quarta-feira, 31 de março de 2021
COIMBRA D´OUTROS TEMPOS
segunda-feira, 29 de março de 2021
VOLTAR …
Que linda está a cidade! Banhada de um sol primaveril neste
inicio de tarde. Paro o carro junto a casa, depois de quilómetros de uma viagem
em que andei por entre “quintais”, porque o itinerário complementar oito se
encontra interrompido a partir de certo troço. Agora que cheguei, nem tempo tenho de recolher as malas da
bagageira. Alguém num português arrevesado chama por “Eurico”. Olho e no
passeio junto a uma pizzaria, vejo um homem alto, com um chapéu de aba larga na
cabeça, a sua imagem de marca – é o Evis Andriguetti. Vamos ao encontro um do
outro e ultrapassámos as barreiras sanitárias e o abraço veio num impulso.
Também a minha companheira de viagem que o saúda com amizade e estima – uma
estima que é recíproca. Depois foi uma avalancha de palavras. Foram uns longos
catorze meses de interregno e o Evis precisava de um ombro amigo. Fala de todos
os que, como ele, vivem da restauração nestas horas de aflição. E relata
com orgulho que mantém os seus empregados e que estão todos no mesmo
barco. Mal para um, mal para todos é o lema.
Sempre gostei deste italiano. É um homem culto, que ama a sua
Itália. Franco na palavra e sem a viscosa hipocrisia das sociedades de hoje.
Quantas e quantas vezes se sentava na nossa mesa ao jantar no seu restaurante e
nos falava da sua empresa e das suas preocupações. É um homem educado e cordato, o Evis. Transparente na sua forma de estar na
vida. É um italiano de afetos, que chora quando se lembra do seu país que uma
tem uma arena em Verona, gôndolas em Veneza e uma surpreendente Torre de Piza.
E eu gosto das pessoas transparentes e dos homens que têm a capacidade de
chorar.
Logo ali ficou acordado que iria lá buscar o almoço e o
jantar. E os dias que passássemos na cidade albicastrense, ali procuraríamos o
repasto. De uma forma jocosa, comprometi-me a experimentar todo as “pastas” do
menu com uma “Pomodoro e bazílico” como pontapé de saída. E uma pizza “Saporita”
para a minha companheira de viagem.
Já a noite vai fechada e entro para um pátio como Evis me
recomendou. E, numa porta envidraçada, bati . É ali que os clientes vão agora
levantar as refeições que levam para casa. E um grande cartaz escrito em letra
de imprensa diz num tom quase ditatorial – aguarde aqui. Mas eu não precisei de
aguardar. A Zeza, companheira do Evis, logo me reconhece e mesmo por detrás da
máscara lhe percebo um sorriso nos olhos e diz – me para entrar. Sinto que
estou em casa. Falamos depressa, interrompendo-nos um ao outro numa catadupa de
palavras. Das palavras que precisavam de ser ditas. O Marco, fardado de branco
e com uma enorme pá, vai metendo as pizzas no forno a lenha e remata:
- Senhor Pereira, anteontem cá em casa lembrámo-nos da sua
cidade. O Hugo por uma qualquer razão falou da Académica e o nosso pensamento
foi logo para si …
Senti-me confortado. Mais de um ano depois, ainda sou
lembrado naquela casa. Desconforto sim, foi ver a sala de luzes apagadas e as
cadeiras e as mesas arrumadas a um canto. Olho contristado e em palavras
embrulhadas porque não me saem direito, digo à Zeza:
- Zeza, fui muito feliz nesta sala …
E ela, com um brilhozinho nos olhos como na canção de Sérgio
Godinho, responde-me com aquela sua força de uma lutadora da vida:
- E um dia voltará a ser …
Despedi-me daqueles amigos de uma vida e, com o saco da
comida na mão parti, embrulhado nas sombras da noite.
