muito. As ajudas de custo não se ganham a hibernar...

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    2. Chico não hibernes demais...diz lá que tens mais que fazer...
      Aguardamos-te rápido
      Abraço

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  6. Estiveste a armazenar nostalgia?
    Como sempre, presente a poesia na tua prosa.
    Toma lá aquele abraço e vê se não voltas a hibernar!

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  7. A vida é feita de uns ir e voltar.
    Regressar, muitas vezes, é bom!

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  8. Acredito que não deve ser fácil, mas é assim a vida!...
    Abraço!

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