terça-feira, 25 de abril de 2017

ENCONTRO COM A ARTE - POESIA

Que é feito do Mês de Abril?

Que é feito do mês de Abril
que nos circulou pelas veias?
Que é feito das ruas cheias
quando o sol era um balão
e andava tudo ao contrário
as estátuas vinham ao chão
e o sonho era o nosso horário?

Que é feito do mês do sonho
quando o sonho era concreto
e tinha forma de casas
portas abertas
e pão,
quando o sonho que sonhámos
era um filho colectivo
parido pela multidão!

Foi então
num país
de repente sem fronteira
foi a feira
a desgarrada
foi o espanto dos abraços
na arquitectura sem margem
duma terra a conquistar

Foi um país que acordou
com planícies no olhar
e a concertina a tocar
dentro do peito.
             Que é feito do mês de Abril?
Soldados a quem dissemos:
amigos eh! pá! irmãos
operários que descobriram
um espaço para além das mãos
e as mulheres trabalhadeiras
que rasgaram seus vestidos
para as bandeiras de alegria
com que Abril foi envolvido.
            Que é feito do mês de Abril?

Foi um país impaciente
que de pé se quis em flor
foi o riso das guitarras
cansadas de choro e dor
foi a alegria fabril
foi a força da razão.
             Não esqueças o mês de Abril!
             Não esqueças que és multidão!

José Fanha
           

4 comentários:

  1. Não se esqueçam o mês de Abril!
    Jamais se esqueçam, que a partir daí se abriu...
    A porta para o "Dia da Liberdade"!
    Jamais se esqueçam daqueles dias de muitos...
    Submetidos a um regime ditatorial,
    Dias que não vos deixaram saudades.
    Apenas lembrem-se de dias assim,
    Como alerta para evitarem tamanha
    ... Crueldade!


    (Eu)

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  2. As Portas que Abril abriu
    José Ary dos Santos

    Era uma vez um país
    onde entre o mar e a guerra
    vivia o mais infeliz
    dos povos à beira-terra.
    Onde entre vinhas sobredos
    vales socalcos searas
    serras atalhos veredas
    lezírias e praias claras
    um povo se debruçava
    como um vime de tristeza
    sobre um rio onde mirava
    a sua própria pobreza.

    Era uma vez um país
    onde o pão era contado
    onde quem tinha a raiz
    tinha o fruto arrecadado
    onde quem tinha o dinheiro
    tinha o operário algemado
    onde suava o ceifeiro
    que dormia com o gado
    onde tossia o mineiro
    em Aljustrel ajustado
    onde morria primeiro
    quem nascia desgraçado.


    Era uma vez um país
    de tal maneira explorado
    pelos consórcios fabris
    pelo mando acumulado
    pelas ideias nazis
    pelo dinheiro estragado
    pelo dobrar da cerviz
    pelo trabalho amarrado
    que até hoje já se diz
    que nos tempos do passado
    se chamava esse país
    Portugal suicidado.

    Ali nas vinhas sobredos
    vales socalcos searas
    serras atalhos veredas
    lezírias e praias claras
    vivia um povo tão pobre
    que partia para a guerra
    para encher quem estava podre
    de comer a sua terra.

    Um povo que era levado
    para Angola nos porões
    um povo que era tratado
    como a arma dos patrões
    um povo que era obrigado
    a matar por suas mãos
    sem saber que um bom soldado
    nunca fere os seus irmãos.

    Ora passou-se porém
    que dentro de um povo escravo
    alguém que lhe queria bem
    um dia plantou um cravo.

    Era a semente da esperança
    feita de força e vontade
    era ainda uma criança
    mas já era a liberdade.

    Era já uma promessa
    era a força da razão
    do coração à cabeça
    da cabeça ao coração.
    Quem o fez era soldado
    homem novo capitão
    mas também tinha a seu lado
    muitos homens na prisão.

    Esses que tinham lutado
    a defender um irmão
    esses que tinham passado
    o horror da solidão
    esses que tinham jurado
    sobre uma côdea de pão
    ver o povo libertado
    do terror da opressão.

    Não tinham armas é certo
    mas tinham toda a razão
    quando um homem morre perto
    tem de haver distanciação

    uma pistola guardada
    nas dobras da sua opção
    uma bala disparada
    contra a sua própria mão
    e uma força perseguida
    que na escolha do mais forte
    faz com que a força da vida
    seja maior do que a morte.

    Quem o fez era soldado
    homem novo capitão
    mas também tinha a seu lado
    muitos homens na prisão.

    Posta a semente do cravo
    começou a floração
    do capitão ao soldado
    do soldado ao capitão.

    Foi então que o povo armado
    percebeu qual a razão
    porque o povo despojado
    lhe punha as armas na mão.

    Pois também ele humilhado
    em sua própria grandeza
    era soldado forçado
    contra a pátria portuguesa.

    Era preso e exilado
    e no seu próprio país
    muitas vezes estrangulado
    pelos generais senis.

    Capitão que não comanda
    não pode ficar calado
    é o povo que lhe manda
    ser capitão revoltado
    é o povo que lhe diz
    que não ceda e não hesite
    – pode nascer um país
    do ventre duma chaimite.