Kito Pereira
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA - BAIRRO NORTON DE MATOS - COIMBRA- FLORIDO
domingo, 28 de março de 2021
VINHA DOMINGO DE RAMOS....TEXTO DE GEORGINA FERRO
Vinha Domingo de Ramos e seguia-se a Semana Santa de oração, Via-Sacras, lamentações pelas noites adentro com as mulheres vestidas de luto, lenços pretos e xales pela cabeça, a chorarem a dor de Maria mãe de Jesus.
Na minha aldeia, logo nesse sábado de ramos, bem cedinho, ia-se ao campo procurar plantas silvestres floridas: um lindo ramo de alecrim, um raminho de rosmaninho começado a abrir, um ramo de pilriteiro com os pontinhos brancos a despontar... Levava-se à cerimónia da bênção dos ramos na Missa de Domingo e depois de ser aspergido com água benta, trazia-se para casa e guardava-se na loja dependurado da trave mestra . Só se iam retirar uns raminhos nos dias de trovoada e punham-se sobre as brasas enquanto se rezava a Santa Bárbara para que pedisse por nós a Deus e nos livrasse da trovoada.
No sábado, quando se ia colher o ramo, aproveitava-se a saída aos campos e apanhavam-se feixes de carqueja para esfregar bem o soalho de toda a casa, mochos, bancos e tudo que precisasse duma boa esfrega...
Toda a semana Santa era semana de limpeza profunda. Levavam-se as panelas de ferro à ribeira para serem bem areadas, trazia-se barro para barrar as chaminés enfarruscadas, acarretavam-se baldes e mais baldes de água do chafariz para tudo ficar "um asseio" para Domingo de Páscoa.
Pintavam-se as latas ou caldeiros que serviam de vasos para ornamentar as escaleiras e varandins com as malvas e begónias que tivessem aguentado a invernia....
A canalhita andava à coca das amigas com quem "engantchava" para as mandar rezar e ganhar-lhes as amêndoas. Eu não gostava nada disso porque tinha muito medo de perder e não ter amêndoas para dar. Mas achava graça à brincadeira de me esconder e aparecer de repente e de surpresa. O pior é que me viam sempre primeiro e eram elas que me mandavam rezar a mim. Com a minha avó e com a minha tia Maria é que era engraçado, porque elas perdiam sempre. Mal me levantava ia em bicos de pés e mandava-as logo rezar. Elas fingiam sempre uma enorme surpresa e no domingo de Páscoa lá tinha eu um cartuchinho com meia dúzia de amêndoas de meio tostão cada uma de sua cor. Que lindas eram!...
Georgina Ferro.
sábado, 27 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA Luis Garção
sexta-feira, 26 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA - COIMBRA - PRAÇ 8 DE MAIO -RUA VISCONDE DA LUZ
quarta-feira, 24 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA COIMBRA
ENCONTRO COM A ARTE- POESIA
A Laurinda chegou do lameiro
terça-feira, 23 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA - DE COIMBRA PARA O MUNDO
segunda-feira, 22 de março de 2021
ANIVERSÁRIO Dona Rosa Melo Pato
22-03-1929
Nesta data especial...
"Encontro de Gerações" deseja
MUITAS FELICIDADES!
PARABÉNS!
domingo, 21 de março de 2021
DIA MUNDIAL DA POESIA
DA POESIA
Tenho poemas como claridades matinais
Como o nascer do sol
Na bruma equidistante da planície.
Tenho poemas como trovões
Na noite mais inquieta
E mais escura dos teus gestos.
Tenho poemas macios
Como a palavra madura
No contorno dos teus seios.
Tenho poemas que rasgam
Como baioneta em guerra
No bico desta caneta.
O gosto é que manda
Com as palavras que escolho
Nas crinas que se levantam
Pelas brisas encrespadas
Pelas vozes mais secantes
Das tangentes madrugadas.
Ou pelas bocas que beijam
As maresias serenas
Das marés apaixonadas.
