quinta-feira, 5 de maio de 2011

A SAUDADE A PRETO E BRANCO ...

... alguns amigos da Rua D . A saudade a preto e branco ...

Deixo-me sucumbir pela Saudade, nestes dias de Primavera. Sentado no muro que se debruça sobre o casario da aldeia de Juncal do Campo, vou olhando as montanhas que a sufocam. Ao longe, lá bem ao longe, na crista das montanhas, as torres da energia eólica, perfilam-se às dezenas, com os hélices no seu soturno girar, rodando ao sabor do espreguiçar dos dias. E é neste vale de solidão, que assisto ao esplendor das manhãs claras e ao suspiro das tardes calmas, que desfilam na voragem de um Tempo Vencido. Também eu, por vezes, me sinto vencido pela Saudade. Da Saudade da minha Cidade. Da Saudade do meu Bairro. Da Saudade da minha casa. Da Saudade da minha Rua. Da Saudade dos meus Amigos de infância e juventude. Era a rua “D”. Um dia, puseram-lhe nome de navegador. Mas, no meu Sentir, foi sempre a minha singela Rua. Tão singela, quanto a quarta letra do abecedário. Lembro aquela Praça, a que chamavam da Índia Portuguesa. Lembro o colorido carrossel de cavalinhos. Lembro os dois baloiços, que eram a alegria da pequenada. Lembro os jogos de bola, as corridas de triciclos pelo estreito asfalto, e aquelas noites de finados, em que, em bandos, de caraça com uma vela lá dentro, cantávamos os “bolinhos e bolinhós”. E é nisto que vou meditando, enquanto vou estendendo a vista por este vale profundo, absorto nos meus pensamentos. Agora, que nesta época festiva da Natureza, os Ventos partiram para outras paragens, apenas o sino da torre da igreja do modesto povoado, proclama o seu estatuto de sentinela do Tempo e da Solidão. Acordo da minha doce letargia, pelo badalar do campanário. Fico submerso de desalento. Queria, por muitas horas, ficar amarrado ao Passado. Ao meu Passado. Ao encanto da minha Rua. À gloriosa quimera de afrontar a pérfida engrenagem, que me empurra para a foz da minha existência. De poder, de novo, abraçar os meus amigos, naquela Rua que era a nossa. Aos que vivem no torrão lusitano, ou do outro lado do mar. Porque, na nostalgia deste meu querer improvável, materializado na imagem de uma fotografia a preto e branco de um passado remoto, também eu, ao rever, vezes sem conta, aquele património que me transporta à essência dos sonhos, sinto que a Primavera da Vida me fugiu por entre os dedos. E o que o futuro me reserva é - apenas e só - uma íngreme escalada de emoções, navegando na Barca do Tempo ao sabor da mansidão da corrente, no lento remar das minhas infindáveis memórias. A preto e branco.
Q.P.

20 comentários:

  1. Estou seguro de reconhecer o Carlos Freire e, sem a menor duvida o seu irmão e meu companheiro habitual e grande amigo, o Fernando Freire!
    Com menor certeza, julgo reconhecer a Júlia Faustino também.

    E, ao vê-los, sou inundado por uma imensa saudade. A mesma que o Quito relata no seu admirável texto.

    É esta forma de transmitir sentimentos através da escrita que me faz vir a correr ler aquilo que ele escreve. Não só das recordações da juventude, mas da melancolia de agora, quando já estamos a palmilhar o fim do alcatrão da estrada da vida.

    Porque o Quito, quando escreve, abre-nos a sua alma de par em par e mostra-nos, através dela, que foi no Bairro que a sua personalidade e os seus princípios se moldaram.
    É por isso que me orgulho de ter crescido e vivido no nosso Bairro.
    É por isso que eu acho, que são estes textos, reveladores desses princípios, que valorizam o blogue Encontro de Gerações, tornando-o intimista, tornando-o nosso...

    Parabéns Quito. Volta mais vezes!

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  2. Caro Rui
    A nossa amiga Júlia Faustino não morava na Rua D. Vou identificar este grupo. Alguns não estão aqui, como é o meu caso. Assim, e em baixo, da esquerda para a direita: Pimentel,Mariazinha,Maria João Pimentel,Alda Santos, Carlos Freire;
    Em cima pela mesma ordem:Artur,Mário Reis,Fernando Freire, Zé Morgado, Mariana e Carlos Morgado ...

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  3. Eu sei que a Julia Faustino morava na Rua A.

    Mas aquela que identificas como Alda Santos e de que não me recordo, era a que me parecia ser a Julia.

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  4. Rui
    Quando referi alguém que "vivia"do outro lado do mar, é justamente a Alda Santos- Aldinha para os amigos - que se encontra no Brasil ...

