quarta-feira, 24 de março de 2021

ENCONTRO COM A ARTE- POESIA



 A Laurinda chegou do lameiro

Deu por findo o afã da lavoura!
Como já era o seu costume,
Prendeu a vaca à manjedoura,
Amanhou uns galhos para o lume
Que foi poisar junto da lareira,
Tinha de ir à fonte primeiro!
Agarrou o cântaro de barro
Quase vazio, na cantareira,
Deitou o resto para um jarro
Embrulhou a menina no xale
Tapadinha até ao nariz
Não quer que a criança arrefeça
Lá vai de molídia à cabeça
A caminho do chafariz
Em passo leve como num baile!
Depois do cântaro ficar cheio
Vira a Laurinda de regresso
Chega a casa depõe a vasilha
Volve um banquinho do avesso
Conchega nele a sua filha
Dependura o xale usado
Que lhe causa um certo enleio
Afasta o tição, apanha a cinza,
Põe, de novo, o carvão arrimado...
Eis que surge o marido ranzinza
Traz um novo braçado de lenha
E um cepo a cair da mão
Pergunta com algum azedume
Se tem que ele acender o lume
Para aquecerem o serão
Ou esperam que a noite venha?!!!!
A Laurinda nem responde
Ainda mais apressa o cuidado
A que se dedica com afã
Sem deixar tempo desperdiçado
Desde o acordar pela manhã
Até que o dia se esconde
Arrima a panela ao lume
Descasca as batatas para a sopa,
Caldo escoado como de costume,
E puxa a mesa para a lareira
Põe-lhe a toalha e os paninhos
Talheres e pratos de esmalte
Verifica que nada mais falte
Aconchega dois ou três galhinhos
A avivar a chama da fogueira...

Georgina Ferro

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