António F. Pina
sábado, 20 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA - PINCELADAS DO BAIXO MONDEGO
sexta-feira, 19 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA -OUTRO OLHAR SOBRE COIMBRA
quinta-feira, 18 de março de 2021
ALVOR
Da cidade de Lagos à alva praia de Alvor é um tiro de
carabina. Por uma estrada estreita vamos correndo devagar que o trânsito merece
precaução. Ali, do lado direito, encontramos o aeródromo de Portimão, paraíso
de paraquedistas e de pequenos aviões coloridos que nos fazem sonhar com o céu
azul sem limites. Depois, continuando a serpentear por estradas apertadas,
chegamos ao nosso destino – Alvor. Agora que os veraneantes partiram, arrumar o
carro e gozar de uma bela zona pedonal junto da ria de águas serenas e pequenos
barcos de turismo e recreio a balançar ao ritmo do dia calmo. Alguns turistas,
maioritariamente estrangeiros, sentam-se nas mesas debruçadas sobre a ria,
bebendo tranquilamente um café ou um sumo que preencha duas horas de lazer. Ali,
ali ao fundo, é uma zona de restaurantes. Cheira a peixe a ser confecionado em grandes
grelhas, e um enorme bando de gaivotas olha atentamente para o homem que
conhecem e que as costuma presentear com as vísceras do peixe amanhado a servir
aos clientes. As espectativas das aves não são em vão e um balde de tripas é
lançado para um terreiro junto à ria. Sentado num degrau de pedra, vou olhando
aquele festim e divirto-me com a algazarra das gaivotas que, em menos de nada,
comem o manjar que lhes foi oferecido. Depois, seguir rua acima. Olhar os
restaurantes vazios e ali, no meio daquela ladeira, um bar aberto sem clientes.
É escuro como negro é o avental de um homem alto que vai varrendo o chão de
sobrado, absorto a olhar para a vassoura. Naquela rua tudo seria silêncio, não
fosse de um dos restaurantes ouvir-se em alto registo o som dos Pink Floyd na
tentativa de chamar a clientela. Num cruzamento de ruas fico parado e vou avaliando
o ambiente. Acolá, o aglomerado de gente é maior e tenho alguma sensação de
insegurança. Rodopio e regresso ladeira abaixo ao encontro de amigos. Numa mesa
e a quatro, saboreámos o bom peixe que nos afirmam ser do mar e não de viveiro.
E para o degustar, nada como o som de um acordéon que vai alegrando as mesas
dos veraneantes. E não faltou uma referência musical à Beira Baixa e a Castelo
Branco, com aquela máxima popular de que quem viveu na urbe albicastrense não é
feliz noutra terra - talvez. Pelo menos o ilustre Amato Lusitano assinaria por
baixo o amor a essa bela cidade na rota raiana.
Kito Pereira
Cidade de Lagos, 12 de outubro de 2020
quarta-feira, 17 de março de 2021
ANIVERSÁRIO José Alvim
segunda-feira, 15 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - Pintura
domingo, 14 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA - COIMBRA NOTURNA
sábado, 13 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA TORRE UC
sexta-feira, 12 de março de 2021
BOM DIA NOS DÊ DEUS
Bom dia nos dê Deus.
Era assim a saudação matinal em cada encontro pela aldeia, só depois se trocavam umas palavras consoante a maior ou menor intimidade ou a pressa com que se ia.
No Verão, que os dias eram grandes, era quando havia menos tempo para conversar, a não ser na faina, que se fazia em comum, mas a azáfama era sempre tanta que nem dava para uma verdadeira conversa.
Naqueles longos serões de Inverno, isso sim é que eram longos "convesares". Depois da ceia, arredada a mesa, arrumada a loiça à luz do candeeiro, fiava-se o linho, tricotavam-se as meias e camisolas, degranava-se o milho, escolhiam-se os cornachos ao centeio... enquanto se contavam histórias e contos, se falava das dificuldades da vida, se davam e ouviam conselhos, se lembravam tarefas a cumprir e se recordavam os entes passados. Por eles se diziam orações e se rezava o terço com a meditação de mistério em mistério.