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  5. Estou convencido que este artigo do Quito nos vem tocar a todos. Sem dúvidas que cada um com o seu sentimento mas podem crer que o aparecimento destes meios virtuais, nos vieram ajudar imenso no recordar do nosso passado. A maioria de vós foram perdendo um ou outro e por sua vez lá vão voltando a rever um certo número de amigos noutras paragens ou no local de partida mas quem anda por fora há dezenas de anos, é nos diferentes meios deste tipo ao nosso dispôr que vai buscar um manancial de recordações e como se diz: de saudades.
    Bom artigo como estamos habituados e também sempre oportuno.

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  6. Também recordo alguns destes amigos, embora de uma geração um pouco antes da minha.
    É uma bos recordação e então quando a foto é acompanhada por um magnifico texto mais recordamos não só a fisionomia dos amigos como também enquandramos bem a época em que este tempos foram vividos.
    E o Quito deixa transparecer toda a saudade dos tempos de convivência no nosso Bairro, muito especialmente com os amigos da Rua D.

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  7. Queridos amigos
    Isto para mim já se tornou um vício.Todos os dias aqui venho à procura dos vossos textos, fotos, comentários....para matar saudades, mas fico ainda com mais saudades.Porque é que o destino me afastou da minha cidade, do meu bairro, dos amigos da minha criação...e depois de tantos anos nos voltarmos a encontrar?
    Tenho muitas saudades...
    Nesta foto lembro-me de todos eles....são todos da minha geração, mais ano menos ano....nasci em 46.
    Um grande abraço.

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  8. A saudade quando nos bate no peito tem o condão de fazer brotar as palavras em ondas de poesia e tu, Quito, soubeste, e bem, transpor para o papel o teu sentir pondo a descoberto o que te ia na alma.

    Belo texto que estou certo amenizou a angústia da distância e dos tempos da Primavera da Vida que te fugiu por entre os dedos, como fugiu a muitos de nós.

    Ao caminharmos de forma definitiva e inexorável para a meta, deste caminhar pela vida, resta-nos o momento, os muitos momentos que temos vivido, graças ao GEG, e que despertou em nós este sentir que tínhamos colado à pele e que era e é a nossa matriz.

    Fomos uns sortudos em termos a sã convivência neste Bairro único que nos viu crescer e que, depois de cada um ter construído o seu próprio caminho, de novo nos acolheu neste doce afago do renovar e consolidar de amizades.

    Se não fosse saber o quanto te custa estares “desterrado” nesse Salgueiro do Campo que sei também amas, arriscaria dizer-te que és um privilegiado por teres aí as musas que te inspiram e te dão a tranquilidade para escreveres, em que te revelas, mostrando o que vês e sentes desta forma tão exuberante.

    Aguardo o próximo texto.

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  9. Olá Nanda!
    Tens bons vícios...
    O Quito tem o dom de nos avivar a memória, e de que maneira!
    A preto e branco ou a cores, os seus textos tocam-nos.Pronto!
    Andava intrigada com o intervalo que nos impos à sua escrita, mas eis que aparece e nos deixa saudosos e felizes, em simultâneo, pelas razões referidas pelo Chico e pela Nanda.
    Eu apenas identifiquei os manos Morgado, os manos Freire e Mário Reis!

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  10. Oh!Quito! Tu dàs cabo de mim!Eh!Pà! Esta prosa é fantàstica e pôs-me todo arrepiado de saudades!!O que vale é que, como todos sabem, refugio-me na MUSICA! A minha grande terapia!

    E se arranjàssemos um cineasta que estivesse interessado em realizar uma série TV sobre "A HISTORIA INCRIVEL DOS PUTOS REGUILAS DO BAIRRO MARECHAL CARMONA"? Haveria matéria para isso!

    No domingo là irei a SAARBRUCKEN (Alemanha) assistir ao fabuloso concerto do Albino JOHNNY WINTER!!!!E entregar-lhe-ei uma garrafinha de LICOR BEIRAO, para ver se ainda dura mais uns anitos!!!

    Keep cool, camaradas!

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  11. Quito

    Já que gostas de saber o que se passa por aqui, aqui vão algumas.

    Um dos inspectores chefes da polícia da luta contra o crime acaba de ser afastado para serviços internos derivado a problemas detectados pela própria esquadra anti-crime. Este não se safa, nem com colegas.

    O tribunal superior do Quebec, acaba de autorizar um recurso colectivo contra um hospital por maus tratamentos, péssimos, a jovens da nossa idade. Para isto muito ajuda podermos ir ver familiares e amigos durante todo o dia. De noite, se tivermos acabado o serviço ou acabarmos de chegar de fora como exemplo, entramos no hospital e a partir de um dado momento somos seguidos por alguém a certa distância até começarmos a conversar com um doente ou outra pessoa de forma continuada. Uma vez ou outra podem falar connosco mas é raro.

