A
Rosalva, trintona, toda em forma de violão, morava na pacata cidadezinha de
Belterra (aliás, nem cidade ainda era, mas sim um município da Cidade de
Santarém, no Estado do Pará). Casada com (predestinado) Cornélio, adorava as
músicas e cantores da Jovem Guarda, especialmente do Erasmo Carlos e Roberto
Carlos.
Cornélio
cercava a Rosalva como galo quando está querendo meter o esporão na galinha. Um
ciúme exacerbado. Incontrolável. Via, em qualquer pessoa do sexo masculino, um
rival em potencial. E nem precisava que o pretenso rival tivesse um corpo
esculpido em academia. Para Cornélio, um homem era um homem e, portanto, perigo iminente de perder
a amada Rosalva para algum concorrente.
A mente
do Cornélio vivia em polvorosa. Quando saiam, seja para passearem ou irem a
missa, até o assovio de um passarinho ele já cogitava ser alguém assoviando
para a Rosalva. Afinal, ela chamava a atenção (e inveja) até da mulherada, com
aquele corpo todo enrijecido, pernas alongadas e um bumbum que parecia “moldado”
para a esposa do Cornélio.
Quando
Cornélio não podia acompanhar Rosalva, não permitia que ela fosse sozinha a
qualquer lugar, ainda que a companhia fosse filha da vizinha, a Nanda, por quem
o Cornélio não tinha muita simpatia. Mas, afinal, era mulher.
Na cabeça do
Cornélio, mulher não era perigo.
E a
Rosalva? Como ela mesma se intitulava, uma “santa”! Só se fazia acompanhar,
para qualquer lugar, com o marido ou com a Nanda, amiga desde sempre.
Cornélio,
casado há quase 15 anos com Rosalva, não teve um emprego seguro, em que
precisasse ter um horário definido para labutar. Por conta disso, ausentava-se
de casa conforme a necessidade do serviço que se lhe aparecia. Não saia de
casa, porém, sem antes se certificar de que Rosalva iria permanecer em casa, e,
caso saísse, já deixava negociado com Nanda para acompanhar a mulher.
E Nanda
nunca recusou ou se fez de rogada, quando necessária (e desnecessária!) sua
companhia à Rosalva. Em muitas das vezes, até se oferecia para tal “serviço”,
embora não cobrasse do Cornélio absolutamente valor algum para a “função”. Era tudo por prazer, como ela costumava dizer.
E
Cornélio, nessas ocasiões, sentia-se inteiramente tranquilo. E até arriscava
dizer aos amigos o quanto cuidava de sua esposa, e criticava aqueles que
permitiam que estas saíssem desacompanhadas.
Certo dia,
Cornélio, chegando do serviço, foi dar uma incerta na bolsa da Rosalva,
dizendo a si mesmo: “O seguro morreu de velho”. Já estava aliviado e quase arrependido de
vasculhar as coisas da amada, quando percebeu um pedaço de papel, na cor
vermelha, com muitas dobraduras, parecendo um origami, o que logo lhe chamou à
atenção e acionou o “desconfiômetro”.
Foi
desdobrando o minúsculo papel, e, à medida que seus dedos trêmulos abriam mais
uma dobra, da sua testa caiam gotas de um suor quente, como se algo na cabeça
estivesse a queimar.
“Meu
amor, quando seu marido estará ausente, para termos mais horas, loucas e
apaixonadas, para nós? Espero ansiosa por sua resposta. Beijos, amor. Assinado:
Nanda”.
Tinha tanto medo de perder a amada, que aceitou a sugestão de ambas para morarem juntos, os três.
Acabou por se gabar aos amigos e vizinhança, que era o tal, que dava conta de duas mulheres. Essa foi a "negociação" com Rosalva e Nanda, para que ninguém soubesse que perdera a mulher para quem menos ele temia: outra mulher.
E viveram felizes por um bom tempo.
E viveram felizes por um bom tempo.