Aos domingos como não se devia trabalhar era dia de jogar às cartas, fazer dobras ou desenhos com um fio de lã ou guita a passar das mãos de um para outro, jogávamos à sardinha, a dizer lenga-lengas, adivinhas e provérbios.. e os serões não eram mais longos porque tinha que se poupar lenha não fosse acabar antes de findarem os dias de caramelo, assim como o petróleo do candeeiro que nem sempre havia moedas para se ir comprar. Até porque, se o lume tinha boa chama, baixava-se bem a torcida do candeeiro para poupar gastos. Nas casa mais pobrezinhas ( de autêntica miséria) e eram muitas, usava-se apenas a candeia para quebrar o escurecer do dia e eram bem mais curtos os serões. Se não fossem os verdadeiros afectos que uniam a nossa gente, quantas velhinhas viúvas, quantas pessoas doentes, morreriam à fome e ao frio! Mas tantas vezes ouvia dizer "quem menos tem é quem mais dá." Ou "quem dá, sempre tem".
Georgina Ferro
quarta-feira, 10 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA - COIMBRA-CHOUPALINHO
terça-feira, 9 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA -TURISMO UNIVERSIDADE DE COIMBRA-PAÇOS DAS ESCOLAS
segunda-feira, 8 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA COIMBRA E RIO MONDEGO E SEU ANTIGO AREAL (BASÓFIAS!
domingo, 7 de março de 2021
LEVASTE A CHUVA NOS BOLSOS...
LEVASTE A CHUVA NOS
BOLSOS …
Numa manhã de maio partiste para o Sono Eterno. Mereces esse
sono reparador pela tua alma inquieta e inconformada. Viveste num planeta que
não era o teu e numa galáxia que não era a tua, aprisionado pelas grilhetas de
uma sociedade que não te compreendia nem
te compreende. Vestiste na vida o preto carregado do luto. O luto do teu ser
atormentado. Derramaste pelos livros de poesia que escreveste o sentir da tua
rima negra. O desencanto e a descrença que se visitam e revisitam página a
página naquele labirinto de emoções pardas em que nos perdemos como náufragos
na procura de um porto de abrigo que não vislumbramos. Morremos contigo e
sentimo-nos levados pela tua mão pela diáspora do Universo e do Eterno.
Não te conheci nesta vida José António, mas queria. Queria
muito. Queria falar-te do teu pai. Queria dizer-te quanto ele significou na
minha infância Choupalina. Queria envolver-te a ti e a ele num abraço fraterno.
Mas sei que é impossível, pois tal como tu também ele partiu. Partiu cedo
quando ainda muito tinha a esperar da vida. Afinal a morte dos homens comuns, que
partem anónimos no rasto da cauda luminosa de um cometa. Mas tu Zé António, nunca
viveste amarrado ao cais da nossa existência opaca. Apenas emprestaste a este
mundo o corpo que assinalava a tua presença física, passeando por aí absorto e
ausente, trazendo contigo a chuva nos bolsos. Porque o teu espírito e a tua
alma nunca pisaram esta nau terrena do conformismo do nosso penar. A chuva que
levaste nos bolsos, talvez seja uma fonte de lágrimas. Lágrimas da tua
impotência em mudar o mundo, de vivermos em sociedade nas asas de um sonho
sempre inacabado. Sabes – ou talvez não
– quanto a tua família honrada e leal significou no meu passado remoto. Talvez
por isso, quando te li e reli, senti a necessidade de falar contigo estejas
onde estiveres. Foste para mim uma grande surpresa na genialidade da tua poesia.
O Cantar de um Homem culto e superior, desenraizado e distante, que é só
privilégio de todos os pensadores geniais. E que melhor forma terei para te
homenagear, do que navegar nessa barca de desconforto e de solidão interior,
remando contigo no alvoroço das tuas palavras cor da cinza - “ são horas de me
erguer e caminhar fora do túmulo das palavras no segredo desse lugar único em
que a escuridão da noite parece eterna claridade”.
Abraço – te, José António.
Kito Pereira
sábado, 6 de março de 2021
ENCONTRO COM A ARTE - FOTOGRAFIA-- Vista de Coimbra
sexta-feira, 5 de março de 2021
COIMBRA DE OUTROS TEMPOS -LAVADEIRAS DO MONDEGO- COIMBRA
quinta-feira, 4 de março de 2021
ANIVERSÁRIO Rui Barreiros
04-03-1946
Nesta data especial...
