terça-feira, 31 de agosto de 2010
JPSIMÕES UM ARTISTA NASCIDO EM COIMBRA- O RETRATO!
02. 1970 (RETRATO)
A minha geração, já se calou, já se perdeu, já amuou, já se cansou,
desapareceu, ou então casou, ou então mudou,
ou então morreu, já se acabou.
A minha geração de hedonistas e de ateus, de anti-clubistas,
de anarquistas, deprimidos e de artistas, e de autistas
estatelou-se, docemente, conta o céu.
A minha geração ironizou o coração, alimentou a confusão
brincou às mil revoluções amando gestos e protestos e canções
pelo seu estilo controverso.
A minha geração só se comove com excessos, com hecatombes,
com acessos de bruta cólera, de mortes, de misérias, de mentiras
de reflexos da sua funda castração.
A minha geração é a herdeira do silêncio
dos grandes paizinhos do céu
da indecência, do abuso
e um belo dia esqueceu tudo e fez-se à vida
na cegueira do comércio.
A minha geração é toda a minha solidão, é flor de ausência sonho vão,
aparição, presságio, fogo de artifício, toda vício, toda boca
e pouca coisa na mão.
Vai minha geração, ergue a cabeça e solta os teus filhos no esplendor
do lixo e do descuido, deixa-te ir enquanto o sabor acre da
desistência vai corroendo a doçura da tua infância.
Vai minha geração, reage, diz que não é nada assim,
que é um lamentável engano, erro tipográfico, estatística imprecisa,
puro preconceito, que o teu único defeito é ter demasiadas
qualidades e tropeçar nelas.
Vai minha geração, explica bem alto a toda a gente que és por demais
inteligente para sujar as mãos neste velho processo, triste traste de
Deus,
de fingir que o nosso destino é ser um bocadinho melhores do que antes.
Vai minha geração, nasceste cansada, mimada, doente por tudo e por
nada, com medo de ser inventada, o que é que te falta agora, que não
te falta nada?
Poderá uma pobre canção contribuir para a tua regeneração
Ou só te resta morrer desintegrada?
Mas, minha geração, valeu a trapaça, ai, até teve graça,
tanta conversa, tanta utopia tonta, tanto copo,
e a comida estava óptima! O que vamos fazer?
Letra e Música de JP Simões.
marcadores: artistas de Coimbra
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Muito bom!
ResponderEliminarGosto bastante de JP Simões.
ResponderEliminarTive oportunidade de o ver actuar no TAGV e
agradou-me bastante.
O seu ultimo cd vale a pena ouvi-lo...
Excelente poema! Gostava de saber algo mais a respeito de JP Simões.
ResponderEliminar"(...)até teve graça,tanta conversa, tanta utopia tonta, tanto copo (...)"
É bem verdade isto! A utopia, por definição é tonta.
Mas comanda a vida!
Gera a conversa, que é privilégio humano.
Justifica o copo, que é pretexto ...
Ler o poema da letra da canção e acompanhando ouvindo a interpretação musical, todos os outros sentidos ficam em alerta!
ResponderEliminarMuito boa a descrição das realidades, passadas e presentes.
JP Simões,um nome a fixar...
Este trabalho do JP Simões é muito bom, de facto. A sua obra, não é de "leitura" ligeira, nem sequer fácil de cantar, é antes uma poesia profunda, reflexiva, muito crítica e auto-crítica. Também gosto muito da canção sobre o Haiti, inédita, sem outra gravação senão aquela de má qualidade sonora que estava no feed, o outro dia..."
ResponderEliminarRui Felício, para conhecer um pouco mais, basta pôr no google jpsimoes que tem muita coisa à disposição, Wikipédia, youtube, blogs, etc.
ResponderEliminarE os CDs: A solo, "1970" e "Boato"; mas também "Exílio" com o Quinteto Tati; Livros: O libreto da "Ópera do Falhado"; "O Vírus da Vida"... e inúmeras músicas em bandas sonoras de filmes; com André Carrilho, o ilustrador do Vírus da Vida, fez a banda sonora e o argumento de um filme de animação "Jantar em Lisboa". Fora os CDs dos Belle Chase Hotel.
Obrigado pela informação, Graça!
ResponderEliminar