    Aqui há zonas inundadas há duas semanas e há quatro dias que foi batido o recorde de há cento e cinquenta anos. As pessoas há dois dias já estavam cansadíssimas de porem sacos à volta das casas. Ontem o goveno provincial solicitou de manhã ao federal ajuda militar, o que é extremamente raro pois os sindicatos querem sempre que sejam os civis a fazer os serviços. Ontem mesmo chegaram cerca de setecentos militares e hoje vão chegar mais pois contra tudo o que se esperava, as águas subiram ainda mais durante a noite. O que me admirou foi que estava à espera de ver os militares chegaram nas suas grandes camionetas abertas para transportarem sacos de areia e pessoas mas o que vi chegar, foram carros de combate. E lá vão a um preço astronómico transportar a areia e pessoas. Como os peixe encontram nos jardins um local ideal para encontrarem comida, os canhões devem ser para apanhar algum peixinho. Como vês, por aqui também há casos.

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  12. Como sempre o nosso Amigo Quito com a sua bela escrita faz-nos recordar o nosso passado, a nossa infância o nosso Bairro onde fomos tão felizes.Hoje e dada a actual situação recordo e, vou concerteza fazer uso, de períodos económicos onde todos viviamos com muito menos e bem mais felizes.Foram de facto bons tempos uma escola excelente de vida e uma Amizade que perdura no tempo.Amigo Quito continua pois como podes ver a tua escrita dá-nos raros momentos de felicidade.
    Nela Sarmento.

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  13. Ainda volto para acrescentar que me lembro bem de todos e aproveito para perguntar o que é feita da Mariana, lembro que eram açoreanos e que fizemos grandes bailaricos na casa dela.
    Depois sei que a casa foi ocupada por uma familia numerosa, mas da Marianinha, como lhe chamavamos nunca mais ouvi falar.
    Nela

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  14. Não convivendo convosco conhecia-vos a todos...
    A partir de 74 passei a conviver com o Mário Reis e em 81 a trabalhar com o Zé Morgado.
    Tudo isto,no século passado!

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  15. Chico Torreira
    Afinal, lá como cá.
    Nela Sarmento
    A Marianinha, era filha da Dona Osvalda e do Senhor Ultra. Um dia, deixaram o bairro e regressaram aos Açores. Sem confirmação, julgo que a Mariana vive na Dinamarca.Viviam na casa onde vive agora a familia Baía, casa geminada com a falecida Dona Amélia, que foi Directora do Jardim-Escola, João de Deus.
    Aproveito para agradecer a todos a colaboração nesta recordação, sendo de realçar que alguns dos amigos reconheceram aquelas jovens.A fotografia é de 1967.
    Abraço a todos

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  16. Quito

    Não tenhas dúvidas e em relação ao último caso descrito acima, ainda há momentos acabo de ver que os militares chegaram tarde, a más horas e mal equipados. Acabo de ver um dique que rebentou hoje, de maneira que não vão haver culturas na época. Não falando no transporte, os militares apareceram com as botas do uniforme quando deviam vir com as calças/botas de pescadores, impermeáveis até ao peito. Eles é que são como sempre generosos: mesmo assim, andam a pé no meio da água. Já vi uma casa inclinada a 45 graus. Amanhã devem chegar barcos militares para se deslocarem melhor pois as pessoas já há mais de uma semana que andam nos barcos que têm. Entretanto já ontem tinha começado a evacuação obrigatária.
    A única diferença aí foi na parte económica, o que é gravíssimo pois arrastaram todo um Povo para uma fatalidade. Se no estrangeiro os portugueses são preferidos por serem bons trabalhadores, a falta não é dos que andam a trabalhar mas no resto aqui é o mesmo ou pior.
    É por isso que não desculpo os nossos políticos: têm um Povo trabalhador, eles é que são incapazes de originar condições com criação de empregos produtivos e leis para motivarem e tirarem partido do maná que têm. Além disso na corrupção que existe por estes lados, é uma verdade e a que níveis..., não há é impunidade como também tenho falado. E tudo isto vem de cima. Por isso não é nada entre nós todos. Um abraço.

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  17. Quito
    Obrigado por este texto que nos põe sempre cheio de saudades daqueles tempos que nos fizeram de todos nós muito amigos como se tem provado nos ultimos tempos.Tentei já saber da Marianinha mas ainda não recebi informações.
    Um bom fim de semana
    Carlos

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  18. As lembranças nos trazem saudades!
    Sentindo saudades nos tornamos mais humanos!
    Texto emocionante! Mais um, caro amigo!
    Venha o próximo!
    Abraço

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  19. Embora reconheça algumas das caras (M/F) também reconheço que, na data da foto, ainda eu não sabia o que era BMC.
    Ainda não era jubilado, como murcom...
    O Quito, como sempre, coloca todo o seu sentir face à saudade e à sua grande ligação às pessoas que o acompanharam na sua juventude.
    Juventude que se perpétua...
    Um abraço.

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