Chama a Mamãe
Lendo o conto do Quito (http://encontrogeracoesbnm.blogspot.com/2018/06/a-amante-do-felisberto.html), fiquei inspirada para contar um "Contro Sobre Outro Conto"
AQUI
AQUI
Depois de um almoço agradável com amigos, de observar um jogo de bola para o mundial, entre os da Bélgica e os do Panamá que rezam melhor do que jogam, nada melhor que um surpreendente conto com um fim imprevisível e um toque de genialidade. Para ajudar, aquela escrita "doce", que é o timbre da língua brasileira. Naturalmente, que o nome de Cornélio não é inocente. O homem lá tinha o destino traçado. O que nunca pensou é que o inimigo tivesse saias ...
ResponderEliminarUm abraço
Mamãe, podes publicar também no blog porcalhoto?
ResponderEliminarQuito, deixas-me fazer o mesmo?
Força, São Rosas !
EliminarPodes tudo, São!
EliminarTinha acabado de lêr o último conto do Quito e jamais pensava deliciar-me de seguida com outro tão bem construído psicologicamente, pois o orgulho do Cornélio fois mais forte que o ciúme da amante perdida e muito actualizado ao dizer-nos que "viveram felizes por um bom tempo." Lembrou-me uma professora de inglês que querendo-nos preparar para a vida que se leva aqui, ia-nos dizendo que a duração de uma relação de dez anos já era uma boa relação. Um conto que me encheu, pelo que faço votos que não seja mais que o princípio de uma desgarrada neste blogue.
ResponderEliminarUm abraço.
E viveram felizes!
ResponderEliminarAssim termina um conto muito bem contado, que nos deixa suspensos até final.
Sô Cornélio jamais sonhava com tal felicidade....não uma cama para três, mas à vez!
Sõ Cornélio abelhudo teve sorte em desdobrar o papel até ao fim, acedendo ao seu instinto, acionando o seu “desconfiômetro”.
Maravilha de que esta espécie de blogue se orgulha!
Quem sabe se não haverá mais contos que merecem ser contados!
Ai, quem me dera!
Um beijo Chama a Mamãe!
Obrigada, Dom.
EliminarBeijos, com todo respeito, é claro.
Obrigado eu.
ResponderEliminarTambém com todo o respeito mais um beijinho
Como já disseram, um conto muito bem contado...Melhor, só mesmo uma realidade de uns 'Cornélios' que conheci: dois casais muito amigos, passavam férias juntos e tudo.
ResponderEliminarUm ano, começaram a estranhar a insistência das mulheres: todas as tardes os mandavam para a pesca para, segundo elas, deixarem as crianças fazer a sesta descansadas.
Num dos dias, eles prepararam tudo e foram 'pescar'; pouco depois regressaram e tiveram a surpresa das vidas deles...As duas enroladas numa das tendas, como Nossenhor as deitou ao mundo!
E foi assim que foram expulsas do 'paraíso', para espanto dos campistas(e acredito que alegria de alguns)...
Beijinhos e abraços!
Ahahah
EliminarA São Rosas também pode publicar este teu mini-conto?
... O que estará acontecendo com esses homens1?
EliminarClaro que sim, Paulo...
EliminarBoa Teresa! Um minimo que é o máximo!
EliminarNão estive em casa e no iPad não consigo comentar.
ResponderEliminarAgora sim!
Depois disso, o Cornélio, além de passar, aos olhos dos amigos, por um grande machão, deixou de se preocupar pois ficou a saber que a mulher não gostava da fruta que o preocupava...
Pois, pois...
EliminarBoa pergunta Chama a Mamãe...Será que vão todos para a pesca?
ResponderEliminarQuando afinal as trutas estão em casa....
Não é , Dom?
EliminarClaro que é!
ResponderEliminarSó lido! Estes "contistas" inspirados em ralacões invulgares, mas atuais...
ResponderEliminarE a Sãozinha toda contente
😋🤗
E quando a São Rosas fica contente, eu também fico contente
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