terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

O INVERNO AMEDRONTAVA LÁ FORA...


"O inverno amedrontava lá fora….O vento rugia pelo vale de Eiras abaixo, e a chuva, copiosa, batia vigorosamente nas vidraças despidas de portadas ou estores. De vez em quando, um trovão mais forte, fazia com que a minha mãe levantasse o olhar para o tecto e murmurasse uma pequena ladainha a Santa Barbara. Depois de um dia de trabalho duro na cidade, ela cozinhava para nós, , sempre na companhia do único objecto electrónico que existia na casa. O pequeno transístor a pilhas preto, onde as vozes de Heathcliff, Edgar, Catherine e Isabella ressoavam contando-nos o desenrolar dramático do Monte dos Vendavais, romance de Emily Bronte, cujo enredo a (nos) deliciava e a (nos) obrigava a parar, de vez em quando, para escutar os momentos cruciais da novela… Eu limpava cuidadosamente a chaminé de vidro do candeeiro a petróleo, com uma velha folha de jornal, e sentava-me à mesa, com um ouvido na rádio e um olho no livro de aventuras mais recente que me tinham emprestado…quando acabávamos de jantar já se ouvia o programa "Quando o telefone toca" e eu só pensava como era possível à rádio, ter todos os discos das canções requeridas pelos ouvintes. Devagar, a noite avançava…e eu, já deitado e sonolento, ouvia ainda a mãe a lavar, varrer, cozer e passar roupa a ferro e preparar tudo para mais um dia de trabalho e de escola que se aproximava num fechar e abrir de olhos..." - in Memórias & Inspirações

Texto de  José Passeiro

5 comentários:

  1. Penso mesmo que todas as mães, aquelas que, de fato são "mães", tiveram a mesma atuação, àqueles tempos idos.
    Hoje, na correria da vida, a maioria das mães não tem a felicidade de conviver esses momentos com seus filhos.
    Foram tão bons...que passados tantos anos ainda podemos nos lembrar deles.

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  2. Belo texto do meu amigo das caminhadas que nos transporta para o nosso tempo de crianças. Tempos que coisas simples eram suficientes para nós sentirmos felizes.
    Tempos que mais nos ligavam a nossas mães, que sendo "domésticas" de profissão, mais tempo nos dedicavam... Até mesmo no adormecer os seus afazeres domésticos nos embalavam para um sono profundo.

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  3. Que belo texto depois de ler os dois comentarios acima,não tenho nada mais a acrescentar

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  4. Na última caminhada, Domingo, já tive o prazer de dizer ao nosso companheiro José Passeiro que acho importante o registo das memórias. É importante, para uma maior consciência da identidade e permitirá aos vindoutos conhecerem melhor a vida das pessoas em geral, e não só de "personalidades". Parabéns.

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