    Porque a força bem empregue
    contra a posição contrária
    nunca oprime nem persegue
    – é força revolucionária!

    Foi então que Abril abriu
    as portas da claridade
    e a nossa gente invadiu
    a sua própria cidade.

    Disse a primeira palavra
    na madrugada serena
    um poeta que cantava
    o povo é quem mais ordena.

    E então por vinhas sobredos
    vales socalcos searas
    serras atalhos veredas
    lezírias e praias claras
    desceram homens sem medo
    marujos soldados «páras»
    que não queriam o degredo
    dum povo que se separa.
    E chegaram à cidade
    onde os monstros se acoitavam
    era a hora da verdade
    para as hienas que mandavam
    a hora da claridade
    para os sóis que despontavam
    e a hora da vontade
    para os homens que lutavam.

    Em idas vindas esperas
    encontros esquinas e praças
    não se pouparam as feras
    arrancaram-se as mordaças
    e o povo saiu à rua
    com sete pedras na mão
    e uma pedra de lua
    no lugar do coração.

    Dizia soldado amigo
    meu camarada e irmão
    este povo está contigo
    nascemos do mesmo chão
    trazemos a mesma chama
    temos a mesma ração
    dormimos na mesma cama
    comendo do mesmo pão.
    Camarada e meu amigo
    soldadinho ou capitão
    este povo está contigo
    a malta dá-te razão.

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  3. "CONTINUAÇÃO DO POEMA DE ARY DOS SANTOS
    "As portas que Abril abriu~

    Foi esta força sem tiros
    de antes quebrar que torcer
    esta ausência de suspiros
    esta fúria de viver
    este mar de vozes livres
    sempre a crescer a crescer
    que das espingardas fez livros
    para aprendermos a ler
    que dos canhões fez enxadas
    para lavrarmos a terra
    e das balas disparadas
    apenas o fim da guerra.

    Foi esta força viril
    de antes quebrar que torcer
    que em vinte e cinco de Abril f
    ez Portugal renascer.

    E em Lisboa capital
    dos novos mestres de Aviz
    o povo de Portugal
    deu o poder a quem quis.

    Mesmo que tenha passado
    às vezes por mãos estranhas
    o poder que ali foi dado
    saiu das nossas entranhas.
    Saiu das vinhas sobredos
    vales socalcos searas
    serras atalhos veredas
    lezírias e praias claras
    onde um povo se curvava
    como um vime de tristeza
    sobre um rio onde mirava
    a sua própria pobreza.

    E se esse poder um dia
    o quiser roubar alguém
    não fica na burguesia
    volta à barriga da mãe.
    Volta à barriga da terra
    que em boa hora o pariu
    agora ninguém mais cerra
    as portas que Abril abriu.

    Essas portas que em Caxias
    se escancararam de vez
    essas janelas vazias
    que se encheram outra vez
    e essas celas tão frias
    tão cheias de sordidez
    que espreitavam como espias
    todo o povo português.

    Agora que já floriu
    a esperança na nossa terra
    as portas que Abril abriu
    nunca mais ninguém as cerra.

    Contra tudo o que era velho
    levantado como um punho
    em Maio surgiu vermelho
    o cravo do mês de Junho.

    Quando o povo desfilou
    nas ruas em procissão
    de novo se processou
    a própria revolução.

    Mas eram olhos as balas
    abraços punhais e lanças
    enamoradas as alas
    dos soldados e crianças.

    E o grito que foi ouvido
    tantas vezes repetido
    dizia que o povo unido
    jamais seria vencido.

    Contra tudo o que era velho
    levantado como um punho
    em Maio surgiu vermelho
    o cravo do mês de Junho.

    E então operários mineiros
    pescadores e ganhões
    marçanos e carpinteiros
    empregados dos balcões
    mulheres a dias pedreiros
    reformados sem pensões
    dactilógrafos carteiros
    e outras muitas profissões
    souberam que o seu dinheiro
    era presa dos patrões.

    A seu lado também estavam
    jornalistas que escreviam
    actores que se desdobravam
    cientistas que aprendiam
    poetas que estrebuchavam
    cantores que não se vendiam
    mas enquanto estes lutavam
    é certo que não sentiam
    a fome com que apertavam
    os cintos dos que os ouviam.

    Porém cantar é ternura
    escrever constrói liberdade
    e não há coisa mais pura
    do que dizer a verdade.

    E uns e outros irmanados
    na mesma luta de ideais
    ambos sectores explorados
    ficaram partes iguais.

    Entanto não descansavam
    entre pragas e perjúrios
    agulhas que se espetavam
    silêncios boatos murmúrios
    risinhos que se calavam
    palácios contra tugúrios
    fortunas que levantavam
    promessas de maus augúrios
    os que em vida se enterravam
    por serem falsos e espúrios
    maiorais da minoria
    que diziam silenciosa
    e que em silêncio fazia
    a coisa mais horrorosa:
    minar como um sinapismo
    e com ordenados régios
    o alvor do socialismo
    e o fim dos privilégios.

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  4. Continua e termina na postagem do Quito Um Tal Pimentel

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