Jesus - Menino
É Tempo de Natal. E lá, no interior do país, no dito Portugal
profundo, há nas zonas campesinas um respirar diferente. Uma paisagem dolente,
no seu diálogo mudo e ancestral com a natureza em silêncio. O fumo das chaminés
que se ergue lentamente em espiral no ar fresco do entardecer, é um sinal de
vida. Da vida que existe em aldeias empoleiradas em pequenos morros ou
aninhadas no fundo dos vales. Um manto de oliveiras que se estende por campos a
perder de vista, compõe uma paisagem bucólica em que, em alguns casos, apenas o
tilintar dos badalos ao pescoço dos rebanhos, fere a monotonia de um hino de
solidão. Lá, naqueles montes e vales esquecidos e de gente envelhecida, não se
discute o trepidante mundo de hoje. Nem as greves dos comboios, nem a greve dos
juízes, nem a greve de estivadores ou dos enfermeiros. Vive-se, apenas e só, do
instinto e do milagre de viver e de sobreviver. Mas, em cada casa singela, em
cada humilde lar, há sempre um Menino Jesus nas palhinhas deitado. Porque uma Criança
rodeada de pequenas lâmpadas de luzes vermelhas e azuis, mais não é que uma
imagem de paz, de concórdia e de fraternidade. Afinal, uma mensagem nobre dos
deserdados da vida. Não trocam a sua Fé profunda pela religião da ganância e do
dinheiro. Vivem na Santidade – seja lá o que isso for – de quem se levanta de
madrugada para dar alimentação ao gado, apanhar a azeitona das árvores com as
mãos enrugadas, e que comem o caldo ao crepitar da lareira no declinar do dia,
na companhia do Menino Jesus. Um quadro de simplicidade. Nestes dias de um
Tempo Natalício, o padre que tem nome de um Santo, percorre as várias aldeias
da região que conhece como as suas mãos, porque também ali nasceu. Sabe, melhor
do que ninguém, das angústias e das necessidades dos mais vulneráveis. Na
sua missão, que não se esgota em pregar a Palavra de Deus por montes e vales,
em capelas húmidas e escuras, o padre com nome de Santo procura na medida das
suas fracas possibilidades, minorar as carências dos mais pobres. Porque também
ele não nasceu em berço de ouro e a sua vida sempre foi e é de uma existência de
entrega aos outros. É o lar dos idosos da aldeia, que lhe lava a roupa e é ali
que toma as suas frugais refeições, que paga com o seu pequeno ordenado.
Esta é, ainda hoje, a realidade de uma parte de um Portugal
tão português, que honra mais que ninguém esta Quadra no Sentir da Devoção pelo
Seu Jesus - Menino, num cenário da pobreza despida da ambição e da viscosa hipocrisia
que mina a sociedade de hoje, e da intolerância que alastra em muitos
corações.
Talvez esta simples narrativa, seja um Conto de Natal.
Q.P.
Claro que é um conto de Natal, num excelente tezto.
ResponderEliminarRetrata bem ainda hoje como é viver o Natal em muitos locais do interior do País.
Um Natal como passei alguns até aos meus 13 anos!
Um abraço pós Natal a caminho das feats do ano Novo.
Belo conto de Natal,
ResponderEliminarObrigado Quito.
Lucinda
Um conto de Natal é sem dúvida.
ResponderEliminarDe um Natal que as novas gerações urbanas não conhecem nem provavelmente compreendem.
Numa descrição bucólica que José Régio não desdenharia.
Num contraponto à hipocrisia e ao consumismo citadinos que também Eça subscreveria na vertente de crítica social e do egoísmo que impera na nossa actual sociedade.
A matriz do Quito Pereira aqui evidenciada em toda a sua pujança .