"Encontro de gerações" deseja
MUITAS FELICIDADES!
PARABÉNS!
quarta-feira, 3 de março de 2021
BORDA D´ÁGUA
1950 Novembro
O Borda d'Água, sim o Borda d'Água, ainda não havia televisão, ou rádio, nem sequer havia electricidade lá na aldeia, mas esse boletim anunciava fortes tempestades de vento, granizo e trovoada.
O ti Ferreira já fora ver as previsões, mas tinha uma encomenda para entrega e não podia falhar pois dera a sua palavra de honra ao comprador.
Depois do mata-bicho foi ter com a Felisbela do ti Júlio e com o Lau do ti Diamantino, com 10 e 11anos, respectivamente, e disse-lhes onde estavam os carregos para levarem. Ele iria à frente, se avistasse a guarda ou os carabineiros, voltaria atrás para os avisar. Tinham de ir pelo moinho do prado castelhano e descerem dali para Navas Frias. Era bem mais longe mas era mais fácil.
_ Levem a samarra e o xale de lã, não se esqueçam!...- pediu-lhes. - Cuidado com as escorregadelas! Se houver muitos trovões não se quedem debaixo dos carvalhos!
_ Sim, senhor!
_ Se virem a guarda escondam o carrego e continuem a andar com se fossem buscar as vacas ao lameiro, está bem?
_ Sim, senhor.
O ti Ferreira partiu e os garotos meteram um codorno de pão às bocas e foram em busca dos sacos do café para abalarem.
Ainda estavam a avaliar o peso da carga e já se ouvia o primeiro estrondo da tempestade que se avizinhava. A Felisbela tremia de medo, mas a mãe estava com as maleitas e não tinham dinheiro para os remédios. Ganhou alento, pôs a saca de sarapilheira às costas, cobriu-a com o xale. O Lau imitou-a e vestiu a velha samarra do avô, sobre o talego do contrabando, pôs a sua boina negra, puxou melhor os calcanhares das alpargatas e saíram. À porta, psignaram-se e, lado a lado, lá foram.
Os relâmpagos faíscavam o céu e o tremendo estrondo não durava muitos segundos a estremecer toda a terra.
As duas crianças caminhavam contra a força do vento, do terror e do peso das cargas e das roupas encharcadas.
No prado Castelhano, o Lau deu uma escorregadela pela laje abaixo e foi estatelar-se lá no fundo onde o regato se transformara em Ribeiro com velocidade louca. A Felisbela aventou-lhe um Ramalho. Mas nem ele se conseguia agarrar nem ela tinha força para o puxar. Deram gritos alucinantes de desespero e terror. E sem esperança já se entregavam à morte quando o tio António chegou com o seu cavalo e cordas.
No moinho havia um lumezito com as brasas mortiças e um tição quase apagado. O tio António trouxe mais umas pinhas que depressa se puseram a crepitar com as chamas a bailar ao ritmo da mó.
Os catraios continuavam a tremer...
Ao canto do lume uma velha cafeteira azul de esmalte começou a fumegar.
O moleiro pegou nas duas malgas que lá tinha e foi lavá-las com a água da chuva. Pegou num punhado de erva-de-São Roberto e atirou-o para a cafeteira. Procurou um poquenino de açúcar no fundo do açucareiro, mas não havia. Lembrou-se que tinha um frasco de geleia de marmelo e foi buscá-lo.
Os garotos não paravam de tremer e de espirrar, mas ali não havia roupa seca para vestirem. O tio António lembrou-se dos alforges do cavalo e da manta de trapos com que nos dias muito frios tapava a porta pelo lado de dentro....
Georgina Ferro
terça-feira, 2 de março de 2021
COIMBRA DE OUTROS TEMPOS
-Urinol
-Casa do funcionário que mudava as agulhas para os elétricos mudarem de direcção
-
Duas fotos enviadas por António Simões, morador no Bairro